18 abr, 2016 - 19:38 • José Carlos Silva
Dilma Rousseff não vai desistir de lutar para continuar na Presidência do Brasil, mas deverá ter os dias contados. O seu possível sucessor, o vice-presidente Michel Temer, terá no máximo um mês para mostrar o que vale, defende o analista político Paulo Baía em entrevista à Renascença.
O professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro elogia a “maturidade das manifestações de rua” e considera que a luz verde do Congresso à destituição de Dilma espelha a vontade da maioria dos brasileiros.
Que leitura faz da aprovação do “impeachment” no Congresso dos Deputados?
Quando 70% dos deputados votam pelo 'impeachment' da Presidente Dilma, consagra-se uma situação que já era prevista nas sondagens de opinião que vai ao encontro ao sentimento da maior parte da população brasileira que vinha desaprovando o Governo da Presidente Dilma, que vinha querendo o afastamento da Presidente Dilma, e os deputados votaram de acordo com a vontade da maioria da população.
O resultado é muito expressivo e, no meu entendimento, ele é um marco irreversível em relação à Presidente Dilma. Temos outros passos a serem tomados, mas o que aconteceu ontem [domingo] na Câmara dos Deputados, com a intensidade que foi, com o número de deputados, 70%, de todas as regiões brasileiras, mostra que o Senado terá muita dificuldade em reverter essa situação.
No congresso houve muita paixão durante a hora da votação. Isso poderá passar para as ruas? O que espera nos próximos tempos?
Essa paixão já estava nas ruas, mas há uma desproporção. Há um grupo muito bem organizado, que sabe e tem tradição de fazer manifestações e um grupo novo que ainda está a aprender a fazer manifestações. Os que estão a favor do 'impeachment' são um grupo que não tem tradição de rua, mas que tem conseguido, ao longo de 2015 e início de 2016, colocar muitas pessoas na rua. Do outro lado, os movimentos sociais organizados, o Partido dos Trabalhadores, sob a liderança de Lula da Silva, têm experiência de colocar gente na rua e vai colocar gente na rua, fazendo com que um provável Governo de Michel Temer [o actual vice-presidente] tenha dificuldades na sua gestão, porque não vai conseguir unanimidade.
Agora, não acredito em conflitos de rua. Podem acontecer situações isoladas, mas o que aconteceu ontem com os dois grupos, manifestando-se com intensidade e em grande quantidade de pessoas, mostra a maturidade das manifestações de rua.
Dilma Rousseff vai baixar os braços depois desta votação na Câmara dos Deputados?
A linha da Presidente Dilma e dos seus auxiliares próximos, Jaques Wagner é um deles, ou o advogado geral da União, o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, é na linha de resistência que já vinha sendo feita na Câmara dos Deputados e que continuará sendo feita.
Dilma errou na condução de construir uma maioria no Parlamento. Governo não governa com minoria, governa com maioria. E ela não conseguiu essa maioria na Câmara dos Deputados e não tem essa maioria no Senado Federal. Então, vai ser um acto de resistência e de dificuldade, mas ela não conseguirá barrar porque já tem pelo menos 45 votos no Senado, o que gera aceitação do processo no Senado e, assim que ele for aceite no Senado, ela é afastada por 180 dias.
A imprensa adianta que Dilma poderá recorrer ao Supremo Tribunal por causa de alegadas irregularidades no processo de destituição...
Certamente, ela vai recorrer como recorreu dias antes da votação. Em nome do Governo, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, recorreu para anular todo o processo. O Supremo Tribunal confirmou a decisão de que a Câmara deveria continuar. Eles vão insistir na linha da judicialização do processo, agora também no Senado, para tentar anular o processo. A tendência que se observa no Supremo é manter o rito como está estabelecido.
O vice-presidente Michel Temer já estará a preparar o novo Governo?
Michel Temer já sinalizou como será o seu futuro Governo. Assim que o Senado tomar a decisão de afastamento provisório da Presidente Dilma, ele já entra fazendo as modificações de diminuição do tamanho do Governo, de corte de gastos na máquina do Governo, de intensificar a manutenção dos programas sociais, manutenção da Bolsa-Família e criar um clima que leve os empresários a voltarem a produzir, na medida em que a produção brasileira está paralisada e ele está a conversar com os empresários para que eles retomem o processo produtivo. Ainda não é o de investimento, é um processo produtivo, porque Michel Temer não tem tempo.
Ele não terá o tempo que Dilma teve, 100 dias de lua de mel com o Governo. Ele vai ter que tomar essas medidas, imediatamente, no primeiro mês de Governo, medidas muito de emergência. A partir daí, abrir uma discussão com toda a sociedade, com o Congresso, o que fazer a longo prazo. A crise brasileira não sairá imediatamente da pauta. Vamos ter essa crise percorrendo o ano de 2016, 2017 e 2018. Será uma longa crise. Mas o que Michel Temer espera fazer de saída é reverter o clima de expectativa, criar um clima de esperança imediata junto à população brasileira. Isso é o que os seus principais interlocutores vêm dizendo e ele vem com experiência e tem como fazer uma maioria no Congresso Nacional, coisa que Dilma não teve desde o início do seu mandato. A votação de ontem indica que Temer terá sucesso, pelo menos, no primeiro mês de Governo.