07 abr, 2016 - 23:47 • Liliana Monteiro
Condições de acolhimento desumanas, pessoas deixadas à sua sorte sem saber o que vai ser o futuro, autoridades desarticuladas. Foi isto que uma equipa da Amnistia Internacional encontrou nos campos de acolhimento de migrantes gregos de Lesbos e Chios.
Durante uma semana entrevistaram cerca de 90 refugiados e funcionários dos centros de acolhimento e asilo e encontraram um clima de incerteza, medo e desespero.
Conor Fortune, um dos elementos da Amnistia Internacional de Londres, esteve no terreno durante uma semana, estabeleceu contactos com estas pessoas e conversou com a Renascença sobre o que encontrou.
“Tivemos autorização para entrar nos dois campos: em Lesbos, onde estão três mil pessoas, e Chio, que tem 1.500 pessoas. As condições lá dentro são mesmo muito más. Originalmente o campo foi desenhado como centro primário de recepção a refugiados para algumas dezenas de pessoas e agora foi transformado numa autêntica prisão para milhares de pessoas, que têm um acesso muito restrito a ajuda legal. Entre os vários refugiados entrevistados, detectámos casos de pessoas muito vulneráveis, incapacitadas ou com ferimentos de guerra, com pouco acesso a cuidados de saúde nos campos. Mulheres que viajaram sozinhas com os filhos muito pequenos, ou até mesmo gravidas. Família com uma família síria. Tinha quatro crianças, uma delas muito debilitada e não podia mesmo andar. A mãe estava grávida de sete meses e o pai estava numa cadeira de rodas, também sem conseguir caminhar e com infecções graves nos pés. Todos eles dormiam em tendas e no chão”, disse.
Na sua maioria estamos a falar de uma maioria de gente mais nova ou mais velha?
Sim, muitas crianças pequenas, que nunca deveriam ter de enfrentar este cenário dos campos e migrantes lotados, sem acesso a cuidados médicos e sem informação ara quem lá chega. Eles basicamente estão ali no limbo, sentados à espera para perceber o que lhes vai acontecer.
Quando falou com eles o que lhe disseram? Porque fugiram?
Falamos com pessoas da Síria, do Paquistão, Afeganistão, Iraque, de muitos países e com motivações de fuga muito diferentes. Na sua maioria são sírios que fugiram de um cenário de guerra. Viram as casas destruídas, as cidades devastadas. Um dos jovens do campo contou-me que fugiu porque foi agredido pelos taliban. O irmão mais velho era tradutor do Governo dos EUA, e era alvo de várias ameaças de morte e também já tinha fugido. Conseguiu escapar para a Alemanha, onde alcançou com sucesso asilo no país. Além deste havia ainda mais três irmãos mais novos, um com 15 anos, que também conseguiu chegar até à Alemanha. Os outros, com 12 e 13 anos, desapareceram quando a família tentava deixar a Turquia rumo à Grécia, à ilha de Chios. Nunca mais tiveram notícias deles.
Quais são as principais queixas destas pessoas? eles não esperavam encontrar estas dificuldades?
Eles desconheciam que as fronteiras estavam fechadas a partir da Grécia. Não sabiam do mais recente acordo da União Europeia- Turquia e que as coisas tinham mudado. Todos os técnicos e peritos que a união europeia prometeu enviar ainda não chegaram ao terreno. Imagino que ainda vá demorar muito tempo até as coisas começarem a correr de outra forma. Há tanta gente ´presa’ nos campos de migrantes e tantas outras a caminho da Grécia.
Olhando para os vários países europeus. Qual é que eles normalmente escolhem como destino?
Muitos deles procuram países onde já têm família que vive na Europa ou até mesmo já com família lá enraizada e com nacionalidade europeia. Alguns dizem mesmo que querem ficar na Grécia, outros falam na Alemanha.
Para quem trabalha nos campos. Autoridades e ONG. Quais são as maiores dificuldades?
Neste caso há já muito poucos voluntários ou ONG nos campos que são controlados pelas autoridades e miliares.
Há relatos de maus-tratos das autoridades?
Não observámos, nem nos foi relatada violência contra os migrantes por parte das autoridades gregas.
Eles comem e bebem todos os dias?
Comem três refeições por dia. Mas há muita gente a reclamar da qualidade da comida. Especialmente mães com filhos pequenos. As vezes precisam de leite extra para os menores e não lhes é dado esse reforço.
A Amnistia Internacional constatou ainda que o acordo União Europeia – Turquia (que prevê que todos os migrantes "irregulares" que cheguem à Grécia ilegalmente sejam obrigados a regressar à Turquia) não está a correr bem no terreno porque há falta de meios e de linhas orientadoras no terreno.