10 jan, 2024 - 19:16 • Eduardo Soares da Silva
A Amnistia Internacional lamenta a intenção da Liga de Clubes de querer "aproveitar a oportunidade de investimento no Médio Oriente" para internacionalizar a Taça da Liga e alerta para um país com "clima de repressão muito grande", que o organismo português poderá ajudar a "branquear e normalizar".
Pedro A. Neto, diretor executivo da Amnistia Portugal, "não compreende" a intenção da Liga.
"É branquear e normalizar uma realidade inaceitável e pela qual o desporto não se pode bater. Os valores do desporto são de igualdade, fraternidade, convívio, saúde e cultura. Estamos a submeter a beleza do desporto a interesses financeiros. Não está a ajudar, está a fazer pior e normalizar o abuso dos direitos humanos", critica.
Rui Caeiro garante que a Liga está "aberta a todas as geografias", mas destaca o desejo de aproveitar a "oportunidade" do forte investimento do mercado árabe em competições estrangeiras.
"A ambição dos países do Médio Oriente em ter este tipo de competições tem estado a incrementar-se de forma significativa. É objetivo aproveitar essa oportunidade que se está a gerar", revela.
Em abril do ano passado, o presidente Pedro Proença já tinha revelado à Renascença que a Liga tinha propostas dos Estados Unidos da América, Arábia Saudita e Europa.
Pedro A. Neto, da Amnistia, considera "mais grave" uma possível decisão da Liga de Clubes de levar uma competição para o Médio Oriente do que um jogador escolher transferir-se para o país.
"Um jogador é responsável por si próprio, tem liberdade de fazer as suas opções pessoais e profissionais. Quando é uma instituição, é mais grave. Ao alinhar oficial e institucionalmente com uma competição, estão a fazê-lo também em nosso nome. É inadmissível e, seguindo esta lógica e se vierem a fazer isto, terão de responder perante os responsáveis governamentais, que gerem também estas competições", alerta.
Contrato para a realização da "final four" em Leir(...)
A Amnistia Internacional explica que a Arábia Saudita está a seguir o mesmo processo de "sportswashing" que o Qatar fez até a realização do Mundial, em 2022: "É uma forma de branqueamento das suas relações internacionais. Procuram tentar mostrar a imagem de um país avançado e tolerante, mesmo com a contratação de jogadores".
No entanto, a realidade no país é outra, segundo relata o diretor executivo da Amnistia. E dá exemplos concretos de "um clima de repressão muito grande".
"As mulheres são fortemente reprimidas nos seus direitos e liberdades, até há pouco tempo não podiam ir ver jogos de futebol, a liberdade de expressão é fortemente reprimida, vários dissidentes políticos são prisioneiros. Muitos jornalistas e 'bloggers', por criticarem o reino, foram condenados a chicotadas e penas de prisão. A liberdade de orientação sexual não existe", acusa
"Se o 'sportswashing' contribuir 1% para o crescim(...)
A Amnistia alerta também que os contratos financeiramente favoráveis que convencem jogadores e treinadores a transferir-se para este país incluem, por vezes, acordos de publicidade.
"A mensagem não é tão gratuita quanto isso. Muitas vezes é encomendada com contratos de relações públicas para servirem de embaixadores. Gostaria de ouvir as esposas que vão de visita para perceber se a liberdade que elas sentem e a imagem que têm é assim tão positiva. O país real é uma coisa, o que o futebol promove é, falsamente, outra", conclui.
A Arábia Saudita vai receber o Campeonato do Mundo em 2034, segundo já confirmou a FIFA. O investimento no campeonato nacional levou à contratação de estrelas como Cristiano Ronaldo e Neymar. O fundo de investimento do público adquiriu ainda o Newcastle, clube da Premier League.
A "final four" da Taça da Liga realiza-se, pela última vez em Leiria, entre 23 e 27 de janeiro deste ano. Benfica-Estoril Praia e Braga-Sporting são os confrontos das meias-finais.