22 fev, 2024 - 10:18 • Hugo Tavares da Silva , Luís Aresta
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Nasceu no Porto e foi com o clube daquela cidade que conseguiu o maior feito da carreira. Artur Jorge levantou a orelhuda em 1987, num palco de Viena, graças a um calcanhar argelino e à afinação de Juary. O treinador, que foi também “rei Artur”, morreu "serenamente" esta madrugada, aos 78 anos, depois de doença prolongada, confirmou a família.
“É um momento triste, principalmente para a sua família”, lamentou a Bola Branca António Sousa, um dos futebolistas que treinou. “É uma figura importante para o desporto nacional, é com pena que o vemos partir.”
Sobre Viena, Sousa recorda sobretudo o tal intervalo, as tais palavras do técnico, o mote para a cambalhota no marcador da final da Taça dos Campeões Europeus. “A palestra do intervalo é que me faz relembrar e de que maneira o momento alto do Artur.”
Uns anos depois, Artur Jorge explicou aquela equipa por palavras. “Era uma equipa muito forte, com muita qualidade, que quase jogava de cor”, confessou em entrevista ao “Público” em 2002, lembrando a rapaziada de 87. “Fizemos uma digressão europeia de final de temporada e a qualidade era tão grande que impressionava. O título deu-nos ainda mais confiança. Ainda que seja um exercício relativo, talvez fosse a melhor equipa que treinei, embora também tivesse uma formação extremamente poderosa no meu segundo ano no Paris Saint-Germain”, acrescentou.
Foi também nas Antas que começou a carreira de futebolista profissional, em 1964/65. Seguiu para a Académica, Benfica, onde passou mais anos como atleta, Belenenses e Rochester Lancers, onde pendurou as botas. Foi quatro vezes campeão e ganhou duas vezes no Jamor. Foi internacional português em 16 ocasiões e marcou um golo.
Mas foi como treinador que alcançou o olimpo dos olimpos. Sobretudo por aquele mágico 1987, em que levou os dragões à glória europeia, uma façanha inédita até ali para um treinador português e, já agora, para o FC Porto, que já havia perdido uma final europeia contra a Juventus, em 1984, na Taças das Taças, com António Morais no banco.
A carreira de treinador de Artur Jorge até começou no Vitória Sport Clube, em Guimarães, como adjunto, em 1980/81. Depois de passagens por Belenenses e Portimonense, já como principal, chegou ao FC Porto no verão de 1984.
A viagem desportiva do rei Artur foi rica em latitudes, com passagens por França (onde treinou um soberbo PSG), Suíça, Espanha, Holanda, Arábia Saudita, Rússia, Camarões, Kuwait e Argélia, onde terminou a carreira, em 2016, no MC Alger, poeticamente o país de Madjer. Quando surpreendeu as gentes do futebol com o regresso ao ativo, explicou-se com simplicidade: “Como se costuma dizer, o bichinho nunca morre. Cá estamos, com a mesma paixão de sempre”.
Em 1990, estreou-se como selecionador português, uma tarefa que voltaria a viver depois do Euro 1996, uma competição em que representou a Suíça, travando a seleção da casa, no jogo inaugural. Foi na seleção portuguesa que viveu um dos episódios mais tristes da carreira, com a agressão de Ricardo Sá Pinto.
Por justiça ao homem que agora parte, terminemos como começámos, com mais uma história da final de 1987. Esta foi Pinto da Costa que contou, no Porto Canal, em 2014. Um futebolista que o dirigente não quis nomear mandou-se para uma sauna, em Viena, antes do jogo. Artur Jorge não gostou e riscou-o logo. Pinto da Costa amoleceu a disciplina do mister.
“Artur, meta uma coisa na cabeça... Se calhar ir para a sauna até lhe fez bem. Nós estamos aqui para ser campeões, viemos armados em cordeirinhos para a matança, mas vamos ganhar. Não vamos estragar o nosso grande objetivo por causa da sauna”, recordou.
E continuou, sobre aquele momento a dois: “Ou somos campeões europeus hoje, ou nunca mais somos. Não vamos ficar só na história do FC Porto, vamos ficar na história do futebol, porque um clube de uma cidade pequena, sem recursos, ser campeão europeu contra um monstro como era e é o Bayern Munique, vai deixar-nos na história”. E lá foram campeões europeus, em princípio com o homem que se atirou para a sauna.
Na tal entrevista ao "Público", perguntaram a Artur Jorge o que mais recordava da noite de Viena. "Só quando o árbitro apitou é que tivemos a noção de que éramos campeões europeus à custa de um dos melhores clubes do Mundo", reconheceu.
"Foi uma alegria imensa. A primeira associação que se costuma fazer é com o calcanhar de Madjer. Todos os momentos foram especiais. O Madjer fez um grande golo, o Juary também e houve aquela jogada do Futre... Jogámos de acordo com a qualidade da equipa. Foi um dia bom e uma época fantástica, em que ganhámos quase todos os jogos."