02 mar, 2017 - 00:48 • Graça Franco (Renascença) e Vítor Costa (Público)
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A presidente do Conselho de Finanças Públicas (CFP) diz que não há intromissão do Governo naquela entidade, até porque tal seria ilegal. Mas em entrevista à Renascença e ao jornal “Público”, Teodora Cardoso adverte: “Uma intrusão do Governo que pusesse em causa a nossa independência teria um custo político”.
O Governo continua sem tomar uma decisão sobre os dois nomes que tem em cima da mesa para entrar no Conselho de Finanças Públicas (CFP). Uma situação que está a demorar e a causar incómodo na instituição liderada por Teodora Cardoso.
Em causa está o facto de, tal como o “Expresso” já noticiou, dois membros do conselho superior deste organismo estarem de saída tendo terminado os seus mandatos em 16 de Fevereiro: o vice-presidente do CFP, Jürgen von Hagen, e o vogal-executivo, Rui Baleiras.
Para a substituição destes dois responsáveis, e tal como é determinado nos estatutos do CFP, o Tribunal de Contas e o Banco de Portugal propuseram ao Governo dois nomes: Teresa Ter-Minassian, responsável do Fundo Monetário Internacional (FMI) que negociou um resgate a Portugal, e Luís Vitório, antigo chefe de gabinete de Paulo Macedo. Ora, segundo o “Expresso”, o Governo não aceita o segundo nome.
Os estatutos do CFP determinam que “os membros do Conselho Superior são nomeados pelo Conselho de Ministros, sob proposta conjunta do presidente do Tribunal de Contas e do governador do Banco de Portugal” e que a nomeação deve ocorrer “até 60 dias antes do final dos mandatos dos membros do Conselho Superior”.
Em entrevista à Renascença e ao jornal “Público”, Teodora Cardoso diz que não há intromissão do Governo no CFP, até porque tal seria ilegal.
A presidente do Conselho diz esperar que haja “possibilidade de diálogo”, pois o prolongamento da actual situação não interessa a ninguém. “Até a nível internacional. Somos uma identidade que é ouvida pelas instituições internacionais, pelos mercados (…) e haver uma intrusão do Governo que pusesse em causa a nossa independência teria um custo político”, adverte.
Foi a primeira mulher economista a fazer parte dos quadros do Banco de Portugal. Na terça-feira, o “Público” noticiou a intenção do Governo em ver mais mulheres no topo da hierarquia. Faz sentido?
Faz e não faz. Efectivamente, o banco tinha uma história longa, devo dizer, antiga, de discriminação contra as mulheres que custou muito a evoluir. Entrei no banco em 1973 e, aí, realmente nem sequer havia mulheres a nível técnico, ou de qualquer tipo de chefia, mesmo de chefias dos serviços administrativos, e isto tem sido difícil de vencer. Agora, que a solução para vencer esse tipo de resistência consista em definir quotas ou em fazer exigências de natureza política, isso vira-se contra as mulheres, no sentido de dizer: estão nesta posição porque politicamente se criou esta pressão.
É melhor chegar lá pela via de mostrar que efectivamente somos capazes de chegar e, portanto, tem de haver regras nas admissões, nos concursos, nesse tipo de coisas, em que as mulheres tenham de facto igualdade de oportunidades. Isso é que me parece essencial.
Já no Conselho de Finanças Públicas, a que preside, o Banco de Portugal tinha indicado Teresa Ter-Minassian, a italiana que em nome do FMI negociou o segundo acordo com Portugal, para integrar o Conselho de Finanças e aí foi o Governo que impediu.
Bom...
Há aqui um paradoxo ou não?
Do Governo, até agora, não se pode exactamente dizer assim se impediu ou não impediu, porque...
Fez veto gaveta?
Até agora não fez as nomeações, mas também não fez aquilo que era suposto fazer no caso de ter objecções aos nomes que foram propostos, que seria pedir aos proponentes que justificassem a sua proposta para se chegar, digamos, a um possível acordo. Essa fase ainda não aconteceu. Penso que agora terá de ser isso que tem de suceder. Pela parte que me toca, devo dizer que tenho grande esperança em que Teresa Ter-Minassian seja nomeada, até porque acredito que ser mulher ou homem para o caso, neste caso, não interessa muito. É alguém que tem um perfil que é único, pelo conhecimento que tem da realidade portuguesa e, por outro lado, por toda a carreira internacional. Todas essas coisas pesam e não há nenhum perfil que seja sequer comparável ao dela. Não acredito que seja possível recusá-la.
Estes dois casos são pontuais ou são demonstrativos de uma maior intromissão do Governo na gestão das entidades reguladoras ou de supervisão ou de fiscalização?
Temos estatutos que definem com muita clareza a nomeação dos membros do Conselho e várias outras regras com respeito, por exemplo, a aprovação do orçamento, etc. Essas regras foram postas nos estatutos exactamente para salvaguardar a independência da instituição e, portanto, ao contrário do que sucede com as entidades reguladoras em geral, no caso do Conselho de Finanças Públicas, essa intromissão é ilegal. Tem esse aspecto que torna a coisa mais difícil de gerir da parte do Governo, por isso, espero que haja aqui possibilidade de diálogo. Não interessa a ninguém que a situação se prolongue. Até a nível internacional. Somos uma entidade que é ouvida pelas instituições internacionais, pelos mercados (…) e haver uma intrusão do Governo que pusesse em causa a nossa independência teria um custo político.
Mas parece-lhe que é isso que está acontecer?
Penso que não. Agora, há a necessidade de voltar a pôr o processo na mesa, perguntando ao Governo porque é que não nomeia, e aqui deve gerar-se um diálogo que eu espero que funcione.