28 mar, 2016 - 15:46 • Filipe d'Avillez
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Quando o Estado Islâmico ocupou a cidade histórica de Palmira, na Síria, em Maio de 2015, as atenções do mundo concentraram-se no potencial dano para os importantes monumentos arqueológicos, alguns dos mais bem conservados do Império Romano naquela região.
O autodenominado Estado Islâmico, fiel às tácticas já usadas noutras cidades, fez gala em dinamitar grande parte dos monumentos e destruir o museu. Num acto de particular crueldade, os militantes torturaram e decapitaram Khaled al-Asaad, um académico de 82 anos que se recusou a mostrar-lhes onde tinham sido escondidos artefactos valiosos.
Este fim-de-semana, o regime sírio anunciou a retoma de Palmira. O triunfo militar representa muito mais do que uma vitória para a arqueologia e o património mundial.
1 - Golpe estratégico
O domínio de Palmira permitia ao Estado Islâmico manter uma linha de defesa avançada para a cidade de Raqqa. Agora, entre as forças do Governo e a capital dos jihadistas na Síria existe apenas uma grande extensão de deserto, o que permite ao regime dizer que com Palmira conquistou uma plataforma de onde pode lançar um ataque a Raqqa. A cidade de Deir al-Zor, um enclave pró-regime num território ocupado pelo Estado Islâmico, fica também ao alcance das forças do regime.
2 - Propaganda
A tomada de Palmira permite ao Governo sírio, mais uma vez com o apoio de Moscovo, apresentar-se como a única força capaz de eliminar de facto o Estado Islâmico do país. Outros grupos, como os curdos, que contam com o apoio aéreo da coligação internacional liderada pelos EUA, apenas têm conseguido ocupar pequenas aldeias no seu território de influência.
A conquista de Ramadi, no Iraque, é comparável na sua importância, mas o exército iraquiano, que a levou a cabo com o apoio da coligação internacional, tem apenas de defrontar o Estado Islâmico, enquanto o exército sírio luta simultaneamente contra vários grupos rebeldes em muitos pontos do país.
3 - Ganhos de credibilidade
A participação da Rússia na guerra civil da Síria tem sido muito criticada, sobretudo por países ocidentais, que entre outras coisas diziam que os bombardeamentos russos atingiam sobretudo grupos moderados e civis nas cidades ocupadas. Esta vitória em Palmira permite a Moscovo e a Damasco apresentarem provas concretas da sua actividade contra os fundamentalistas do EI.
A conquista de Palmira permite a Bashar al-Assad apresentar-se nas próximas rondas de negociação do processo de paz, que decorre na Suíça, com muito mais credibilidade, por oposição aos grupos da oposição, que não se conseguem entender entre si.
4 - Preservação do património
Apesar da destruição, a preservação de Palmira tem a sua importância. O regime de Assad está a usar isso a seu favor numa guerra que também tem, como tantas guerras, um lado propagandístico.
As notícias que saem de Palmira libertada indicam que a destruição dos monumentos pode não ter sido tão grave como se previa. Assad já jurou que tudo será restaurado, indicando que não é a primeira vez que isso acontece.
“Palmira foi demolida mais do que uma vez ao longo dos séculos e vamos restaurá-la novamente, para que seja novamente um tesouro do património cultural do mundo”, afirmou, segundo a televisão estatal síria.
O trabalho de restauro poderá demorar cinco anos, disse Maamoun Abdulkarim, director-geral de Antiguidades na Síria, à France Press.
Desde o início da guerra na Síria que Assad se tem apresentado como o único capaz de unificar o país e defender não só o seu património histórico e cultural como também as minorias religiosas e étnicas. A reconquista de Palmira permite-lhe reforçar essas credenciais.