21 abr, 2020 - 09:38 • Luís Aresta
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"São 12 zeros. As nossas calculadoras dos telemóveis não dão para introduzir esses números. Só calculadoras científicas conseguem lidar com doze zeros". A frase de Mário Centeno, numa entrevista ao jornal "Público", é elucidativa da importância do que vai estar em discussão no Conselho Europeu desta quinta-feira que, face à pandemia Covid-19, será realizado por videoconferência.
O presidente do Eurogrupo - entrevistado nessa qualidade - apesar de reconhecer as divergências entre os estados-membros da União Europeia, diz estar confiante. "O apelo que agora é feito à inovação neste último passo – o da recuperação – não é novo. Não devemos ficar muito ansiosos, portanto, face à capacidade para inovar também aqui. Estou muito confiante e muito seguro de que essa resposta vai aparecer. As forças que têm permitido construir a Europa vão estar presentes nesta discussão e vão levar-nos a um porto seguro", sublinha.
O fundo de recuperação, em complemento com o Quadro Financeiro Plurianual, deverá possibilitar "uma repartição dos custos do período de recuperação ao longo do tempo. Tem de ter mecanismos de financiamento próprios, apropriados e inovadores". Mário Centeno admite que "há várias posições diferentes sobre este problema", mas entende que o compromisso já alcançado, de "prolongar ou distribuir ao longo do tempo o custo financeiro que será muito concentrado no período de recuperação imediato", é garantia de uma "dimensão de solidariedade".
O presidente do Europgrupo admite que a emissão de dívida conjunta seria uma forma de dizer aos mercados que, efetivamente, a União Europeia está toda no mesmo barco. "É com certeza, mas é preciso que se entenda que tem o mesmo valor económico e está no mesmo quadro de análise do Mercado Único, quando dizemos que temos de o proteger enquanto um dos maiores mercados do mundo".
Sobre o montante a destinar ao Fundo de Reconstrução, Mário Centeno é evasivo, mas considera que os 400 mil milhões de euros defendidos pelo presidente francês Emmanuel Macron não são compatíveis "com o valor mencionado pelo vice-presidente da Comissão. Podemos ter um misto de mecanismos de apoio, em parte financiados por empréstimos com alavancagem, em parte financiados por dívida comum", assinala. O que Mário Centeno acentua é que "esse fundo terá de ser proporcional aos danos desta crise. Podemos hoje fazer uma estimativa, mas só conseguiremos ser rigorosos quando começar a haver alguma visibilidade para o início desse processo de reconstrução".
Esta é uma "crise simétrica que inevitavelmente vai levar a que todos os países fiquem com mais dívida no curto prazo e que enfrentem, no segundo trimestre de 2020, uma recessão verdadeiramente avassaladora", diz Mário Centeno, que desvaloriza a alegada reação tardia da União Europeia aos primeiros sinais de que estava a caminho uma crise económica sem paralelo no pós-II Guerra. "Passaram "dez dias entre a primeira reunião do Eurogrupo em que a solução começou a ser desenhada e a sua aprovação final".
Confrontado com a timidez das medidas anunciadas até agora por comparação com a retórica dos responsáveis políticos europeus, Centeno faz notar a importância do SURE (um plano de solidariedade de 100 milhões de euros) "que é dinheiro novo, que vem de garantias que todos os estados prestam à União Europeia para que ela possa obter aqueles montantes financeiros".
O presidente do Eurogrupo sublinha que o mesmo processo se passa com o Banco Europeu de Investimentos (BEI). "Estamos a falar de garantias dadas pelos Estados que depois permitem ao BEI conceder empréstimos até 200 mil milhões de euros. O objetivo de todo este dinheiro é, sublinha, "permitir aos diferentes Estados desenvolver uma linha de ação equivalente para as empresas terem acesso a liquidez". A terceira linha, faz notar Mário Centeno é o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) que vê como "uma rede de proteção, sem condicionalismos, sem troikas, sem programas de ajustamento, para que os Estados possam aceder a financiamento com custos equiparáveis entre todos". Contas feitas, Mário Centeno conclui que "até à data, a resposta orçamental dos Estados-membros soma cerca de 3% do PIB da UE", no equivalente a "mais de 500 mil milhões de euros".
Mário Centeno acentua ainda a importância da ação do Banco Central Europeu (BCE) "que, desta vez, não levou muito tempo a reagir, antes pelo contrário, e cuja magnitude de reação não é muito diferente da de outros bancos centrais. Estamos a falar de 750 mil milhões de euros, com algumas novidades no seu novo programa, que lhe dão maior flexibilidade para atuar nos mercados secundários".