29 jan, 2019 • André Rodrigues , Paulo Teixeira (sonorização)
Nos últimos dias, pelo menos 800 pessoas terão sido detidas na Venezuela. Se esta é uma contabilidade normal, atendendo à dimensão das demonstrações de rua, há uma outra contabilidade que é chocante e que não é de agora.
Os números de que lhe vou falar dizem respeito a 2017, mas atendendo ao quadro de crise humanitária que a Venezuela enfrenta serão ainda muito atuais ou, eventualmente, ter-se-ão agravado.
64% da população venezuelana terá perdido, em média, pelo menos 11 quilos por falta de comida. Um dado que, de acordo com a agência EFE, ainda não reflete o efeito da hiperinflação, que começou em outubro de 2018.
A amostra desta pesquisa sobre as condições de vida na Venezuela envolveu mais de seis mil famílias. 61% dos inquiridos disseram ter ido para a cama com fome.
78% disseram não ter dinheiro para adquirir o cabaz mínimo essencial porque - das duas, uma – ou os alimentos desapareceram das prateleiras dos supermercados, ou estão tão caros que ninguém lhes consegue chegar.
Daí que 63% dos inquiridos passaram a reduzir os alimentos disponíveis em casa, diminuíram porções nos pratos e, no limite, suprimiram refeições. Um quinto dos venezuelanos não toma o pequeno almoço.
Todos os dias, os pais com mais do que um filho deparam-se com uma decisão dramática: qual das crianças come a cada dia. Porque a comida simplesmente não chega para duas ou mais crianças.
Tudo isto num país onde o salário mínimo é de 18 mil bolívares soberanos. Ou 18 euros e 18 cêntimos que nada valem quando a inflação é de 10 milhões por cento. Dará para comprar duas bananas e pouco mais.
A culpa é da excessiva dependência do petróleo. De acordo com a petrolífera britânica BP, a Venezuela detém 18% das reservas comprovadas de petróleo no mundo, à frente da Arábia Saudita ou do Irão. Só que, desde 2016, mais de metade das 70 jazidas de exploração foram encerradas devido aos elevados custos de extração.
Consequência de tudo isto: desde 2015, pelo menos três milhões de pessoas fugiram da Venezuela, o país que na década de 50 do século passado era o quarto mais rico do mundo, com um PIB per capita a rondar os 7,5 milhões de dólares.