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​Reportagem

Franciscomania. Quatro horas de espera para viver dez segundos de emoção

12 mai, 2017 - 22:47 • João Carlos Malta

Milhares e milhares de pessoas, a perder de vista, juntaram-se para receber o Papa peregrino. Muita espera para ver olhos nos olhos Francisco. E um turbilhão de emoções: alegria, cânticos, rezas e um silêncio partilhado por uma multidão.

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Manuel Almeida esperou quatro horas para ver passar o Papa Francisco. Ele e um grupo de amigos tinha preparado um quadro humano das aparições de Fátima na esperança de que o Santo Padre olhasse para ele. Ali, na Avenida dos Três Pastorinhos, em Fátima, num pequeno jardim, três crianças da terra e quatro ovelhas compunham o cenário.

O grupo de pessoas que se aglomerou junto às baias de ferro em frente do espectáculo acabou por tapar a vista e muitas horas de trabalho acabaram por não cumprir o objectivo principal. O papamóvel passou naquela zona muito rápido e Francisco, sempre sorridente durante todo um percurso, acenou para um lado e para o outro, mas não viu a encenação.

“Fiquei um bocado triste. O Papa passou em três ou quatro segundos e não conseguiu ver o que preparámos. Mas, olhe, não faz mal: as pessoas que por aqui passaram apreciaram muito, tiraram fotos. Por isso, já valeu a pena”, atirou Manuel Almeida, de 68 anos, ainda emocionado com o momento em que viu Francisco.

Fazer o que Francisco faz não é fácil

Às 14h00, quatro horas antes de Francisco passar na rotunda Sul, Cecília Silva, de 82 anos, estava sentada a marcar lugar. Tentou entrar no Santuário, mas não conseguiu – teve de apostar num plano B para ver “o Papa certo no tempo certo”.

A correr, de bicicleta, em cima das árvores. Um tapete de cores acenando a Francisco
A correr, de bicicleta, em cima das árvores. Um tapete de cores acenando a Francisco

Cecília não queria perder o momento de ver um homem que traz uma mensagem que o povo admira: a de olhar para o outro, para o que é diferente, para os excluídos.

“O Papa diz e faz, como já se viu tantas vezes. Nós, cristãos, gostamos da mensagem, tentamos fazer, mas nem sempre é fácil pô-la em prática no dia-a-dia. Não é fácil abrir a porta de casa ao desconhecido. Eu sou desconfiada”, admite a octogenária.

A minha mãe é Maria. A primeira, mesmo

Uns metros ao lado, já à entrada na Avenida dos Três Pastorinhos, com duas meninas pousadas no colo com chupeta na boca, estão Maria e Joaquim avós das pequeninas. Os filhos são donos de um café na rotunda sul de Fátima. Trouxeram cadeirinha para ver o Papa de “camarote”.

Para Maria, o Papa é “espectacular” e por isso merece todos os minutos de espera. “Adoro a alegria e a paz que ele transmite com olhar”, explica.

Mas para ela o momento é muito mais do que isso. São os 100 anos das aparições daquela que considera ser a sua mãe. “A Virgem é a minha primeira mãe, a fonte de amor e da existência. A minha segunda mãe é a que me deu à luz, tem 82 anos”, exclama. “Tenho o amor cheio de amor de Maria. Trabalho numa escola do Seixal e muitas professoras procuram-me para resolver problemas por causa dessa minha forma de ser e estar.”

O Papa podia entregar a taça

Naquela zona fica também a Casa do Benfica de Fátima. E ali os fiéis vestem também a camisola do clube de futebol. A aproximação do jogo de sábado, com o Vitória de Guimarães, que pode dar o tetracampeonato ao clube da Luz, torna o momento ainda mais especial.

“Se o Benfica ganhar é o dois-em-um. Está quase, pode ser que o Papa ainda vá ao estádio entregar a taça”, diz, entre risos e boa disposição, José, de 56 anos. Diz ser “comovente” ver tanta gente com fé junta.

A estrada que sai do Estádio Municipal de Fátima (rebaptizado de Estádio Papa Francisco) encheu-se durante toda a tarde de grupos de velhos, novos, bebés. Os grupos de peregrinos cantaram, dançaram, riram, rezaram – um turbilhão de emoções.

Fórum no café

O tempo começa depressa e a hora em que Francisco aterrou na base de Monte Real aproximava-se. No Petiscos.Come há um grupo de locais que escolhe aquele café para ver pela televisão a chegada do Papa a Portugal.

Os primeiros momentos de Francisco em Portugal
Os primeiros momentos de Francisco em Portugal

De repente, está um fórum criado para comentar todas as incidências do que se vai vendo pelas imagens. “Olhó o gajo, já cá está”, diz um homem com uma mini na mão. Ao lado alguém levanta a voz: “Gajo, não pá. É o Papa”. “É o Papa Chico”, acrescenta uma funcionária do café.

Segundos depois, passa um carro a grande velocidade na estrada e os dez clientes saltam como uma mola para ver o que se passaria. “Queres ver que é uma bomba?” Não era. E logo se inicia uma outra discussão. “A este Papa nunca ninguém vai fazer mal. Se alguém lhe fizesse mal estava tramado”, remata um homem na casa dos 50 anos.

Voltando a olhar para a televisão, vê-se Francisco a ajeitar o solidéu (pequeno chapéu que o Papa traz na cabeça) quando o papamóvel se prepara para arrancar rumo ao Santuário. E há quem não resista a uma piada: “Aperta o capacete.” Risada geral.

Segundos para a eternidade de cada um

Finalmente, uns minutos depois, Francisco passa à frente dos que passaram horas à espera. São poucos segundos. Há muitos que querem prolongá-lo o mais possível. Os mais novos não resistem a correr com os telemóveis e os “tablets” na esperança de eternizar o momento.

Finalmente, o povo começa a desmobilizar-se e a tentar chegar ao recinto para ver o Papa a rezar na Capelinha das Aparições. São quase três quilómetros, uma meia a hora a pé. Mas no sentido contrário já muitos desistem de o tentar fazer.

“Está cheio, sobrelotado. Não deixam entrar mais ninguém. Estou triste, mas vamos ver onde podemos ver. Talvez num ecrã”, diz uma mulher vinda do Norte.

E foram muitos os que ficaram do lado de fora do momento em que Francisco rezou na Capelinha das Aparições. Um momento em que depois de toda a alegria, da exaltação, se ouviu o silêncio cantado por centenas de milhares de pessoas que viam o Papa a rezar a Maria.

O momento em que o Santuário inteiro fez silêncio com o Papa
O momento em que o Santuário inteiro fez silêncio com o Papa
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