15 abr, 2016 - 08:42
“Isto são tentativas de guerra política para pressionar o governador do Banco de Portugal a sair do lugar”, diz à Renascença o economista João Duque, comentando a polémica que opõe Governo e governador do banco central.
Numa acta do Banco Central Europeu com data de Dezembro consta que foi o Banco de Portugal a sugerir ao BCE a limitação de financiamento ao Banif, enquanto, em Portugal, o governador pedia ao Governo formas de garantir dinheiro ao mesmo banco, que acabou por receber dois mil milhões de euros.
“Parece [uma atitude] contraditória, porque se está a pedir para deixar de ter dinheiro e a seguir está-se a pedir para injectar dinheiro, mas são formas de financiamento eram diferentes”, começa por explicar o economista.
“O que se pedia ao BCE era para fechar um financiamento de emergência e ao Governo pedia-se um aumento de dinheiro de forma mais estável”, acrescenta.
João Duque considera, por isso, que aquilo a que estamos a assistir não passa de "guerra política na praça pública".
“Estamos num estilo de liderança com responsáveis de vários cargos e instituições em Portugal a serem pressionados publicamente para sair ou são demitidos. Isto é mais um caso: o Ministério das Finanças não quer o governador do Banco de Portugal e vai fazer tudo, tudo para arranjar uma justificação – e a ‘falha de informação grave’ é uma justificação para demissão do governador. É assim que eu vejo” este caso, afirma.
De acordo com o estatuto do governador do Banco de Portugal "um governador só pode ser demitido das suas funções se deixar de preencher os requisitos necessários ao exercício das mesmas ou se tiver cometido falta grave".
“Se fosse uma pessoa da cor política do Governo, eu tenho muitíssimas dúvidas que se invocasse uma falha de informação grave com este tipo de confrontação entre uma carta e outra carta”, afirma o professor do ISEG, lembrando que “são tipos de financiamento diferentes”.
João Duque prevê, por isso, que “o deslindar deste caso, e desta situação em concreto, não vai trazer responsabilidade nenhuma a ninguém – nem a Governo nem ao governador do Banco de Portugal” e, portanto, ninguém vai poder ser esclarecido.
Lembrar o que João Soares fez com António Lamas
Também a editora de política da Renascença, Eunice Lourenço, considera que o Governo estará à procura de pretextos para afastar Carlos Costa.
“O Governo tem mantido Carlos Costa sob pressão e nos dias em há comissão de inquérito ao caso Banif no Parlamento, o Governo, ou um dos partidos que o apoia, acusa Carlos Costa mais alguma coisa, minando a sua credibilidade”, afirma a jornalista, considerando esta “situação insustentável do ponto de vista político e daquilo que se pretende de um governador do banco central, que deve estar preservado da luta política e partidária”.
“O que se passa é que o Governo não respeita Carlos Costa e Carlos Costa também parece não confiar no Governo. Aos poucos o que parece é que o Governo quer fazer com Carlos Costa o que João Soares fez com António Lamas”, conclui.
A Renascença procura um comentário a estas análises quer do Ministério das Finanças quer o Banco de Portugal.
PS quer explicações rápidas
O PS defendeu que o governador do Banco de Portugal deve esclarecer "quanto antes" que não omitiu informação no caso Banif, admitindo poder chamá-lo ao parlamento para "esclarecimentos adicionais".
"É do interesse do Banco de Portugal esclarecer toda esta situação. Vamos aguardar pelo envio da ata completa e só depois, se entendermos que se justificam explicações adicionais do governador, iremos chamá-lo" ao parlamento, disse à agência Lusa o deputado socialista João Galamba.
O vice-presidente da bancada parlamentar socialista defendeu que o governador do Banco de Portugal deve esclarecer a situação e "demonstrar de forma definitiva que não houve nenhuma tentativa de ocultar informação".
"Ontem [quinta-feira], o Sr. governador tentou, através de comunicado, dizer que estávamos perante uma ata truncada e que a divulgação da ata completa esclareceria melhor o papel do banco. O problema aqui é que o Banco [de Portugal], na comissão de inquérito, sugeriu sempre que não tinha sido por sua iniciativa, que tinha sido algo imposto de fora para dentro, que lhe tinha sido imposta e que o Banco nem tinha concordado", recordou.
CDS quer ouvir os vários implicados
O CDS-PP vai apresentar um requerimento para chamar ao parlamento o governador do Banco de Portugal, o ministro das Finanças e o vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE) Vítor Constâncio para esclarecerem os últimos desenvolvimentos relativos ao Banif.
"Vamos apresentar ainda hoje de manhã um requerimento que entendemos ser fundamental para pôr um ponto de ordem na comissão de inquérito ao Banif. Entendemos que não é possível continuar com os trabalhos da comissão sem esclarecer matérias que foram conhecidas nos últimos dias", disse à agência Lusa o deputado do CDS-PP João Almeida.
O deputado, que é também porta-voz do partido, lembrou que o CDS-PP na quinta-feira, com base na documentação que entretanto tinha chegado, revelou que "foi o Banco de Portugal que propôs a resolução do Banif e o BCE se limitou a aprovar a proposta do Banco".
"Isso é algo que nunca tinha sido discutido na comissão e que o Banco não tinha dito à comissão. Ontem, soubemos que quer o Ministério das Finanças quer Vítor Constâncio intervieram no sentido de agilizar o processo pelo qual o Santander ficou com o Banif em condições favoráveis", disse.
[notícia actualizada às 11h00]