30 dez, 2015 - 03:19
A capitalização do Novo Banco (NB) à custa dos grandes obrigacionistas pode trazer uma chuva de processos judiciais. O aviso é deixado pelo director executivo do jornal “Expresso”, Pedro Santos Guerreiro, em entrevista à Renascença.
O jornalista, especializado em economia, fala sobre o "bail-in" - ou resgate interno - no NB, a solução encontrada para poupar os contribuintes portugueses.
O resgate interno é uma solução sem qualquer tipo de risco para o Estado?
O risco está nos processos judiciais que agora vão chover em catadupa, com toda a certeza, porque do que estamos a falar é de credores, investidores que confiavam no banco, na altura no Banco Espírito Santo, e que compraram obrigações. Comprar obrigações é a mesma coisa que emprestar dinheiro. Agora, levaram um calote. Há esse risco legal que vai recair sobre o Fundo de Resolução, que é representado pelos demais bancos.
O banco mau também começa a desaparecer…
Sim. Em vez de vermos, como no caso do BPN, em que estamos há muitos anos a assistir à venda dos activos tóxicos, desta vez, avança-se para uma liquidação o que, no fundo, significa uma aceleração da venda desses activos. O ‘banco mau’ tem activos, tem créditos, que não vão ser pagos na totalidade e, quando os vender, vai receber um valor muito menor do que seria necessário para pagar aos credores. Depois, será feita uma distribuição, em função de determinados critérios, pelos credores. A esses credores somaram-se agora estes detentores de dívida sénior, das obrigações seniores, que não perdem tudo, mas perdem quase tudo, porque a receita que vai ser gerada com a venda dos activos do chamado ‘BES mau’ há-de ser muito inferior a estas dívidas.
O que valem estes 2 mil milhões de euros para o Novo Banco?
É, provavelmente, o suficiente para evitar um aumento de capital. Quando, há um ano, foram injectados 4,9 mil milhões de euros, foi dito por muitos analistas que o valor não era suficiente e, agora, isso confirma-se. Era preciso injectar mais dinheiro e a hipótese que já estava em cima da mesa era a de serem, outra vez, os contribuintes portugueses a pagar. Ora, não foi isso que aconteceu. Há uma compensação, porque há uma dívida do Novo Banco que desaparece, e, dessa forma, são outros que perdem. Não são os contribuintes, são credores privados. Isto é um escândalo, de qualquer forma, só que, desta vez, o escândalo não bate à porta dos contribuintes portugueses.
O que significa a reserva de fundos próprios exigida pelo Banco de Portugal a seis bancos “sistémicos”?
É começarmos a criar aquilo que já devíamos ter criado há muitos anos na Europa e, sobretudo, em países como Portugal, onde o risco era muito maior. Ou seja, ter fundos disponíveis para que, em caso de um banco colapsar, o sistema esteja preparado para acomodar o impacto e que não tenham de ser contribuintes a compensar. Com o novo quadro comunitário da união bancária, o que acontece a partir de Janeiro é que, em caso de colapso de um banco, já não são os contribuintes que entram em primeiro lugar. Há, primeiro, uma sucessão de perdas, que passa a incluir os maiores depositantes. Para os bancos sistémicos - era o caso do BES e não do Banif -, é preciso ter uma rede de segurança para evitar o contágio a todo o sistema financeiro de um prejuízo que resulte da queda de um banco. Nós não tínhamos esses mecanismos e, portanto, foi preciso o Estado entrar. Agora, vamos começar a formá-los, mas, mesmo com o início do arranque deste fundo, não é no próximo ano que vamos ter uma rede já preparada para um impacto deste género. Vamos é começar a semeá-lo para que, mais tarde, ele esteja disponível.