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Entrevista

Paulo Furtado já tocou no Bataclan. “No dia em que deixarmos de amar o que amamos porque temos medo, perdemos a nossa humanidade"

17 nov, 2015 - 09:16 • João Carlos Malta

Paulo Furtado - ou The Legendary Tigerman - é um dos músicos portugueses que mais actuam em Paris. Em 2011, subiu ao palco do Bataclan, alvo do terror na sexta-feira. É uma sala mítica que não esquece e aonde quer regressar.

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Diz que podia estar em Paris. Poderia, até, estar no Bataclan - local onde morreram 90 pessoas na última sexta-feira - e que tinha amigos no interior da sala. Paulo Furtado está ligado umbilicalmente ao mítico espaço de concertos parisiense.

“A sala, para mim, é incrível, é uma das mais bonitas em que toquei e com a qual tinha uma relação. É mítica, é um marco na minha carreira”, partilha, em entrevista à Renascença.

Para o homem que dá corpo a The Legendary Tigerman, Paris é a cidade para a qual já pensou muitas vezes mudar e viver. Pensa que, nos primeiros tempos, pode haver uma retracção na “movida” da “cidade luz”, mas não será por muito tempo. “[O medo] não lhes está no sangue”, remata.


O que lhe passou pela cabeça ao ouvir as notícias vindas de França? Como está a digerir toda esta informação?

Para mim, acabou por ser muito perturbador. Ainda por cima, não estava a compreender o que se estava a passar, porque estava num ensaio de uma peça de teatro da qual estou a fazer a música. De repente, no final, recebi uma série de chamadas e SMS a perguntar se estava em Paris. Isto, para mim, ainda tem contornos um pouco mais pessoais, porque uma grande parte da minha editora estava lá. O produtor do meu próximo disco, com quem estive a trocar e-mails, é o Dave Catching, que toca nos Eagles of Death Metal [a banda que actuava no Bataclan aquando do atentado].

Tinha muitos conhecidos no Bataclan na sexta-feira?

Sim, mas não tantos quanto pensava. Os públicos são bastante similares, o ambiente de rock 'n' roll em Paris não é assim tão grande quanto isso, como não é também em Nova Iorque, por exemplo. Tinha bastantes pessoas conhecidas lá, mas, felizmente, nenhuma das mais próximas morreu.

Houve mesmo muita gente a ligar-me, porque seria muito possível eu estar lá. A sala é incrível, é uma das mais bonitas em que toquei e com a qual tinha uma relação. É mítica, é um marco na minha carreira. É também um elo muito importante da minha relação com Paris. Isto magoa-me bastante pela proximidade muito grande que tenho com a cidade. Tudo isto me deixa muito triste.

Em Maio, fez uma digressão em dez localidades francesas. Sentiu um país muito marcado pela iminência do terrorismo no pós-Charlie Hebdo?

Acho que há muito tempo que os parisienses e a França têm a consciência de que são um alvo. Acho que isso nunca os impediu de viver, antes pelo contrário. Ainda estamos em tempo de chorar os mortos, mas houve logo quem começasse a levantar a cabeça e começasse a dizer: “Estamos na cidade do amor, na cidade luz, numa cidade de cultura.”

Já referiu algumas vezes que Paris é a sua segunda cidade. Que reflexos terá esta tragédia no dia-a-dia dos franceses e na “movida” nocturna da cidade?

Não creio que haja menos pessoas a ir a concertos. Temporariamente, poderá haver uma inflexão, mas não acredito que vá mudar algo no modo de viver em Paris. Não creio que isso lhes esteja no sangue. Eventualmente, haverá muito mais vigilância e polícia nas ruas. Isso é algo que, infelizmente, é mais notório em todas as cidades europeias.

Que memórias guarda da passagem pelo Bataclan? Gostava de lá voltar a tocar?

Claro que sim. É fundamental que não nos deixemos abater. Se fosse comigo, não sei o que poderia estar a sentir. Mas, no momento em que deixarmos de amar aquilo que amamos porque temos medo, perdemos bastante da nossa humanidade.

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