14 nov, 2015 - 17:34
A Arábia Saudita poderá estar a fazer “jogo duplo”: apoiar o Ocidente na coligação militar contra o Estado Islâmico e ajudar financeiramente o Estado Islâmico. A acusação parte do ex-ministro da Defesa António Vitorino
“Quem é que é conivente com esta situação? Será que todos os países que fazem parte da coligação contra o Estado Islâmico estão com as mãos totalmente limpas ou fazem algum jogo duplo?”, afirmou no Fora da Caixa especial deste sábado, inteiramente dedicado aos atentados em França e ao regresso do terror ao solo europeu. “Estou a falar de países da região”.
“Houve sinais claros de ligações entre a Al-Qaeda e alguns sectores da Arábia Saudita no 11 de Setembro. Esse momento é um momento crucial porque tinham que se ter separado as águas e não se separaram as águas”, diz o ex-comissário europeu.
“O Ocidente foi conivente, a começar pelos Estados Unidos. Fomos todos coniventes com a manutenção de uma certa ambiguidade no posicionamento de alguns países da Península Arábica, a começar pela Arábia Saudita, em relação à Al-Qaeda. E isso subsiste em relação ao Estado Islâmico.”
Vitorino pede “célula de crise”
O ex-ministro da Defesa socialista alerta para as consequências de uma eventual revisão do acordo de Schengen.
“Schengen é uma questão obviamente muito delicada”, diz. A tendência vai ser “fechar as fronteiras”, prevê. Mas “o preço a pagar por isso é uma quebra na cooperação internacional. Isto é: se eu dependo menos de ti por que é que hei-de dar informação?”
Para Vitorino, “tem que haver uma célula de crise que coordena as informações e que as transmite”.
A lógica de troca de informações entre Estados – “Se tu tens qualquer coisa que me interessa, eu dou-te qualquer coisa que te interessa” – é “fatal”.
“O que eu tenho [de fazer] é dar-te tudo o que tenho para que aquilo que tenho possa ser utilizado por ti para que também reforces a tua própria segurança”, diz. “Isto não pode ser só uma troca ‘dá e leva’. Isto tem que ser muito mais aberto, muito mais entrosado, porque às vezes há uma pequena partícula de informação que para mim é totalmente irrelevante, mas que, enquadrada no puzzle do meu vizinho do lado, faz todo o sentido e até pode clarificar o que se está a preparar.”
Santana: é preciso “iniciativa política” concertada
Pedro Santana Lopes diz que o acordo de Schengen deve ser “reapreciado”. “Nenhum dossiê deve ser visto isoladamente”, diz. “Mas tudo, menos as liberdades fundamentais, está em causa. E Schengen também deve ser reapreciado. E a conclusão pode ser que não vale a pena, nem se deve pôr em causa.”
O ex-primeiro-ministro pede uma “grande conferência para o Médio Oriente” ou outras iniciativas lançadas pelas Nações Unidas, União Europeia ou Estados Unidos. “Se ficamos só na defensiva, se não há iniciativa política, com o dossiê dos refugiados em cima da mesa, que não vai parar porque houve atentados em Paris (eles não vão parar de atravessar os mares por causa do que aconteceu aqui), isto torna-se cada vez mais explosivo”, avisa.
“Não queremos dizer o que dizem ou pensar o que pensam os extremistas, nomeadamente os de direita. Mas que temos que nos defender mais e melhor, isso temos. Isto é a sério, como já sabemos, e faz pensar em muita coisa: no grau das medidas que se tomam; são punidos os que são mais ousados – a França tomou a liderança dos bombardeamentos e sofre na pele as consequências. Isto tem de funcionar, em termos de organização, como funcionava há uma década ou duas – ou seja, acentuar o papel das organizações e menos os raides e acções individuais de Estados, sem concertação.”