31 mai, 2024
Nas últimas eleições legislativas pudemos perceber, de forma
clara, que Portugal se tornou também território para a presença de campanhas de
desinformação com origem e financiamento externo. Mas, de lá para cá, muito
pouco se fez - de forma integrada - para desenvolver formas de assinalar as
interferências, gerir os seus efeitos e, eventualmente, impedir a sua
disseminação.
Tivemos, no início de maio, notícias sobre um esforço da ERC, em parceria com centros de investigação, para identificar sinais da presença de elementos estranhos no nosso ambiente informativo (sobretudo nas redes sociais), mas não tivemos conhecimento de qualquer iniciativa específica dinamizada pelo Governo ou por autoridades como a Comissão Nacional de Eleições ou o Centro Nacional de Cibersegurança. Não digo que não existam; digo que, a existirem, não sabemos com o que podemos contar.
Esta situação contrasta, de forma muito clara, com o que se passa no país vizinho, a Espanha. O governo de Madrid ativou uma Rede de Coordenação para a Segurança em Processo Eleitorais, antecipando uma série de ciberataques especialmente concentrados nas 72 horas prévias ao dia das eleições europeias. A rede integra equipas dos ministérios da Defesa, da Administração Interna, da Transformação Digital e de organismos como o Departamento de Segurança Nacional e o Centro Nacional de Criptologia. Esperam-se ‘ondas’ de desinformação, especialmente nas horas entre o fecho das urnas e a divulgação de resultados oficiais e, embora muito desse fluxo possa estar presente em várias redes, o foco de atenções vai ser o TikTok.
Nada garante às autoridades espanholas que conseguem impedir, de forma eficaz, todas as eventuais iniciativas de ataque às plataformas oficiais (nas eleições legislativas, em 2023, o site do ministério da Administração Interna foi alvo de um uma vaga de 600 mil pedidos de acesso num curto espaço de tempo) ou de circulação de conteúdos com informação errada ou falsa, mas percebe-se, em qualquer caso, uma atenção à gravidade do problema que ainda não reconhecemos nos agentes políticos nacionais.
Numas eleições europeias - sobretudo nas que vamos ter agora, em que pode acontecer uma erosão das posições europeístas e um fortalecimento dos movimentos nacionalistas - o risco de interferência, induzida por estratégias transnacionais é ainda maior e uma gestão assente na expectativa de que ‘essas coisas não chegam cá’ é irresponsável. A ‘sorte’ não será, de certeza, nossa companheira durante muito mais tempo.