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Conciliar a vida pessoal e profissional no turismo é um “molho de brócolos”

08 jun, 2022 - 22:41 • Ana Carrilho

Restauração precisa de 76 mil trabalhadores, mas não é fácil contratar, afirma a secretária-geral da AHRESP, no 8.º Fórum de Turismo Interno Vê Portugal.

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A escassez de mão-de-obra para o turismo e a pouca atratividade do setor, a necessidade de respostas alternativas e de formação dominaram a discussão no painel sobre “O capital humano nas organizações: impactos e mudanças”, no 8.º Fórum de Turismo Interno Vê Portugal, organizado pelo Turismo do Centro e que decorre em Tomar.

Antes da pandemia, o setor da restauração já precisava de 40 mil profissionais. Agora, esse número quase duplicou, para 76 mil, referiu a secretária-geral da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP).

Um tema complexo que, na opinião de Ana Jacinto, tem de ser analisado à luz de diversas dimensões. Por um lado, a demográfica. “Temos um país envelhecido, em 2028 Portugal poderá ter pouco mais de 8 milhões de habitantes e 300 idosos para cada 100 jovens. E não vemos políticas públicas para inverter esta tendência”. Por outro, a formação e qualificação: 60% das pessoas que trabalham na restauração têm o ensino básico, “o que tem que ser corrigido”.

Um outro problema é a atratividade do setor. Tentando “matar” a polémica dos baixos salários logo à partida, Ana Jacinto frisou que “todas as empresas querem pagar bem e melhor aos seus colaboradores, retendo os talentos. A tecnologia não dá para tudo e esta é uma área que precisa das pessoas. Mas as empresas têm capacidade para o fazer?”, questiona a responsável associativa.

E fez contas: um trabalhador que ganha 1.000 euros brutos leva 770 para casa, mas às empresas custa 1.200 euros. Por isso, Ana Jacinto insiste que “é preciso reduzir a carga fiscal sobre os custos laborais. O Estado tem aqui um papel fundamental, sob pena de continuarmos na mesma”.

Conciliar vida profissional e pessoal é o mais importante para os jovens, mas difícil no setor

No entanto, Ana Jacinto, considera que a questão retributiva não é a mais importante para atrair e reter talentos, especialmente, os mais novos.

Um estudo realizado recentemente pela AHRESP mostra que a conciliação entre a vida pessoal e profissional é o aspeto mais relevante para quem está a iniciar a carreira ou a terminar os cursos de hotelaria e turismo.

“E aqui é que temos um molho de brócolos: o setor é penoso, é duro, trabalhamos 24h00, sábados, domingos, feriados e não podemos ter férias quando a maioria porque temos de estar lá para os atender. Temos de evoluir nesta matéria, sem deixar ninguém de fora. A resposta tem de envolver trabalho conjunto das empresas, sindicatos e Estado. E aquilo que eu vejo, infelizmente, é um retrocesso de dia para dia”.

A secretária-geral da AHRESP exemplificou com a Agenda do Trabalho Digno, aprovada pelo Governo sem o acordo dos parceiros sociais.

“Recuámos. O que foi aprovado não permite às empresas implementar mecanismos de flexibilidade e ajustar os horários e tempos de trabalho. Não estou a dizer que as empresas não têm responsabilidades, mas o Estado eximiu-se da sua (responsabilidade) e em vez de facilitar a vida das empresas numa altura em que já temos tanta falta de recursos humanos, está a dificultar. Há sempre retrocessos e assim, é muito difícil sair desta espiral.”

“Reter talentos, isso sim, já é responsabilidade das empresas”, admite Ana Jacinto, que sugere a introdução de alguns benefícios para além do salário que respondam a necessidades ou interesses dos trabalhadores, que “têm de se sentir bem em casa. E isso depende também da cultura da organização”.

Mas como os trabalhadores nacionais não chegam, é preciso recorrer à imigração. “Mais uma vez, é responsabilidade do Estado”. Foram celebrados diversos acordos de mobilidade, nomeadamente com países da CPLP, Brasil e India e que continuam à espera de regulamentação que permita que esses imigrantes comecem a chegar a Portugal.

“Mas cuidado. Essa imigração tem de ser organizada, integrada, promovendo a sua inclusão na sociedade, com acesso à habitação, escolas para os filhos, etc”, alerta Ana Jacinto.

Escolas de turismo têm cada vez menos alunos portugueses

O que é o futuro das escolas? Foi com esta manifestação de preocupação que a diretora coordenadora da Direção de Formação do Turismo de Portugal iniciou a sua intervenção no painel “O capital humano nas organizações: impactos e mudanças”, no Fórum Vê Portugal.

É que as escolas do Turismo de Portugal também estão, agora, com problemas para conseguir atrair alunos. “Temos tido perda de jovens e só não temos menos alunos nos nossos cursos porque temos compensado com internacionais”.

Cativar os jovens para a área do turismo pode passar por uma transformação no setor da educação, com um ambiente mais centrado no indivíduo, com a criação de percursos escolares individualizados, diversificados, assim como a junção entre níveis de ensino.

Além disso, Ana Paula Pais frisa que a escola tem de mudar os seus ambientes e deixar de existir apenas dentro das suas paredes.

Admitindo que nas micro-empresas isso pode ser mais difícil, a responsável pelas escolas do Turismo de Portugal defende uma colaboração permanente entre as escolas e as empresas. “Há um longo caminho a fazer”.

Mas a formação não pode ser apenas dirigida apenas aos mais novos. 60% das pessoas que já trabalham no setor apenas têm o ensino básico. Podem ter formação em contexto de trabalho e é mais eficaz porque pode estar incluída na relação contratual. “As empresas precisam de ver a formação como uma rotina. Não pode ser só em momentos especiais, todos os dias tem de haver um espacinho para a formação”.

Ana Paula Pais referiu a digitalização como outro desafio. Considera que é muito difícil capacitar um trabalhador fora do contexto experiencial e por isso, o Turismo de Portugal tem estado a mentoring com essas pessoas. Trabalhar com outros setores colaterais ao turismo para que tenham formação adequada e possam dar o seu contributo é outro desafio identificado por esta responsável.

Por outro lado, há um esforço de captação de talentos noutros países. “Há cada vez mais jovens estrangeiros a estudar no nosso país e pode ser feito um trabalho promovendo Portugal como um destino para estudar e depois ter a capacidade de reter esses jovens", referiu a responsável pela coordenação da formação do Turismo de Portugal.

Em resposta a Ana Jacinto, Ana Paula Pais garantiu ainda que o Turismo de Portugal tem capacidade de resposta de formação para os imigrantes e refugiados. “Se resolvermos a questão da entrada no país, temos capacidade para os formar. Ganhamos mais qualidade e diversidade entre os trabalhadores do turismo”.

Comentários
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  • Teresa Oliveira Santos
    09 jun, 2022 porto 10:43
    brocolos ou bróculos?

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