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José Miguel Sardica
Opinião de José Miguel Sardica
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A presidência Trump

25 jan, 2017 • Opinião de José Miguel Sardica


É certo que a nova administração se estreia com taxas de aprovação muito baixas. E é também certo que Trump tem um programa “incendiário”.

O que vai ser a Presidência de Donald Trump? Toda a gente parece ter certezas. A verdade é que ninguém pode ter certezas. O começo é auspicioso? De forma nenhuma. Mas da mesma maneira que se exagerou na esperança messiânica depositada em Obama, talvez (oxalá) seja exagerada a perspectiva apocalíptica lançada sobre Trump.

É certo que a nova administração se estreia com taxas de aprovação muito baixas, e perante uma América que não estava tão dividida e crispada desde os conflitos raciais dos anos 60 ou da recondução de Nixon em 1972 (por causa do Vietname). As imagens das marchas de protesto, em Washington e por todo o mundo, mostram que o debate político não vai ser fácil no futuro próximo. E é também certo que Trump tem um programa “incendiário”: o muro contra o México, a amizade (será dependência?) em relação a Putin, a promessa de guerra à China, o desprezo em relação à Europa, as críticas à NATO, a recusa da agenda climática, o proteccionismo, o nacionalismo, etc.

O seu discurso de tomada de posse foi pobre e pouco elevado: meia-dúzia de slogans comicieiros, sem uma mensagem conciliadora e à altura das inequívocas responsabilidades dos EUA na democracia e no mundo. E foi injusto e ofensivo em relação ao seu antecessor, pintando uma “carnificina” vigente que não existe.

Muita gente não gosta daquele programa e desta América. Mas há quatro aspectos que convém notar. Desde logo, alguns dos problemas em que a América e o mundo estão mergulhados são anteriores a Trump. O ódio à globalização é uma causa da esquerda; o endividamento doméstico e a retracção internacional são um legado de Obama. Depois, há a distância da campanha eleitoral ao exercício do poder em Washington: o Presidente pode muito, mas não pode tudo, e o Partido Republicano não quererá imolar-se no altar de uma pura vaidade pessoal. Segue-se o pacote moral: o homem é “racista”, “xenófobo”, “islamofóbico”, “machista”, “sexista”, “misógino”, etc.

Sim, a Casa Branca deveria ter por inquilino alguém mais contido e bem-educado. Mas se se mistura política com moral, então a Casa Branca já teve outros inquilinos com comportamentos menos próprios. Finalmente, não pode ser esquecido que a América, tal como se plasmou no colégio de eleitores, o elegeu. Seria preferível o sufrágio directo (onde Clinton teve mais votos)? Pois reveja-se a Constituição. Meio mundo, paladino da liberdade e da tolerância, continua a achar que a democracia e as redes sociais só são boas quando elegem um dos “nossos”. E continua a não perceber que os EUA não são Nova Iorque, ou que a maioria silenciosa que elegeu Trump não é feita de “white trash”.

Foram milhões de eleitores que, sendo americanos, se preocupam com o seu país, a sua cidade, o seu emprego e o seu futuro. Podemos não gostar; mas não houve neles estupidez, nem pecado – embora haja evidentes razões para recear que a escolha tenha sido má, quer para a América, quer para o mundo.

Com a investidura de Trump, os moralistas e catastrofistas de serviço acham que a democracia está como nos anos 30: em plano descendente e a caminho da aniquilação. Mas negar ao Presidente legitimamente eleito a possibilidade de mostrar o que vale sentado na Casa Branca, e incendiar as ruas e a opinião pública com protestos violentos e palavras insultuosas, não dá saúde à democracia de que todos falam, mas que afinal anda pouco respeitada. Ainda no Sábado passado, a popular cantora Madonna foi ovacionada por uma multidão de supostos proprietários da democracia ao dizer que tinha pensado “fazer explodir a Casa Branca” (sic). Eis uma bela mensagem de tolerância!

Comentários
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  • Indignada
    27 jan, 2017 Fig. da Foz 14:15
    Dr. Sardica, gostei da sua exposição, justa e realista sem cair na totalitária tentação do dizer mal porque os vermelhos, os hedonistas que dominam os meios de comunicação, o querem. Pena que não agiu da mesma forma quando falou de um dos pais da corrupção, da miséria, do endividamento, no anterior artigo... que já está ardendo onde merece!
  • António Costa
    27 jan, 2017 Cacém 13:28
    Acho que o José Miguel Sardica fez uma análise equilibrada. Os comentários do "Zé Manel - Lisboa" chamam também a atenção para os pontos fundamentais do que se passa hoje nos EUA. Resta-me apenas dizer que a KKK pode começar a produzir os barretes, sem buracos para os olhos, depois de terem apoiado Trump.
  • José Pedro
    26 jan, 2017 Porto 22:18
    Eu prevejo um EUA isolado, descredebiliza-do, mais pobre e um mundo mais perigoso do que ja está. A Inglaterra vai pelo mesmo caminho, mais isolada. Me digam quem em sã consciência fará novos negócios com estes países
  • Zé Manel
    26 jan, 2017 Lisboa 09:23
    É verdade que não se deve julgar uma pessoa sem primeiro permitir que esta mostre trabalho, mas no caso do Trump esse trabalho já está a ser mostrado desde o início da sua campanha. As pessoas que votaram nele não fazem ideia das consequências, e infelizmente, tratando-se dos EUA, as consequências serão mundiais. O que acontece é que Hillary era a candidata do sistema, encarregada de privilegiar os mesmos de sempre, e se calhar os americanos fartaram-se disso. Trump é mentiroso, promete sabendo que não vai cumprir, é incompetente, foge aos impostos, tem valores morais duvidosos. Os políticos portugueses não são diferentes, saindo do Governo para a administração das empresas que beneficiaram quando estavam no poder, inventando licenciaturas, não cumprindo promessas, etc... Uma nota final: tenho todo o respeito pelo Dr. Sardica, mas comparar atitudes duma cantora pop conhecida por mostrar as mamas em todo o lado que vai, ao discurso de ódio duma pessoa com a responsabilidade de liderar os EUA é como comparar a Casa dos Segredos ao Telejornal da RTP.
  • Guilherme Melo
    25 jan, 2017 Lisboa 19:48
    Gostei do texto do Sr. Miguel Sandice. Muito bom.
  • MASQUEGRACINHA
    25 jan, 2017 TERRADOMEIO 18:36
    Pois é, caladinhos e respeitosos somos muito mais democráticos, e para mais o Trump já se locupletou com o monopólio das barbaridades e das cretinices, tanto as ditas, como as feitas. A continuar assim, e se o deixarem, para lá das proibições que já decretou, em breve terá basta justificação para fazer daquilo um estado realmente securitário, tantos são os inimigos internos e externos que insiste em arranjar. Deus tenha piedade da América, porque com os problemas que a América trará ao mundo, o mundo não se apiedará dela. E entretanto vamos fazendo o quê? Brincando aos macaquinhos cegos-surdos-e-mudos porque o homem foi eleito? Tudo isto é, e vai-se confirmando como, um desastre de tal forma evidente que chega a ser cobardia não o ver ou tentar justificá-lo, com comparações com figuras do passado, ou infantilidades do tipo "tu é que começaste" ou "tu também fizeste" - ao bom estilo de Trump, aliás. Têm a possibilidade de impeachment, há esperança? Não me parece que Trump aceitasse ser julgado e afastado, nem os seus pouco recomendáveis e violentos apoiantes enfim alapados ao poder, sem luta. Luta, literalmente. Portanto... o mal está feito. Resta ver a dimensão que tomará, para eles e para nós.
  • Damião
    25 jan, 2017 Lisboa 14:43
    Excelente este texto do Dr. Miguel Sarnia.
  • HA
    25 jan, 2017 Lx 14:40
    Esqueceu se dos 8 anos de Bush?! Havia pessoas como você, quando o Hitler subiu ao poder e veja se o resultado que deu. Confundiu dar o beneficio da dúvida, com não ter dúvida nenhuma. E ninguém duvida, que Trump nunca deveria ser presidente dos EUA. Esta eleição vem comprovar o que há muito se sabe, os EUA enquanto país têm a cultura e noção global de um mosquito. Entram onde lhes interessa, desde que haja petróleo, matam e deixam populações na miséria e auto intitulam se libertadores e salvadores.... patético, assim como o artigo.
  • ALETO
    25 jan, 2017 Lisboa 08:27
    Que artigo de opinião mais medíocre. Verdadeiramente mal escrito e sem investigação nenhuma. Em que se baseia Sardica para afirmar que Trump «[...] foi injusto e ofensivo em relação ao seu antecessor, pintando uma “carnificina” vigente que não existe.»? Na verdade, esta carnificina existe em sete cenário diferentes: Iémen, Somália, Afehanistão, Síria, Iraque, Líbia e Paquistão. Será que Sardica investigou bem onde os EUA, no presente, estão a usar as suas armas (e drones)? No caso do Iémen, as armas estão a ser vendidas à Arábia Saudita para matar crianças. Será que Sardica tem conhecimento das denúncias de Imran Khan (do Paquistão) a este respeito?