07 set, 2018 - 08:00 • João Carlos Malta
Em 2008, ainda muito longe de ser o presidente consagrado que ficará na história do Benfica, pelo menos, pelos títulos que entretanto conquistou, Luís Filipe Vieira pedia "uma purga no futebol português". Vivia-se o rescaldo do processo Apito Dourado, que quase ferira de morte o rival FC Porto, mas o líder encarnado não estava satisfeito.
Vieira atacava por todos os flancos, numa altura em que a embrionária BTV passava em “loop” as escutas do processo Apito Dourado. Vieira falava amiúde do tema e pedia urgência na “limpeza”.
“Era importante que a Judiciária começasse a entrar definitivamente no futebol. Aquilo que se está a passar em alguns campos do país é muito grave, para não dizer que os resultados estão a ser completamente viciados jogo a jogo. Já não vale a pena jogarmos bem, não vale a pena massacrarmos, porque temos algo que nos controla. Não vale a pena fazer escutas telefónicas, basta seguir meia dúzia de pessoas para perceber o que está a fazer-se no futebol português”, afirmou o presidente do Benfica, há uma década.
Nessa época, Vieira tentava desgastar a força que os portistas demonstravam no campo, com acusações de falta de transparência e da existência de vários crimes. “Poderá alguém celebrar um sucesso construído em práticas ilícitas?”, questionava.
A pergunta era retórica, claro, e o próprio questionador rspondia: “Já sabemos que sim, mas esse não é o nosso destino. O nosso destino é acabar com a impunidade e aqueles que pensaram, e continuam a pensar, que as ações mais baixas não acarretariam consequências têm de saber que o futebol português vive bem sem o compadrio, a mentira e a corrupção. Têm de sentir que a justiça atua e castiga, têm, por fim, de saber que a justiça divina vem depois, mas, antes, que têm de responder pela justiça dos homens”.
Luís Filipe Vieira negava poder algum dia seguir as práticas imputadas ao FC Porto, mas, dez anos depois, o líder benfiquista está do outro lado. O clube está envolvido numa mão cheia de casos judiciais que ensombram o líder de forma direta ou indireta. É arguido no caso Lex e o Ministério Público afirma que sabia do esquema alegadamente engendrado por Paulo Gonçalves no caso "e-toupeira".
Mentiras ou verdades?
A Polícia Judiciária passou a entrar com frequência no Estádio da Luz e a sair de lá com material que dá origem a processos judiciais.
“Não me incomoda nada que a Policia Judiciária venha cá.(..) Não é por uma mentira ser repetida muitas vezes que se torna verdade. Não é por existirem investigações sem muitas investigações com base em denuncias anónimas que se prova qualquer irregularidade”, argumentou, recentemente.
Vieira teve, entretanto, de fazer uma transição defensiva num tema em que antes atacou. No ano passado, numa entrevista à BTV no pico do caso dos “emails”, repetia a declaração de inocência. “Não há nem nunca houve corrupção no Benfica. O que foi cometido há seis meses foi um crime contra o Benfica e esse crime tem, semanalmente, vindo a acontecer. Não estávamos preparados para este tipo de crime organizado nem pensávamos que podia acontecer”, declarava.
Mas se Vieira, agora, se queixa de que o Benfica foi alvo de um crime informático, que o diretor de comunicação do FC Porto, Francisco J. Marques, usou no programa “Universo Porto” para denegrir o clube e os seus dirigentes, em 2007, o presidente do Benfica usava outros argumentos quando se referia ao tratamento dado ao Apito Dourado.
"Sabem os nomes das pessoas que estão na praça. Ouviu alguém desmentir? Ouviu dizer é que as escutas são ilegais e inconstitucionais. Mas não se passou só naquele tempo. Foi há muitos tempos atrás", argumentava, na SIC, Luís Filipe Vieira.
Uma guerra com mais de uma década
Ao longo dos anos, pontualmente e sempre que a guerra com os azuis-e-brancos voltava a reacender-se, o tema da corrupção na arbitragem. Em 2009, Vieira atirou-se à Justiça.
“A justiça portuguesa declarou que alguns podem continuar a agir fora da lei com total impunidade. Ficámos a saber que os presidentes dos clubes de futebol podem receber árbitros em casa na véspera dos jogos, porque, para a justiça portuguesa, trata-se de um ato normal que não merece condenação, nem recriminação pública”, argumentava.
Três anos mais tarde, os portistas estavam de novo na mira, depois das criticas lançadas pelo facto de o Benfica ter apagado a luz do estádio, depois de o FC Porto ter ali ganho o título nacional.
“Ainda têm a lata de falar em apagões quando a sua história foi marcada por fruta, corrupção e compadrio. O seu sucesso é e foi construído com base na maior mentira do desporto português”, dizia Vieira. “O sistema ainda não acabou, continua baseado na intimidação, na violência e nos favores."
Em março 2017, Vieira voltou ao tema Apito Dourado para dizer que "não estamos à espera de outro Apito Dourado, porque esse não voltará a existir”. “O país está muito mais preparado, a comunicação social também e tudo mudou.”
No entanto, oito meses depois o clube por si liderado, acossado por muitas acusações, voltou a pegar no tema, anunciando a existência de um novo Apito Dourado.
Há três meses, quando a PJ foi à Luz por causa do caso de aliciamento a jogadores de outras equipas, o caso “Mala Ciao”, Vieira reavivou acusações aos rivais do Norte.
“As denúncias resultam de mais uma denúncia anónima do Porto e que está a ser investigada pelo DIAP do Porto e baseia-se em factos falsos, envolvendo empréstimos de jogadores da I Liga. As buscas vão isentar o Benfica de qualquer suspeição”, afirmou.
Neste caso ainda não sabemos se assim será, mas se é verdade que o presidente do Benfica já obteve uma vitória com o arquivamento do caso dos vouchers, as suspeitas sobre o Benfica e Luís Filipe Vieira estão a crescer.