30 mar, 2017 - 00:00 • Graça Franco (Renascença) e David Dinis (Público)
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Este ano não teve os sindicatos na rua, no próximo pode ter. E tem a união entre o Bloco e o PCP...
Mas está a organizar? [sorrisos]
Não, mas admito que os seus parceiros não aguentem mais estar calados perante o adiamento da integração dos precários e...
Não há adiamento nenhum. O estudo muito aprofundado que fizemos na campanha permitiu a identificação dos desafios difíceis que teríamos ao longo da legislatura. Se olharem para trás, vêem que temos aplicado com imenso critério todas as medidas que nos propusemos adoptar. As questões das carreiras e da precarização estavam previstas para serem implementadas a partir de 2018 e estudadas este ano, é o que estamos a fazer. Não há atraso nenhum.
Como é que o vai fazer?
Está previsto que em Outubro esteja claro o processo e implementação da precarização. Em relação às carreiras já está previsto o faseamento do descongelamento.
Disse faseamento?
É o que lá está escrito, no Programa de Estabilidade do ano passado. São 200 milhões de euros em cada um dos próximos exercícios orçamentais. E agora precisamos de saber qual é na verdade – porque o conjunto de informação que existe sobre a Administração Pública é muito mais limitada...
Sobre o IRS, já consegue garantir que haja margem para rever os escalões em 2018 ou haverá só uma redistribuição?
Estamos a estudar as várias medidas fiscais que podemos vir a implementar no ano que vem. Também aí eu remeto para o Programa de Estabilidade: no documento que vamos reapresentar no próximo mês haverá uma dimensão orçamental para ajustamentos na fiscalidade directa e que terá como objectivo apoiar aqueles que, do ponto de vista fiscal, mais necessitam desse apoio.
Quando é que vai aparecer o imposto negativo para aqueles que, trabalhando, ficam na linha de pobreza?
Nós temos muitas medidas no Orçamento, no lado fiscal e no lado da Segurança Social, nessa dimensão – as medidas do abono de família têm também a ver com isso. Estamos a estudar e está dentro da resposta que estava a dar, um conjunto de medidas que têm um enquadramento orçamental para poder chegar a indivíduos que, do ponto de vista fiscal, não têm o tratamento que outros já conseguem ter...
Está para breve o relatório final do grupo de trabalho nomeado pelo Governo, juntamente com o Bloco de Esquerda, para avaliar a situação da dívida externa. O Governo vai assumir uma preferência sobre soluções?
A gestão da dívida pública portuguesa feita pelo Governo é do conhecimento público. E, portanto, não vejo razão nenhuma para que haja nenhuma alteração dessa política.
O Governo está dentro desse grupo de trabalho…
O carácter institucional desse grupo de trabalho é muito diferente do que está a descrever. A política de dívida e de gestão da dívida do Governo é conhecida e vai ser mantida.
Nos últimos anos a dívida pública não parou de aumentar - até mesmo em 2016. O que é que se passou?
O ano de 2016 foi o melhor ano orçamental de sempre do Portugal democrático. O défice de 1,9% (ou 2,06%) contribui, de certeza, para a evolução da dívida pública. Se tirarmos os juros, Portugal tem um excedente entre receitas e despesas de 4 mil milhões de euros. Acontece que foi necessário financiar duas intervenções no sistema financeiro em 2016: a do Banif, 1.700 milhões em Fevereiro; e a da CGD que já está na dívida de 2016 (esta quinta-feira, quando for concretizada a injecção de capital, o Estado não vai pedir mais dinheiro emprestado). Há 4.400 milhões de euros da dívida de 2016 que não decorre da actividade orçamental regular. Se a retirássemos, a dívida bruta cairia.
Está descansado relativamente à trajectória da dívida em 2017?
Sim. Por estes motivos. Projectamos um novo superávite primário, porque projectamos uma redução da despesa média em juros. E assim vamos ter uma evolução da dívida compatível com aquilo que é o desejo do Governo no médio prazo, que é que ela reduza.
Se sairmos de Procedimento de Défices Excessivos, passamos a ser tratados com normalidade pela UE. Mas isso implica o nosso compromisso de reduzir a dívida até 60%. A média de redução por ano deve ser de 3,5 pontos. Como é que vamos conseguir esse milagre nos próximos anos?
Não há milagre nenhum, essa é uma palavra que não faz parte da execução orçamental. No braço preventivo do euro [onde Portugal deve entrar], os países não têm menos exigências. Ganham flexibilidade orçamental, por exemplo, no investimento e no financiamento de reformas estruturais, no acesso aos fundos do Plano Juncker. E ganham uma credibilidade externa que é completamente diversa. É evidente que temos que aproveitar bem este lado positivo da nossa saída do braço correctivo do Pacto de Estabilidade. E é evidente que o exercício de 2017 e os seguintes são exigentes do ponto de vista orçamental. E têm que ser lidados com o mesmo rigor e exigência do que o de 2016. E é por isso que o Governo tem uma projecção de défice de 1,6% este ano. É por isso que todo este movimento de "upgrade" da sua relação com os credores e com os mercados internacionais pode ter também um impacto positivo nas contas públicas. Ou seja, não há uma diminuição da exigência – isso nunca foi dito por este ministério, antes pelo contrário.
Há um rigor que tem que ser mantido. E para mantermos metas tão exigentes como o país merece – porque o país merece que a sua visibilidade lá fora se altere –, temos que nos comportar como tomando muito a sério esta trajectória de redução. Não é fácil, mas o país está equipado com as qualificações, mão-de-obra e agora com a credibilidade que precisamos.
Catarina Martins parece menos confiante que este plano dê resultado. Esta semana, ela e Jerónimo de Sousa coincidiram no pedido para que Portugal se prepare para sair do euro. Concorda?
Nem era necessário dar uma resposta. Portugal é um país do euro, é um país do euro desde o início, deve permanecer um país do euro, cumprir as suas obrigações. Deve ter uma posição crítica e construtiva sobre a evolução do euro.
António Costa disse que com o presidente do Eurogrupo não deve haver mais conversa. Como é que vai ser nas reuniões? Conversa com ele?
Conversa é um tom demasiado coloquial para o que se passa no Eurogrupo. Temos decisões muito importantes para tomar no Eurogrupo, a agenda que Portugal está a colocar em cima da mesa na Europa é muito exigente, mas crucial para o desenvolvimento da UE. Vamos com certeza continuar a debater, se quiser a conversar, sobre estas questões, à mesa do Eurogrupo. A Europa está numa posição muito privilegiada para responder aos desafios económicos que se colocam. Muito melhor do que outras áreas que apresentam mais debilidade no lado orçamental e económico – em particular nos desequilíbrios externos. É hora de, juntos, tomarmos consciência dessa força e usarmos dessa posição, para o bem dos povos que cada um de nós governa, à sua maneira, em cada um dos países.
Esta entrevista resulta de uma parceria uma parceria Renascença/Público.