A presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) afirmou este domingo que "gostaria muito de ver" quem tem responsabilidades em Portugal a "tomar uma posição" sobre a greve dos tripulantes portugueses da Ryanair.
No segundo de três dias de paralisação não consecutiva, que termina na quarta-feira, a companhia aérea irlandesa Ryanair está a proceder à substituição dos grevistas portugueses, recorrendo a outras bases europeias, denunciou hoje o sindicato.
"Gostaria muito de ver quem tem responsabilidades neste país a tomar uma posição, não podem brincar com os portugueses, não podem pôr sempre os portugueses de chapéu na mão a pedir que venham para cá investir" e que quem invista em Portugal "faça 'tábua rasa' do nosso ordenamento jurídico e da nossa legislação", disse à Lusa a presidente do SNPVAC, Luciana Passo.
"Temos leis, temos regras, temos dignidade, olhem para estes tripulantes da Ryanair e respeitem", acrescentou, salientando que os tripulantes portugueses que estão em greve "tiveram uma enorme coragem em tomar esta iniciativa de ação de greve que, por contrato, curiosamente não podem", acrescentou.
Luciana Passo adiantou à Lusa que o sindicato apresentou, hoje inclusive, uma denúncia à ACT - Autoridade para as Condições de Trabalho devido à substituição de grevistas, prática proibida por lei.
"A Autoridade para as Condições de Trabalho teve uma intervenção fantástica, imediata, dentro dos recursos que tem e não tem, no dia 29 [de março], mas não chega, tem de ir mais acima, fez tudo o que podia", afirmou.
Apontou ainda que a ACT pediu às autoridades irlandesas informações sobre os procedimentos que estava a ser tomados durante a greve, algo que "pura e simplesmente se recusaram a responder".
O sindicato acusa a Ryanair de ter "tentado dar a volta" à greve, salientando que a operadora aérea 'low-cost' [baixo custo] nunca acreditou que a paralisação avançasse devido ao "cansaço dos tripulantes de cabine portugueses" e dos "problemas gravíssimos" que se passam na empresa.
João Costa, tripulante da Ryanair há cerca de seis anos, disse à Lusa que a "tripulação portuguesa" da operadora aérea "é constantemente alvo de 'bullying', de pressões desmesuradas de vendas a bordo, de ameaças de supervisores" ou da "própria companhia".
E acrescentou: "Não nos são reconhecidos os direitos de portugueses, estamos em Portugal, temos sim um contrato irlandês, é verdade, mas estamos em Portugal".
João Costa, o único tripulante de cabine da base da Ryanair em Lisboa a deixar-se ser identificado na conversa com a Lusa, já que a maioria dos colegas - vários com quem a agência de notícias falou - preferiu ficar no anonimato por medo de represálias, acrescentou que, por exemplo, a companhia não reconhece os direitos de paternalidade, nem sequer dá "um salário mínimo condigno".
"Infelizmente e depois das conversações se terem tornado infrutíferas, não tivemos outra hipótese" se não avançar para a greve, acrescentou.
João Costa denunciou que "a coação é a maneira da Ryanair funcionar quando as coisas não lhes correm bem isso" e isso atinge os tripulantes.
Quando os trabalhadores "não estão ao serviço da Ryanair, entre aspas", prosseguiu, a coação é uma "prática comum".
"A Ryanair continua no dia de hoje a coagir", quer através de mudanças de base [que pode passar por ir trabalhar para outro país], quer ações disciplinares ou ameaças de despedimento.
"Em meu nome e em nome dos colegas portugueses e de outras bases não me importo de dar a cara. Queremos que sejam reconhecidos os direitos", disse João Costa.
"Estamos todos no mesmo barco, na mesma luta, não queremos mais empregos precários", sublinhou.
"Não gostamos de fazer greves, foi a primeira vez, é histórico. Pedimos desculpa aos passageiros, mas não há outra forma de o fazer, é a única forma que temos para nos fazer ouvir e lutar" pelos direitos, concluiu.
Na base de Lisboa da Ryanair contam-se cerca de 80 tripulantes, dos quais apenas 30 têm contrato, que servem quatro aviões.
A média de idades dos tripulantes da base de Lisboa ronda os 30 anos.