27 fev, 2018 • Olímpia Mairos
A Guarda Nacional Republicana (GNR) tem em marcha, em todo o território nacional, a “Operação Floresta Segura”, reforçando as ações de patrulhamento, vigilância e fiscalização das zonas florestais no âmbito da prevenção e deteção de incêndios.
Estas ações de sensibilização visam alertar para a importância dos procedimentos preventivos a adoptar nesta altura do ano, nomeadamente sobre o uso do fogo, a limpeza e remoção de matos e a manutenção das faixas de gestão de combustível, tendo em vista a redução do número de ocorrências e a minimização dos riscos de incêndio florestal.
A Renascença acompanhou uma patrulha do Núcleo de Proteção Ambiental da GNR de Vila Real numa ação de sensibilização que percorreu as aldeias de Vila Marim, Lordelo e Mondrões.
A primeira paragem acontece em Vila Marim. O fumo que se vê da estrada desperta o olhar atento dos militares que, de imediato, saem da viatura e se dirigem ao terreno mesmo junto à aldeia.
“Bom dia, podemos falar um bocadinho consigo? Sargento Mendes, da GNR. Está bom?”. Feitas as apresentações, o militar da GNR explica que estão ali “no âmbito da diretiva operacional do SEPNA Serviço de Proteção da Natureza e Ambiente da Operação Floresta Protegida 2018, a sensibilizar as pessoas por causa das situações que ocorreram o ano passado, para tentarmos ao máximo evitar a ocorrências de novas ignições este ano”.
Jaime Bento, 57 anos, recebe e enaltece a ação da GNR. E começa logo por dizer que está a “cumprir as regras de segurança”. “Fazemos pequenos amontoados e como temos as covas abertas, aproveitamos as covas para queimar os sobrantes que caem das copas dos pinheiros, a caruma e outros afins”, sublinhando que “ainda o ano passado o terreno foi limpo, só que todos os anos é necessário dar-lhe uma limpadela para prevenir incêndios”, explica.
O primeiro-sargento Mendes confirma que a queima cumpre as regras de segurança, mas alerta para a distância entre as copas das árvores.
“Há aqui algumas que vão ter que ser arraladas, porque a distância entre copas é de quatro metros e vemos ali aquele caso, por exemplo, em que os pinheiros estão muito juntos”, informa o militar, acrescentando que “agora estamos a fazer a sensibilização, a partir de 15 de março começamos com a fiscalização”.
“Estado só sabe mandar 'bitaites' na televisão, criar leis e medidas de coação”
“Mas os proprietários terão conhecimento técnico para poder marcar quais são as árvores a abater?”, questiona o produtor florestal.
Jaime Bento entende que devia ser criado “um gabinete de crise, que informasse todos os proprietários sobre a área envolvente que devia ser limpa, quais a áreas mais em perigo, porque o Estado só sabe mandar ‘bitaites’ na televisão, criar leis e medidas de coação para obrigar as pessoas a efetuar as limpezas e nem toda a gente tem recursos humanos para o fazer”.
A propriedade florestal onde Jaime se encontra com mais duas pessoas em operações de limpeza tem três hectares de pinheiro. Ontem andaram aqui a trabalhar oito pessoas “todos a ajudar” e nestes dois dias conseguiram limpar “pouco mais de 100 metros quadrados, porque as máquinas não entram e é difícil cortar todo o mato rasteiro”.
Na aldeia, não há quem queira trabalhar na limpeza das florestas e só com a interajuda é possível levar por diante a tarefa.
“Isto não tem preço, porque se fosse a pagar, era preferível deixar ir tudo para o Estado e o Estado que tomasse conta de tudo”, diz Jaime.
“Ordenamento florestal é vital, evita que os fogos se propaguem e cria rendimento ao país”
Já em Lordelo a equipa da GNR é despertada pelo barulho de máquinas num terreno à beira da estrada. Os dois militares saem da viatura e são recebidos por José Ferreira, 57 anos, que anda a “destroçar o mato com a ajuda de um trator que tem acoplado um destroçador”.
O agricultor diz que é importante “cumprir a lei e manter a floresta limpa, sobretudo à volta das habitações, para evitar ignições e a propagação dos fogos”.
No terreno de cerca de três hectares vai semear carvalho negral, “árvores bem mais resistentes ao fogo e que, daqui a uns anos, podem dar algum rendimento”.
“Na região predomina o minifúndio, não há floresta ordenada”, mas José Ferreira tem consciência que “o ordenamento florestal é vital, para evitar que os fogos se propaguem e para criar rendimento ao país”.
Já em Mondrões os dois militares do núcleo de proteção ambiental abordam um casal à porta de casa. Júlio Martins, 82 anos, escuta atentamente o 1º sargento Mendes e mostra-se disponível para passar a palavra.
“Claro que vou ajudar. A todas as pessoas com quem contactar vou transmitir que a cinco metros de casa não pode ter árvores, que é preciso ter tudo limpo numa faixa de 50 metros à volta das casas e que a distância entre as copas das árvores tem de ser de quatro metros”, diz à Renascença.
Até 15 de março, a GNR está em ações de sensibilização para “tentar evitar as catástrofes que têm acontecido com ações pedagógicas junto dos agricultores e isto é extremamente importante”, refere o cabo chefe Pinto.
Primeiro sensibiliza-se para a limpeza dos terrenos e, depois, é feita a fiscalização com o objetivo de “corrigir as situações de incumprimento face à obrigatoriedade da manutenção das faixas de gestão de combustível”. E o 1º sargento Mendes lembra que “este ano, as multas, derivado ao que se passou no ano anterior, foram aumentadas para o dobro, ou seja, o ano passado eram 140 euros e este ano passam para 280 euros”.
Prevenir, limpar e ordenar
“É fundamental cumprir a lei e eliminar os combustíveis à volta das habitações”, defende Mário Pereira, investigador do Departamento de Física da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, lembrando que “há uma área em torno das habitações, das infraestruturas humanas, onde não deve de haver vegetação”.
“Se não houver vegetação não há fogo”, diz o investigador admitindo que pode acontecer que “um fogo que está a ocorrer a uns metros de distância pela sua dimensão poder propagar-se pela emissão de massa, mas uma coisa é ter árvores ao lado do muro ou em cima da casa que vão muito mais facilmente fazer chegar as chamas às habitações e às infraestruturas humanas”.
Também Paulo Fernandes, investigador da UTAD, que integrou a comissão técnica independente aos fogos de Pedrogão e de outubro, considera fundamental a “prevenção” e defende que “é preciso que o espaço florestal seja menos contínuo, que tenha menos quantidade de combustível e tenha uma composição de vegetação menos inflamável”, justificando que “depois de estarem em movimento”, os fogos entram facilmente em povoações, porque aproveitam qualquer vegetação que exista”.
É fundamental cuidar a floresta, que é um bem maior, base essencial do nosso país, base essencial do nosso interior”, defende a presidente da Sociedade Portuguesa de Ciências Florestais, Emília Galvão Silva.
A docente da UTAD realça que “apostar na floresta, trazendo economia para a floresta” pode ser um dos caminhos para fixar pessoas no interior e esbater a desertificação.
Em 2017, segundo a GNR, arderam mais de 527 mil hectares de mato e floresta, mais 367 mil hectares do que em 2016.
A GNR indica ainda que foram registadas 21.952 ocorrências, 9.864 crimes, 65 detidos por incêndio florestal, 919 pessoas identificadas e 4.578 contraordenações.