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Crise na aviação civil. A única certeza é a de que recuperação será lenta

03 jul, 2020 - 17:21 • Sandra Afonso

A recuperação depende muito dos clientes voltarem a ganhar confiança, não só no transporte aéreo, mas também nas deslocações fora das respectivas zonas de conforto, da eventualidade de uma segunda vaga do vírus, do "timing" de uma vacina e das restrições decididas por cada país.

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Com a crise pandémica, um "tsunami" varreu as contas das companhias aéreas. As imagens de aviões estacionados em aeroportos vazios correram o mundo, mas o pior está para vir e chama-se incerteza.

A recuperação depende muito dos clientes voltarem a ganhar confiança, não só no transporte aéreo, mas também nas deslocações fora das respectivas zonas de conforto, da eventualidade de uma segunda vaga do vírus, do "timing" de uma vacina e das restrições decididas por cada país.

Falências, insolvências e apoios

Nenhuma companhia aérea ficou indiferente à actual pandemia. A maioria foi obrigada a estacionar cerca de 60% da frota até abril e reduzir a capacidade em mais de 80%.

Várias companhias mundiais consideradas estratégicas já receberam apoios governamentais, como a alemã Lufthansa, a Singapore Airlines e a Air New Zealand Limited.

Outras empresas, menos estratégicas ou com perfis de crédito mais fracos, estão a ter mais dificuldade em aceder a apoios. É o caso da Virgin Atlantic Airways, que ainda bateu à porta do governo, mas o executivo britânico não cedeu. A solução passa agora por um pacote de reestruturação com financiamento 100% privado, parte será injectado directamente por Richard Branson.

Mas nem todas as companhias estão a encontrar uma saída, já existem casos de falências e insolvências, como a LATAM Airlines, a Virgin Australia, a Avianca da Colômbia, a Flybe e a operadora aérea regional dos Estados Unidos da América Trans States Airlines.

Covid-19 obriga governos a injectar 25 mil milhões nas transportadoras europeias

Até ao final de junho, segundo as contas da agência Fitch, as companhias aéreas europeias já receberam mais de 25 mil milhões de euros em apoio direto à liquidez, na sequência da pandemia. Destes, quase 19 mil milhões foram aprovados diretamente pela Comissão Europeia. A Lufthansa e a Air France receberam as maiores injeções de capital.

O governo alemão vai colocar 9 mil milhões no grupo lufthansa e torna-se o maior acionista, com 20% do capital. A Lufthansa, que detém a Austrian Airlines, injetou ainda 150 milhões de euros na companhia austríaca, a somar ao empréstimo de 300 milhões de euros, garantidos a 90% pelo Estado.

A Alemanha aprovou também um empréstimo de 550 milhões, com garantia estatal, à Condor e uma garantia de 1,8 mil milhões de euros à Tui.

Em França o governo vai distribuir 15 mil milhões de euros pela indústria aeronáutica, o que inclui a fabricante de aviões Airbus e a companhia aérea nacional Air France (7 mil milhões no total, 4 mil milhões são um empréstimo garantido a 90%).

A Finlândia acordou recapitalizar a Finnair em 286 milhões de euros e garantir um empréstimo de 600 milhões.

A SAS -- Scandinavian Airlines System, transportadora multinacional da Suécia, Noruega e Dinamarca, conseguiu garantias da Suécia e da Dinamarca para dois empréstimos de 137 milhões de euros. O Governo sueco vai ainda garantir transportadoras aéreas com licença comercial de aviação do país, no valor de 455 milhões de euros.

Segundo a Fitch, há ainda várias iniciativas públicas e de bancos centrais de apoio às companhias aéreas.

• O Banco de Inglaterra está a apoiar a British Airways, a Ryanair, a easyJet e a Wizz Air, através da compra de papel comercial.

• Espanha aprovou 750 milhões de euros em garantias à Iberia e 260 milhões de euros à Vueling, através do Instituto de Credito Oficial, uma espécie de banco do fomento espanhol.

• A Noruega converteu dívida em capital, no caso da Norwegian Air Shuttle, a empresa tem agora acesso a uma garantia estatal de perto de 280 milhões de euros.

• A grega Aegean Airlines tem uma garantia de 150 milhões de um fundo da Grécia de apoio às empresas prejudicadas pela covid-19.

• Na Letónia, a Air Baltic recebeu 250 milhões de euros em capital, aumentando a posição do Estado de 80% para 91%.

Recuperação lenta e incerta

De acordo com a agência Moody's, é "improvável" uma recuperação total da aviação civil antes de 2023, a procura de passageiros aéreos deverá permanecer "severamente deprimida" em 2021.

A agência de notação alerta ainda para a dívida das companhias, muitas melhoraram a liquidez nos últimos anos, mas através do endividamento, que vai agravar-se. Em Portugal, a dívida da TAP ascende a 3,3 mil milhões de euros, segundo avançou o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, numa audição no parlamento.

Se o cenário de partida é mau, ainda vai ficar pior. As companhias aéreas avaliadas terão, em média, dívidas entre 29 a 49 mil milhões de euros, em 2023, ou seja, vão ficar entre 20% a 30% mais endividadas do que em 2019.

No próximo ano, o volume de passageiros deverá cair entre 35% e 55%, segundo a Moody's, uma consequência das restrições operacionais nos voos mas também do aumento do desemprego, que vão diminuir a procura. Em maio, segundo a IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo), o transporte aéreo de passageiros caiu 91%.

“O tráfego internacional permaneceu praticamente parado em maio. Estamos apenas no início de uma recuperação longa e difícil e há uma tremenda incerteza sobre o impacto que um ressurgimento de novos casos de covid-19 em mercados importantes poderia ter”, diz o director geral da IATA, Alexandre de Juniac.

Este não é um sector isolado, uma indústria aérea deprimida até 2021 terá efeitos de longo alcance em setores relacionados e na economia em geral, avisa a agência Moody's. Um corte no volume de passageiros entre 40% a 50% entre 2020 e 2021, levaria diretamente à perda de 579 a 713 mil milhões de euros na economia global, "e várias vezes mais" por via indireta.

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