17 mar, 2022 - 13:04 • Lusa
A inflação deverá acelerar para 3,9% este ano, em Portugal, mas num cenário adverso, em que existe uma disrupção no fornecimento das matérias-primas por parte da Rússia à Europa, poderia atingir os 5,6%, estima o Conselho das Finanças Públicas (CFP).
No relatório "Perspetivas Económicas e Orçamentais 2022-2026", divulgado hoje, o CFP antecipa "uma aceleração expressiva da taxa de inflação".
No cenário central, a instituição presidida por Nazaré Costa Cabral vê o Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) a acelerar para 3,9% em 2022, seguido de uma desaceleração para 2,2% em 2023, "em linha com a evolução esperada para o preço dos bens energéticos e das matérias-primas".
"De realçar que a hipótese de pressão inflacionista subjacente a este cenário - observada desde 2021 com a recuperação da procura global, as restrições do lado da oferta e o aumento do preço dos bens energéticos - assume-se de cariz temporário", nota o CFP.
No entanto, assinala que o conflito na Ucrânia aumentou a incerteza, pelo que calculou um cenário adverso, que refere que não deve ser interpretado como uma previsão, no qual "a magnitude do choque no preço dos bens energéticos e de outras 'commodities' [matérias-primas] é superior e mais persistente do que no cenário central, fruto de uma eventual disrupção no fornecimento das matérias-primas por parte da Rússia aos parceiros europeus".
"O choque nos preços reflete-se em custos de produção e de transporte mais elevados, perspetivando-se que a inflação em Portugal possa atingir os 5,6% em 2022", estima para o cenário em condições adversas.
Nesse cenário, o IHPC iria reduzir-se para 3,7% em 2023 e para 2,3% em 2024.
O CFP alerta ainda que a persistência de inflação elevada poderá causar pressão adicional para o aumento dos salários na economia.
"O cenário de persistência de inflação elevada poderá causar pressão adicional para o aumento dos salários na economia, que, ao serem refletidos no mecanismo de formação de preços por parte das empresas, poderá criar mais inflação", vinca.
Numa análise global, o CFP dá nota de que, na sequência das pressões inflacionistas, "perspetiva-se uma alteração, ainda que por ora contida, da política monetária do Banco Central Europeu, quer da política convencional (taxas de juro de referência), quer da não convencional (programas de compra de ativos)".
"A aceleração da taxa de inflação, que tem vindo a registar-se ao longo dos últimos meses, mas que poderá ainda intensificar-se caso os preços das matérias-primas se mantenham elevados por um período alargado de tempo, poderá conduzir a uma resposta mais rápida e vigorosa por parte dos principais bancos centrais, de entre os quais se destacam o BCE e a Reserva Federal norte-americana", refere.
Considera, contudo, que "constitui na verdade um risco a subida das taxas de juro".
"Esta, além de plausíveis consequências económicas nefastas, prejudicando a recuperação económica em curso e aumentando o desemprego, poderia vir a ter no médio prazo pesadas consequências financeiras, especialmente para países altamente endividados, como é o caso de Portugal", refere, apontando ainda o risco de um aumento da fragmentação financeira na zona euro.
Para o CFP, "mais grave até do que o aumento dos juros" seria o aumento dos 'spreads', especialmente nos países com dívida elevada, "uma situação a fazer lembrar a crise (de má-memória) das dívidas soberanas", apontando ainda para o risco de "um certo enviesamento nacional no mercado de dívida, penalizando sobretudo, de novo, os países mais endividados" no que toca à política de compra de ativos.
"A recuperação das economias, e da portuguesa em particular, neste pós covid-19, está assim agora, neste quadro bélico, fortemente condicionada", vinca.