08 jun, 2022 - 16:00 • Ana Carrilho
Depois da pandemia, em que a morte entrou em casa de toda a gente, as pessoas querem sair, passear e ter momentos de felicidade. E a recuperação do turismo já se nota na hotelaria, nas agências de viagens e também na procura de carros para alugar. São algumas das conclusões do painel sobre “A Covid-19 e o impacto na oferta turística”, que teve lugar nesta quarta-feira de manhã no 8.º Fórum de turismo interno "Vê Portugal", a decorrer em Tomar até quinta-feira.
Pela primeira vez, especialmente no mundo Ocidental, o tema da morte (provocada pela pandemia de Covid-19) entrou todos os dias na casa de cada um. Era o único assunto nas televisões ou nas redes sociais. A reflexão é de Alexandre Marto Pereira, vice-presidente da Associação de Hotelaria de Portugal (AHP).
Agora que a pandemia deixou de ser assunto (prioritário), as pessoas querem aproveitar cada dia da melhor forma e sentem que “o turismo lhes pode dar o melhor da vida”. Por isso, sublinha o hoteleiro, CEO do Grupo Fatima Hotels, “a grande oportunidade para o turismo é a vida”. Turismo é passear, degustar, apreciar, bem-estar, natureza, ter momentos felizes”.
E isso já se nota com o crescimento registado nos primeiros meses deste ano, na Europa e especialmente em Portugal, que aparece na liderança da retoma turística, a bater recordes de dormidas e receitas relativamente a 2019, o melhor ano turístico português de sempre. Uma tendência que poderá generalizar-se para todo o ano de 2022.
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Ainda assim, Alexandre Marto Pereira põe algum travão à euforia, alertando que “não podemos ser bipolares, isto é, ou está tudo péssimo ou está tudo ótimo, porque, apesar de tudo, muito poucas coisas mudaram brutalmente”.
O responsável da AHP lembra que há mercados importantes para Portugal, nomeadamente de longa distância e geradores de maior receita, que ainda não regressaram. O brasileiro é um deles.
Mesmo com recuperação, o inquérito recente da AHP revela que 45% dos associados refere que a retoma a níveis de 2019 só será conseguida em 2023 e há mesmo 7% que só a esperam no 1.º semestre de 2024.
Para Pedro Costa Ferreira, presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT), não há muitas alterações na oferta, mas algumas na procura. “E do lado da oferta – as agências – é preciso entender e agir”.
O empresário considera que não há propriamente um “pré-Covid” e um “pós-Covid” mas sim, uma interrupção física entre oferta e procura. “Dissemos que quando acabasse a crise íamos recuperar imediatamente e foi o que aconteceu, recuperámos de um dia para o outro”. Pedro Costa Ferreira dá o exemplo do tráfego aéreo na Europa que retomou plenamente (embora não aconteça o mesmo com outros mercados de longa distância) e refere a previsão de crescimento de 30% do movimento no aeroporto de Lisboa.
Uma experiência ativa, natureza, autenticidade, associação do 'corporate' (negócios/ trabalho) ao lazer, viagens mais pequenas, a maior procura dos nómadas digitais e sustentabilidade, digitalização. É o que Pedro Costa Ferreira identifica com sendo o que o consumidor procura. “Não há muita coisa nova por causa da pandemia; houve foi uma aceleração das tendências”.
Por um lado, há mais jovens a fazer 'city breaks'; mas também há mais seniores a fazer estadas mais longas.A indústria de cruzeiros está a crescer mas por outro lado, há mais gente a procurar sítios com menos gente e mais calmos; há operações 'charter' e 'low cost'. Na prática, frisa o presidente da APAVT, “há oportunidades em todos os segmentos do mercado turístico”.
Uma aceleração de tendências que constitui um desafio para as agências: exige especialização, o que implica mais recursos humanos; acompanhamento do cliente ao longo de toda a jornada e o estabelecimento de parcerias com a hotelaria, autarquias e outras entidades além das inevitáveis apostas na digitalização (“que não é só fazer um site”) e na sustentabilidade.
Pedro Costa Ferreira avisa que “se não conseguirmos ser sustentáveis, com certificações internacionais, teremos spreads mais altos, maior dificuldade em aceder ao crédito bancário e também teremos os consumidores mais zangados connosco”. Ainda assim considera que é mais por pressão da Opinião Pública que se aposta e não tanto pela escolha do consumidor, que é capaz de dizer que é favorável a práticas mais sustentáveis, mas na hora de escolher, opta pelas viagens mais baratas e menos sustentáveis”.
Como é que conseguimos fidelizar os portugueses qu(...)
Na mesma linha, Alexandre Marto Pereira referiu que a procura de turismo sustentável ainda é um nicho, não há uma massificação da procura. E questiona: quantos querem contribuir para sustentabilidade, pagando um pouco mais? “Não há criação de valor automático com a sustentabilidade”, conclui.
Pedro Costa Ferreira lembra que apesar da recuperação que já se vê, com a pandemia as agências de viagens perderam dez anos de resultados. Se 2022 for como 2019, ainda faltam seis anos para recuperar o prejuízo acumulado. E lembrou as promessas de apoio à tesouraria das empresas que o governo inda não cumpriu.
Por outro lado, o presidente da APAVT faz questão de referir que a pandemia também teve um lado positivo para as agências de viagens: por um lado trouxe credibilidade porque conseguiram repatriar todas as pessoas que estavam em viagem, o que quem tinha feito reservas pela internet, não conseguiu. Com isso ganharam também visibilidade e conseguiram novos clientes, precisamente de entre esses que antes faziam as reservas pela net, sem apoio de agências de viagens e que perderam muito dinheiro ou tiveram dificuldade em viajar.
Também para o secretário-geral da ARAC – Associação dos Industriais de Aluguer de Automóveis de Aluguer sem Condutor – a recuperação já começou. “A manter-se, 2022 pode ser um ano record na atividade, com menos oferta, mas uma faturação mais alta”.
A retoma no setor do rent-a-car começou em junho do ano passado, com interrupções suscitadas pelos “abrir e fechar” do Reino Unido (o principal cliente deste setor) conforme os picos de contágio da Covid-19.
Os primeiros quatro meses de 2022 estão a ser fantásticos e não são mais porque não há carros suficientes para tanta procura”, diz Joaquim Robalo de Almeida. E isto porque as construtoras de automóveis não têm semi-condutores para fabricar mais unidades.
Ou seja, este ano o setor tem os mesmos 33 mil veículos de aluguer que tinha o ano passado mas com mais procura. E quer dizer que não será possível fazer uma renovação da frota com maior frequência, como acontecia antes.
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Outra dificuldade com que o setor do rent-a-car se debate é a falta de mão-de-obra, “apesar de ser o sub-setor do turismo que melhor paga a seguir à aviação”.
Por isso, o investimento na digitalização é cada vez mais forte e por exemplo, em vários aeroportos nacionais já estão instalados quiosques em que os interessados podem fazer o aluguer da viatura, pagar, ter acesso à chave do carro e à indicação do lugar onde está estacionado, sem intervenção humana. Também já está a ser desenvolvido um programa de análise de danos à partida e entrega do veículo através de scanner.
Robalo de Almeida diz que a sustentabilidade também é uma aposta do sector: já está a investir muito em veículos elétricos, mas sobretudo em híbridos porque a rede de carregadores no país ainda é insuficiente e irregular. “O rent-a-car vai ser o porta-estandarte da mobilidade elétrica”.