03 nov, 2021 - 14:46 • Pedro Mesquita, com Lusa
O Código do Trabalho vai passar a prever que os empregadores têm o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, salvo situações de força maior, segundo alterações aprovadas hoje à lei laboral.
"O empregador tem o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, ressalvadas as situações de força maior", define a proposta do PS sobre o direito a desligar, aprovada pelos deputados, no âmbito do grupo de trabalho criado para discutir a regulamentação do teletrabalho.
A proposta que foi votada de forma indiciária, tendo ainda de ser confirmada na Comissão do Trabalho e Segurança Social e depois votada em plenário, foi aprovada com os votos a favor dos socialistas, votos contra do PSD e a abstenção do BE e PCP.
"Constitui contraordenação grave a violação" do disposto neste artigo, define ainda a proposta.
Parlamento
Atualmente, o Código do Trabalho prevê o direito a(...)
Foi ainda aprovada, no mesmo artigo, uma norma que estabelece que "constitui ação discriminatória (...) qualquer tratamento desvantajoso, em matéria de condições de trabalho e de evolução profissional, dado a trabalhador pelo facto de exercer o direito estabelecido no número anterior".
Já a votação do número 1 do mesmo artigo relativo ao direito a desligar resultou num empate, faltando ainda saber qual o voto do CDS.
O número 1 prevê que "o trabalhador tem o direito de, fora do seu horário de trabalho, desligar todos os sistemas de comunicação de serviço com o empregador, ou de não atender solicitações de contacto por parte deste, sem prejuízo da consideração de situações de força maior, não podendo daí resultar para o primeiro qualquer desvantagem ou sanção".
A maioria dos deputados considerou que esta norma em concreto já está consagrada na lei.
Por outro lado, os deputados chumbaram uma proposta do BE que pretendia incluir na lei o direito à desconexão, estabelecendo que "o período de descanso deve corresponder a um tempo de desconexão profissional", podendo os contactos do empregador ser considerados assédio.
Também a proposta do BE com vista a incluir na lei expressamente que os trabalhadores em teletrabalho têm direito ao subsídio de refeição foi chumbada pelo PS e PSD.
A proposta dos bloquistas foi aprovada por unanimi(...)
Rita Garcia Pereira, advogado especialista em Direito do Trabalho, explica na Renascença que uma situação de força maior é todo o acontecimento que, sendo imprevisível e urgente, determine que é necessário a prestação do trabalho.
Para se melhor perceber do que estamos a falar, Rita Garcia Pereira apresenta dois exemplos daquilo que pode ser considerada uma situação de força maior e que permitirá ao empregador contactar o funcionário na sua hora de descanso.
Num primeiro exemplo de motivo de força pode ser considerado o caso de um “trabalhador saiu do local de trabalho, deveria ser substituído por outro que falta. É necessário que ele desempenhe a sua atividade. É um motivo imprevisível, sendo a prestação daquelas tarefas indispensável para a persecução da atividade, pode ser pedido ao trabalhador que interrompa o seu descanso”.
Para que não restem dúvidas, Rita Garcia Pereira dá um segundo exemplo daquilo que pode ser considerado uma situação de força maior, em que o patrão pode contactar o trabalhador na sua hora de descanso.
“Houve um problema informático que determinou que não pudessem ser desenvolvidas as atividades durante o período normal de trabalho e têm que ser desenvolvidas atividades naquele dia, impreterivelmente. Pode implicar o contacto. São sempre motivos imprevisíveis e que têm inerente uma noção de urgência”, sublinha a especialista em Direito do Trabalho.
Ou seja, não é considerada uma situação de força maior tudo o que corresponda à organização do trabalho dentro da normalidade ou decorra de atividades que já estavam programadas.
E o que acontece aos empregadores quando fique provado que contactaram o trabalhador nas horas de descanso sem motivo de força maior? Nesse caso - se for provado - considera-se que esse desrespeito constitui uma contraordenação grave, com direito a uma coima que pode variar entre os 100 e os mil euros, sublinha Rita Garcia Pereira. A coima reverte para o Estado e não para o trabalhador.
[notícia atualizada]