29 jul, 2022 - 08:15 • Maria João Costa
A fábrica Vista Alegre está já a “racionalizar alguns meios de produção”, face à escalada de preços do gás.
Em entrevista à Renascença, o administrador Teodorico Pais assume “preocupação extrema” e destaca que a “gestão tem de ser feita dia-a-dia”.
"As variáveis são efetivamente grandes. Em junho, estávamos a pagar o gás em valores de 90 euros por megawatt/hora e, em julho, já está acima dos 150 a média”, aponta o administrador que faz as contas à fatura a pagar com “um acréscimo de mais de 50 por cento”.
O administrador desta que é uma das mais antigas fábricas de produção da porcelana em Portugal sublinha que face à “velocidade” a que os custos têm aumentado, não há outro caminho, senão racionalizar na produção.
Apesar de “as vendas e as exportações estarem a correr bem”, o administrador da empresa que detém, entre outras, a marca Bordalo Pinheiro, indica que os meios de produção “já não estão a ser potenciados ao máximo”
“Mais vale desligar um forno ou gerir o período de atuação desse forno, em função dos custos diários do gás”, afirma Teodorico Pais. “Estamos a fazer uma gestão, não pela oportunidade e compromissos de venda, mas sim pela racionalização da operação”, reconhece este responsável pela empresa que nasceu em Ílhavo.
Teodorico Pais lamenta que a energia esteja a ser usada "como arma", no atual contexto de guerra. Admite que estão no caminho para as renováveis. A empresa está mesmo “num consórcio do PRR para a descarbonização”, mas as soluções não surgem num estalar de dedos.
Criada em 1894 por José Ferreira Pinto Basto, a Vista Alegre, hoje com seis unidades industriais a operar, está no caminho para alternativas energéticas que passam pelo “hidrogénio, fontes de energia renováveis para produção de eletricidade, e eletrificação de alguns processos tecnológicos indústrias”, contudo, explica Teodorico Pais, o problema é “esta circunstância” de urgência de uma resposta imediata.
Perante a fatura que sobe a cada mês, e que parece não ter perspetiva no sentido contrário o administrador da bicentenária empresa que tem também marcas como a Casa Alegre e a produção de vidro, fala na necessidade de mais apoios do Governo.
Apoios do Governo "são migalhas"
Teodorico Pais considera que são “muito importantes os apoios governamentais para os períodos de instabilidade”. No entanto, este gestor diz que o que está a ser dado é insuficiente.
“O que está a correr, e permita-me a ousadia, é que os apoios que o Governo tem anunciado para indústrias consumidoras de energia são migalhas, e não têm em conta o impacto estrondoso que estão a ter", critica.
O administrador da Vista Alegre lembra que o setor da cerâmica contribui com 1,2% para o PIB nacional e que sozinho, não consegue fazer face ao disparo dos custos.
“Devem olhar com atenção” para o setor, pede Teodorico Pais ao Governo. Quando o questionamos sobre o que diria ao primeiro-ministro António Costa, o administrador da Vista Alegre pede apoios “neste período difícil, para depois virem a ser ressarcidos e não haver postos de trabalho em causa ou horas de laboração”.
Uma cruzada muito difícil de travar sozinhos
"No caso concreto do Grupo Vista Alegre, nas suas seis unidades industriais, se o preço médio se mantiver entre os 100 e os 150, o impacto em euros, é superior aos 20 milhões de euros. É brutal o acréscimo da fatura”, admite Teodorico Pais.
“É muito difícil na estrutura de custos comportar só este fator", explica o administrador da Vista Alegre que receia ter de vir a aumentar custos para o consumidor final, o que no seu entender, “não é desejável”. Em tom de desabafo, o responsável conclui: “sozinhos, esta cruzada é de facto muito difícil, diria quase insustentável".
Governo atento às alterações de conjuntura
Contatada esta manhã pela Renascença, fonte do Ministério da Economia garante que já foram canalizados um total de 11 milhões de euros para o apoio a empresas de utilização intensiva de gás.
No âmbito do programa “Apoiar Gás”, foram recebidas e aprovadas candidaturas de empresas durante os meses de abril, maio e junho. Esta sexta-feira abre justamente uma segunda fase de candidaturas para empresas que dependem do alto consumo de gás para laborar.
São apoios trimestrais. Cada empresa pode receber um total durante o programa no valor máximo de 400 mil euros. As que já se candidataram na primeira fase do programa, e que não atingiram esse valor total, poderão novamente candidatar-se a esta segunda etapa.
Questionado sobre as flutuações que o preço do gás tem sofrido e se esses apoios poderiam refletir essa escalada, fonte do gabinete de António Costa Silva assegura que o Governo está atento às alterações da atual conjuntura económica.