19 nov, 2015 - 22:40 • José Pedro Frazão
O embaixador norte-americano em Lisboa recebe a Renascença numa sala da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento. Robert Sherman tinha acabado de proferir um discurso sobre o novo ambiente estratégico, as novas crises e os actores de sempre. Estados Unidos, Rússia, Europa, Portugal, o terrorismo, o Estado Islâmico. A meio do discurso deixou um ponto de interrogação sobre os propósitos internacionais de um eventual governo de esquerda. A primeira pergunta da primeira parte da entrevista não podia ser outra.
Se houver um Governo socialista apoiado pelo Partido Comunista e pelo Bloco de Esquerda, tem garantias sobre o que acontecerá com os compromissos internacionais de Portugal para com a Nato e com a própria relação luso-americana?
Só consigo guiar-me pelo que os partidos disseram. Temos o Partido Socialista e António Costa que reafirmou em larga medida o compromisso do seu partido com a NATO, com a UE e organizações semelhantes. Mas por outro lado, temos os seus parceiros de aliança - o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda - que têm sido ferozmente anti-NATO. Isso levanta a questão sobre se o compromisso de Portugal, como membro fundador da NATO, é firme como sempre foi. E se Portugal vai ainda ser um membro disponível para as coligações internacionais necessárias para erradicar o terrorismo. Por isso é uma questão que se mantém na nossa mente. Penso que estamos a viver em tempos muito perigosos e difíceis. Neste momento, precisamos que esses compromissos sejam firmes.
Os compromissos expressos por António Costa não são suficientes para garantir que essa relação vai continuar?
O ponto vai ser sobre o que vai ser feito, não sobre o que vai ser dito. Com isso, quero dizer que há uma aliança que está ser proposta com os socialistas, comunistas e o Bloco de Esquerda. Dois dos três partidos da aliança são anti-NATO e contra o tipo de compromissos que os Estados Unidos consideram que devem estar implementados. O meu pai tinha uma frase que me dizia quando eu estava a crescer: “Mostra-me quem são os teus amigos, dir-te-ei quem és”. O Partido Socialista fez agora uma aliança amigável com dois partidos anti NATO. Portanto, quero ver como é que isto resulta.
Parece preocupado…
Estou preocupado, com franqueza. Quando se tem os comunistas e o Bloco de Esquerda manifestando-se contra o exercício da NATO “Trident Juncture”, condenando as acções da NATO e dos parceiros, num momento em que acreditamos que a NATO é muito necessária ao mundo… É um factor de preocupação.
Ficou surpreendido com este movimento que pode levar a um Governo socialista, apoiado por estes dois partidos? Imagino o tipo de relatórios que enviou para Washington.
Obviamente que acompanhamos de forma muito cuidada o que acontece. Vemos isto sob prisma dos interesses dos Estados Unidos no mundo, como naturalmente qualquer país numa posição semelhante faria. Seguramente honramos e respeitamos as escolhas democráticas do povo português. Não temos uma posição política sobre o que deve acontecer. Isso compete ao povo português no processo democrático. A nossa posição passa por garantir que os compromissos colectivos que envolvem Portugal e os Estados Unidos se mantêm.
Teve algum contacto com o PS? Há decerto personalidades importantes no PS que conhece.
Nós encontramo-nos e conversamos com membros da actual coligação e com o PS a todo o momento. É uma questão de trabalho corrente. Portanto, diria que os nossos contactos continuam com os socialistas e com a actual coligação.
Noutro plano, em que ponto está a situação da Base das Lajes?
A situação nas Lajes continua como era anteriormente. Há uma proposta no Congresso para investigar a localização de um centro de informações nesse local. É uma proposta que ainda está de pé e que está a ser avaliada no Congresso e no Pentágono. Do ponto de vista da embaixada, somos a favor de uma readaptação da base. Não temos uma visão particular sobre o que ela deve ser. É uma questão que deve ser decidida pelos militares e pelo nosso Congresso. Penso que o que é evidente é que, quando dissemos há muitos meses que as ameaças mundiais estão a deslocar-se para leste e para sul, os militares americanos precisam de ser flexíveis e mais próximos dessas ameaças.
Isso dá mais ou menos poder a uma localização como as Lajes no plano dos interesses militares americanos?
Não faz sentido haver um número grande de efectivos nas Lajes que não estão a ser totalmente utilizados. O modo como a Base está a ser usada actualmente não apoia o argumento de que não devemos ter efectivos como pouco para fazer. É melhor que sejam enviados para locais próximos da acção. Dito isso, se houver um propósito diferente para que a Base seja usada, que seja consistente com os objectivos militares estratégicos dos Estados Unidos, somos a favor disso.
Robert Sherman defende que, para além da solução militar, é preciso uma alternativa política na Síria e no Iraque que possa travar o autodenominado Estado Islâmico.