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Reportagem

A nova vida dos portugueses em Bruxelas, uma cidade que parece estar "em guerra"

01 abr, 2016 - 16:34 • Vasco Gandra, em Buxelas

Ataques de 22 de Março abalaram a comunidade, mas não mudam rotinas. “Dá-nos a impressão de que estamos num país em guerra”, diz um dos portugueses ouvidos pela Renascença. “A gente está sempre com um pouco de receio", diz outro.

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“Dá-nos a impressão de que estamos num país em guerra. As pessoas andam na rua com mais atenção”, diz Ulisses Miranda. O Tiago’s, o restaurante da família deste emigrante português, fica mesmo em frente à sede da Comissão Europeia, o famoso edifício em forma de estrela.

Estamos no coração do “bairro europeu” de Bruxelas. À semelhança de outras zonas da capital belga, este bairro está vigiado em permanência por polícias e militares armados. Por todo o lado, há veículos do exército. Passam com frequência carros da polícia. Há dezenas de agentes de empresas privadas de segurança a vigiar edifícios.

O bairro designa-se por "europeu" porque ali se encontram, além da sede do executivo comunitário, muitas direcções gerais da Comissão, os edifícios do Conselho e do Parlamento Europeu, dezenas de representações diplomáticas, organizações regionais e várias organizações não-governamentais.

A segurança nas ruas já tinha sido reforçada após os atentados de Paris, mas, a partir de 22 de Março, dia dos atentados terroristas em Bruxelas, tornou-se mais visível.

A 300 metros de Maelbeek

O restaurante Tiago’s fica a cerca de 300 metros da estação de metro Maelbeek, local do segundo atentado do dia 22. Muitas pessoas continuam a deixar por ali flores, velas e mensagens junto às três entradas da estação, que ainda está fechada. Por vezes, uma pessoa ou pequenos grupos param. Os rostos estão fechados, comovidos.

Imediações do metro de Maelbeek são palco de homenagem. Foto: Olivier Hoslet/EPA

Estamos em semana de férias escolares de Páscoa e há menos gente nas ruas. É hora do almoço e o restaurante está vazio. “Num período normal, podemos servir 50 a 60 pessoas em hora e meia, ao almoço”, diz Ulisses Miranda. As férias não explicam tudo. Ulisses deseja poder voltar rapidamente à normalidade. Garante não ter medo, mas reconhece que há muitas pessoas que o sentem.

Medo, claro. Mas há quem diga que não tem

Bruxelas continua sob uma atmosfera de apreensão, tanto mais que prosseguem as operações de busca e de investigação conduzidas pelas autoridades belgas. O eurodeputado do PSD Carlos Coelho resume: “Creio que se sente o medo nas ruas”. “As pessoas vivem com a sensação de que isto se pode repetir todos os dias”.

Com o aeroporto de Bruxelas ainda fechado, os voos operam através de aeroportos regionais, como Charleroi, Ostende ou Liège, ou de países vizinhos, como Luxemburgo, França ou Holanda, o que aumenta as horas de viagem e complica as deslocações de milhares de passageiros, como os eurodeputados.

Não muito longe do Parlamento Europeu, fica um dos bairros mais portugueses de Bruxelas: Flagey. Nestas ruas, convivem culturas e nacionalidades dos vários continentes. Os sinais da presença portuguesa são visíveis: cafés, restaurantes, mercearias, centros recreativos, bandeiras. E, claro, a língua que também se ouve falar.

A loja Nova Primavera vende produtos portugueses. Assim que entramos, o perfume confirma que estamos (quase) em Portugal: enchidos, queijos, bolos, pão, bacalhau, vinhos, azeite, conservas. Mas a loja de João Furtado é também um ponto de encontro e o momento de Bruxelas é tema recorrente.

“É tema de conversa. Há sempre alguém que conhece alguém que sofreu com os atentados”, conta o português. “As pessoas gostam de falar, isto é uma loja pequena e familiar.”

Seguir em frente

A umas escassas centenas de metros, fica o Centro Recreativo Os Belenenses. Lá dentro, a televisão ligada a um canal português estará com o volume próximo do máximo. Entre uma cartada na sala do fundo, um café ao balcão ou um cigarro lá fora, o tema dos atentados não sai das conversas.

“A gente está sempre com um pouco de receio. Isso é verdade”, assume um. “Eu quase não saio de casa. Quando saio, não tenho medo, tenho pânico, que é diferente”, confessa, por sua vez, uma mulher com sotaque brasileiro. “A mim, isto não me afecta. Continuo a fazer a minha vida”, garante um terceiro frequentador d'Os Belenenses.

Apesar do ambiente de apreensão, medo e tensão, os portugueses de Bruxelas parecem determinados em enfrentar a situação e seguir caminho. Querem manter os hábitos de vida. Vasco Batista, 25 anos, trabalha desde Dezembro no serviço de porta-vozes da Comissão Europeia.

Diz que há uma grande tristeza e indignação na cidade, mas defende que também é necessário olhar para o futuro. Vasco está determinado a não mudar de hábitos e, por isso, continua a utilizar o autocarro para ir para o trabalho. “Vou continuar a ir aos sítios onde ia”, garante.

Ulisses Miranda também. “Faço os meus passeios. Continuo como era”, conta. “Temos de continuar”, diz João Furtado. “Temos de seguir em frente”, remata Vasco Batista.

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