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Produtores de leite. “A guerra é mais um prego no caixão”

23 mar, 2022 - 08:10 • Isabel Pacheco

Produtores falam na pior crise de sempre e admitem escassez de leite a curto e médio prazo. A culpa é da escalada dos preços das rações, da energia, do gasóleo e dos fertilizantes.

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Na vacaria de Carlos Neves, em Vila do Conde, são produzidos diariamente 2.400 litros de leite. Dos 140 animais, 75 são produtores. Alimentá-los “nunca saiu tão caro”.

“O silo de oito toneladas de ração custava-me no ano passado 2.400 euros. Agora, em fevereiro, já me custou 3.200 euros e não sei quanto me vai custar amanhã ou no próximo mês.”

O custo com a alimentação representa 60% da despesa da vacaria. Uma conta que não para de subir, também, por “conta da guerra na Ucrânia”, onde era produzido 40% do milho usado na ração animal, explica.

“A guerra é mais um prego no caixão. É mais um ou dois furos num cinto que já estava no osso. Isto já estava no limite”, conta o produtor.

Ao custo da alimentação dos animais, junta-se o aumento do preço do gasóleo e da energia. Carlos Neves dá o exemplo da fatura de 900 euros de eletricidade em 2021 que, em janeiro, subiu para “os 1.500 euros”. “E, agora, vai disparar ainda mais”, antevê. “O gasóleo também já subiu 40 cêntimos por litro”, acrescenta.

Quem também já fez as contas à vida é José Augusto. Com 250 vacas, o produtor de leite de Barcelos viu o custo por animal a disparar nas últimas semanas.

“Neste momento, alimentar uma vaca custa-me seis euros e vinte cêntimos. Há pouco tempo, custava cinco euros. Amanhã, não sei.”

Vacaria em Vila do Conde Foto: DR
Vacaria em Vila do Conde Foto: DR
Carlos Neves - produtor de leite Vila do Conde Foto: DR
Carlos Neves - produtor de leite Vila do Conde Foto: DR
Vacaria em Vila do Conde Foto: DR
Vacaria em Vila do Conde Foto: DR
José Augusto - produtor de leite Barcelos Foto: DR
José Augusto - produtor de leite Barcelos Foto: DR

José Augusto garante que nunca viveu uma situação tão grave .”Já passei por várias crises, mas via sempre uma luz ao fim do túnel. Neste momento, não. Vivemos um momento de incerteza que não sabemos onde vamos parar”, lamenta o produtor que, caso não haja um ajuste dos preços, admite cortar na ração aos animais.

“Não vou deixar os animais à fome, mas passo a dar só o que tenho em casa que é a palha, erva e milho. Obviamente, que os animais não vão produzir o mesmo. A produção de leite cai”, conta o agricultor que antecipa que, se a escalada de preços continuar, há o risco de vir a faltar leite nas prateleiras dos supermercados. “Nós eramos autosuficientes, mas, neste momento, o leite começa a escassear.”

A culpa, explica-nos o produtor, está na dependência da Ucrânia que, para além, de ser o maior produtor de milho e de cereais é, a par com a Rússia, um dos maiores fabricantes de fertilizantes.

“Os adubos, neste momento, começam a escassear. Com esta situação os preços têm duplicado”, conta.

“Tudo o que vinha da Ucrânia deixou de vir. Temos que recorrer a outros países, como os EUA ou a África do Sul. Claro que, agora, quem tem o produto dita o preço”, resume o agricultor que lembra que há, ainda, o custo do transporte. “Aumenta tudo. É um ciclo”, remata.

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