24 set, 2021 - 12:00 • Pedro Azevedo
Foi há 60 anos, a 24 de setembro de 1961, em Alvalade. O Sporting acabava de empatar a zero com o Lusitano de Évora do uruguaio Humberto Buchelli quando Otto Glória proferiu uma frase com grande impacto e que caiu mal em Alvalade, numa crítica implícita à direção e à qualidade dos jogadores: “Não posso fazer omeletas sem ovos.”
Otto Glória treinador do Sporting escolhera um onze com: Carvalho; Morais, Lúcio Soares, António Morato e Hilário; Mário Lino, José Pérides e Casaca; Figueiredo, Cabrinha e Serranito. O nulo e a exibição descolorida desiludiram os adeptos leoninos. A frase é uma das mais célebres frases da história do futebol português. Ainda hoje usada, 60 anos depois.
O Benfica tinha sido o campeão nacional e da Europa em 1961 e, na primeira ronda, vencera em Matosinhos, por 2-1, com dois golos de Eusébio. Perante essa conjuntura, o deslize do Sporting logo a abrir o campeonato da época 1961/62 teve uma carga muito negativa em Alvalade. Sobre o plantel leonino, Otto Glória disse também, então, que “quando não se pode andar de casaco, anda-se de jaqueta”.
Frases perturbadoras que geraram instabilidade e duras críticas dos adeptos e dos redatores do então “Boletim do Sporting”. Otto Glória não resistiu e pediu a demissão. Entrou Juca na segunda jornada. O português estreou-se com triunfo nas Antas, por 2-0, frente ao FC Porto, e o Sporting acabaria por ser campeão nessa época.
Depois da saída de Alvalade, Otto Glória ficou desempregado até fevereiro de 1962, altura em que foi convidado pelo Marselha. Não se adaptou e tornou ao Brasil até novembro do mesmo ano. Regressou a Portugal para orientar o FC Porto. Voltaria ao Sporting para ser campeão em 1965/66.
Terceiro classificado no Mundial 1966 como selecionador português, Otto Glória foi campeão pelo Benfica em 1954/55, 1956/57, 1967/68 e 1968/69.
Era um treinador revolucionário, tanto no discurso como nos métodos. Otto Glória também foi treinador de basquetebol, transportando para o futebol desenhos de aproveitamento dos ressaltos defensivos e ofensivos, marcação à zona, posse e triangulações.
Naquele polémico discurso, outra frase ficou igualmente célebre, sobre a forma como em Portugal os treinadores eram tratados perante os resultados: “Quando se perde o treinador é chamado de besta, quando vence, de bestial.” Uma frase que também não entrou em desuso.
Controverso, Otto Glória tinha fama de disciplinador. Impôs regras aos jogadores, proibindo jogos de cartas e dados e estabelecendo recolha noturna obrigatória a solteiros e casados em horários diferentes. Os transgressores pagavam multas que podiam chegar a meio ordenado. Proibiu o presidente do Benfica que o descobriu, Joaquim Bogalho, de entrar no balneário para falar com os jogadores. Bogalho apostou no treinador brasileiro em 1954. Deu-lhe 60 contos de luvas, um salário de 12 contos e prometeu ao treinador 100 contos por cada título conquistado.
Otto Glória foi treinador durante 35 anos. Na Europa, treinou Benfica, Sporting, Belenenses, FC Porto, Marselha, Atlético de Madrid e a seleção portuguesa. No Brasil, Vasco, América, Grémio, Portuguesa, Santos. Também orientou o Monterrey, do México, e a seleção da Nigéria, com que conquistou, em 1980, a Taça das Nações Africanas.
Na parte final da carreira, voltou a Portugal, para treinar a seleção, entre 1982 e 1983.
Otto Glória faleceu com 69 anos, a 9 de abril de 1986, três anos depois de ter orientado o Vasco da Gama, o primeiro e último clube da carreira como treinador.