28 ago, 2020 - 08:00 • Eunice Lourenço , Paula Caeiro Varela
O Presidente da República não quer crises políticas, nem que seja o PSD a viabilizar o Orçamento do Estado para 2021. Deu esse sinal ao avisar, esta quinta-feira, que não alinha em crises políticas. Um aviso deixado na véspera de o primeiro-ministro retomar as negociações com os partidos de esquerda para o Orçamento do Estado de 2021, mas tendo também no horizonte um acordo estável para o resto da legislatura.
Logo a seguir ao aviso do Presidente, o líder do PSD, Rui Rio, colocou-se de fora dessas negociações. Uma posição que também vai ao encontro da vontade de Marcelo Rebelo de Sousa que, nas últimas reuniões que teve com os partidos, em junho, foi fazendo a sua leitura do cenário político.
Ao que foi contado à Renascença por participantes nessas reuniões, o Presidente chegou mesmo a dizer que Rui Rio não pode continuar a ter uma posição colaboracionista com o Governo, como teve em algumas ocasiões e sobretudo no orçamento suplementar. Para Marcelo, se Rio viabilizar o Orçamento do próximo ano pode provocar uma cisão no PSD, onde não falta vontade de fazer uma revolução.
Uma das preocupações constantes do Presidente é a necessidade de haver alternativas para que possa existir alternância política e os populismos e extremismos não cresçam na sociedade e na política portuguesas. Por isso, defende que é preciso uma descolagem do PSD em relação ao Governo, mesmo numa situação de crise como a que o país vive. Ao que a Renascença sabe, Rui Rio também já fez saber a Costa que o cenário de crise política no próximo OE é bem real, caso não consiga um acordo à esquerda.
Em algumas dessas reuniões com os partidos com representação parlamentar, o Presidente também transmitiu a sua convicção de que António Costa cometeu um grande erro ao não fazer um acordo estável à esquerda para a atual legislatura, ao contrário do que tinha acontecido na legislatura anterior em que fez acordos de entendimento com BE, PCP e PEV.
O primeiro-ministro pensou que seria possível governar em geometria variável, mas as negociações para o Orçamento deste ano começaram logo por mostrar como será difícil manter essa situação em toda a legislatura. Depois veio a pandemia, a necessidade de um orçamento suplementar que teve o voto contra do PCP e acabou por ser viabilizado pelo Bloco e pelo PSD.
PCP quer mais reuniões técnicas antes dos encontros políticos
Consciente desses cenários e dessas dificuldades, o primeiro-ministro aproveitou o debate sobre o estado da nação para lançar o repto aos seus parceiros da chamada “geringonça” para um acordo que dê mais estabilidade a esta legislatura.
É com esse objetivo em vista que esta sexta-feira retoma as reuniões com Bloco, PEV e PAN, cada qual em separado. António Costa quer agora um acordo para os três anos que a legislatura ainda tem, mas, de acordo com fonte do executivo, não faz depender o seu Governo da existência desse acordo. Ou seja, o primeiro-ministro vai tentar que as negociações se projetem para esses três anos - até porque, na atual conjuntura, se torna muito mais difícil resolver tudo num orçamento -, mas se não conseguir vai continuar a negociar orçamento a orçamento, medida a medida.
O PCP não participa para já destes encontros, em que não estão previstas imagens nem declarações. Os comunistas pediram um reagendamento de reuniões. E mesmo sem esse adiamento, esta ainda não seria uma fase de novo encontro entre líderes, pois o PCP já tinha pedido que esta primeira ronda de negociações pós-férias fosse ao nível técnico, entre representantes do PCP e o Ministério das Finanças.
Antes das férias, antes e depois do Debate sobre o Estado da Nação, já tinham decorrido várias rondas e conversas de António Costa com Jerónimo de Sousa e Catarina Martins. Tal como também aconteceram antes e depois do orçamento suplementar. E ficou assente que voltariam a reunir depois de férias.
Jerónimo de Sousa, nos comícios que tem feito, tem colocado as condições genéricas do PCP: recuperação de rendimentos e alteração das leis laborais. Condições que também são as do Bloco, mas Catarina Martins, no sábado, colocou uma condição prévia à retoma de negociações: o cumprimento dos acordos feitos para o Orçamento deste ano.
O repto da coordenadora do BE teve resposta no Conselho de Ministros desta quinta-feira que aprovou uma das medidas negociadas com a esquerda: a atualização da idade de acesso às pensões e eliminação o fator de sustentabilidade nos regimes especiais de antecipação da idade de pensão de velhice. Ou seja, o fim do fator de sustentabilidade no cálculo das pensões de velhice em regimes como os dos trabalhadores de pedreiras e de minas e o dos bailarinos profissionais.
Falta, contudo, ainda uma das bandeiras do Bloco: a redução do IVA da eletricidade, que António Costa já voltou a prometer que estará em vigor ainda este ano.