19 abr, 2016 - 14:17 • Pedro Mesquita
O presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB) apela, em entrevista à Renascença, à cooperação institucional entre o Governo e o Banco de Portugal. Fernando Faria de Oliveira não tem dúvidas: o “ruído em curso” à volta do caso Banif “pode fragilizar os interesses do Estado português” e enfraquece as instituições, desde logo o Banco de Portugal.
Numa rara entrevista, Faria de Oliveira classifica de “insólita” a forma como o caso Banif está a ser tratado e lamenta a polémica instalada entre o Governo e Carlos Costa, que "põe em causa a confiança nas instituições, que é o pior que pode acontecer ao país".
Em defesa do interesse nacional, o presidente da APB não equaciona a saída do governador do Banco de Portugal e insiste que a turbulência tem que ser ultrapassada.
Como é que vê toda esta guerra na praça pública entre o Governo e o governador do Banco de Portugal?
Considero que é insólito que matérias sensíveis sejam, de facto, discutidas como estão a ser. A confiança nas instituições é fundamental na percepção dos mercados e dos centros de decisão politica.
O ruído, em curso, enfraquece as instituições e, designadamente, enfraquece uma instituição com a importância que o Banco de Portugal tem, mas não só. Pode fragilizar os próprios interesses do Estado português. Tem que haver uma cooperação institucional, cada vez mais fortalecida, entre o Governo, o Banco de Portugal e os reguladores em geral e o próprio sistema bancário.
Mas o que é facto é que não tem havido. Ainda esta terça-feira ouvimos o governador Carlos Costa a dizer que não tinha informado o Governo (do pedido ao BCE para que limitasse o financiamento ao BANIF) porque não o podia fazer. Já o governo utilizou a expressão "falha grave", que é um dos dois motivos possíveis para se afastar um governador. Esta situação é sustentável? É ultrapassável ou já se chegou a um limite em que o governador do Banco de Portugal não tem condições para continuar?
Tem que ser ultrapassável. O senhor Presidente da Republica ainda na sexta-feira utilizou uma expressão correctíssima em relação a esta matéria: "a estabilidade financeira, como a estabilidade política, são elementos essenciais que têm de ser preservados.
Até que ponto é que esta situação pode ter lesado, e muito, o país e os contribuintes? Como poderia ter sido evitada?
A instituição Banco de Portugal é uma instituição autónoma. Actua de acordo com essa autonomia, naturalmente com o dever da informação, na altura em que ela tem que ser prestada, e isso depende das regras em curso, com o Governo... e de uma cooperação intensa no sentido de preservar o sistema. Em relação a esta matéria, acho que não tenho mais ainda a acrescentar.
Tem havido falhas de supervisão de Carlos Costa? BES, Banif...
Não alimento mais esse tipo de ruído.
Mas como é que os portugueses deverão olhar para casos como o BES ou o Banif? Os portugueses andam sucessivamente com questões destas. O que é que diria aos portugueses e à banca em geral?
Eu já lhe disse que não alimento mais este tipo de polémica porque ela põe em causa a confiança nas instituições, que é o pior que pode acontecer ao país. Pense em quem é que beneficia deste tipo de situações...
E quem é?
Naturalmente os litigantes.
Um caso que está em apreciação é o Banif, com uma comissão de inquérito. O que é que se deve dizer dos políticos e do supervisor? O que dizer da estratégia seguida por Maria Luis Albuquerque primeiro e, agora, por Mário Centeno?
Bom, a Associação Portuguesa de Bancos tem por princípio não comentar casos específicos dos seus associados. A APB, em relação à decisão de resolução do Banif, não foi ouvida, nem teve conhecimento prévio dos contornos da operação que não sejam aqueles que foram divulgados publicamente. A comissão de inquérito está em curso e devemos aguardar as conclusões. A única coisa que posso acrescentar é que nos surpreendeu a decisão, porque estava em curso uma tentativa de venda, mas terá sido ditada provavelmente devido à entrada em vigor do quadro-relatório europeu que, a partir de 1 de Janeiro, tinha contornos diferentes e, portanto, terá requerido uma decisão antes do final do ano. Seja como for, os depósitos foram, de facto, preservados.
Entretanto, o primeiro-ministro veio a público sugerir a criação de um chamado "banco mau". Não terão, os contribuintes, mais razões para ficarem alarmados?
O agravamento da nossa situação económica, verificado desde a crise da dívida soberana, fez disparar os níveis de incumprimento do crédito o que, como todos sabemos, fere os bancos.
Mas, neste quadro, o chamado "banco mau" seria uma solução?
Pode ser, pode ajudar. Acho que isso tem que ser reflectido profundamente, verificar quais são as melhores soluções. Por exemplo, há matérias que não tem a ver com o "veículo" e que são extremamente importantes para a resolução deste problema. É o caso da eliminação dos constrangimentos que existem de natureza fiscal, legal e judicial. Dificultam a resolução do elevado nível de crédito vencido das empresas. Actuar sobre esta matéria ajudará enormemente, não tem nenhuns custos para os contribuintes e, na realidade, contribuiria definitivamente para a melhorias destas circunstâncias. Nós estamos disponíveis para trabalhar conjuntamente com o governo e o Banco de Portugal no sentido de se encontrar as vias adequadas.
Última pergunta: a OPA do CaixaBank sobre o BPI ainda não pode acelerar porque o Banco de Angola ainda tem uma palavra a dizer. Está optimista?
Naturalmente que sim. Penso que não interessa a ninguém que não se resolva. Parece ser uma boa solução que permitirá o cumprimento das exigências do BCE em relação à exposição do BPI em Angola. Nesse sentido não posso deixar de ser optimista.