Os altos valores pagos na liga saudita agravam, no imediato, o risco de insustentabilidade do futebol europeu, defende Daniel Sá, que estuda o impacto do futebol na economia. O também diretor executivo do Instituto Português de Administração e Marketing acredita que o "atual ciclo de vida do futebol europeu está perto do seu fim, porque vive-se uma desproporção significativa. Há cinco ligas demasiado ricas e dentro dessas ligas ricas temos clubes demasiado ricos e futebolistas demasiado ricos também. E isto não tem sentido do ponto de vista do modelo de negócio".
Um modelo de negócio que, de acordo com este especialista, "está a chegar ao seu fim". "A UEFA e a própria FIFA vão ter que encontrar novas fórmulas de gerir a riqueza que esta indústria gera. Acho que, mais tarde ou mais cedo", vão ser definidos "tectos máximos aos salários e aos valores das transferências de jogadores".
Ora, neste sentido, "a liga saudita é, no curto prazo, uma ameaça perigosa para o cenário europeu", porque "os sauditas acenam com montanhas de dinheiro aos jogadores e isto é, no imediato, um problema". "Corre-se o risco de haver uma debandada maior. Provavelmente, esse risco pode ter que acontecer no curto prazo, porque o modelo é insustentável e nunca poderemos pensar nesta indústria para o próximo ano ou para daqui a dois anos. O futebol é uma indústria que tem que ser vista daqui a 10 anos e está a sofrer muitas transformações", explica Daniel Sá.
O diretor executivo do IPAM coloca, no entanto, dúvidas quanto à capacidade da liga saudita se impor como o melhor campeonato do mundo. "Acho que ainda é prematuro conseguir avaliar o impacto desta tentativa saudita de furar a hegemonia europeia. Isso não passa apenas por ter dinheiro e despejar dinheiro nos clubes europeus e nos atletas e levá-los para lá. Para o sucesso de uma competição, isso não é suficiente. É preciso mais consistência".
Para isso, é preciso que os sauditas "invistam na indústria como um todo". "Estou a falar num investimento em médicos, fisioterapeutas, treinadores, cientistas do futebol. Bem como em toda a componente de marketing, de maximização de receitas, de bilheteira, de patrocínios. Portanto, não chega ter um Ronaldo ou vários Ronaldos para que a liga seja a melhor do mundo. Precisa, de facto de todo o 'circo' que está montado à volta da indústria do futebol. Isto não se consegue num ano, nem em dois, nem em três", concretiza.
Daniel Sá vê esta como "a terceira tentativa de furar a hegemonia da Europa no futebol", depois de uma tentativa norte-americana e outra chinesa. Ambas sem sucesso. No entanto, numa outra modalidade, no golfe, "em dois anos os sauditas conseguiram interferir claramente com as duas principais competições profissionais que existiam: a liga profissional norte-americana e a europeia. O golfe é uma modalidade muito conservadora e, mesmo assim, os sauditas conseguiram entrar e arranjaram forma de neste momento, estar na liderança mundial".
"O que vai acontecer no futebol, não sabemos. Temos que esperar para ver", remata.