09 jun, 2016 - 23:17 • Eunice Lourenço
Para Joaquim Silva e Sousa a condecoração que vai receber das mãos do Presidente da República é mais uma oportunidade para falar da Misericórdia de Paris, a instituição de que é provedor. Discreto, é como se a ordem de mérito não fosse para ele, mas para os muitos voluntários que trabalham em nome da Misericórdia para ajudar a comunidade portuguesa e muitos portugueses que chegam a Paris (ou a outro locais de França) sem saberem muito bem ao que vêm.
Foi o caso de uma senhora de 62 anos que, recentemente, chegou a França e nunca mais conseguiu falar com a família portuguesa que a tinha incentivado a vir e prometido ajudar. Ou de uma professora de biologia que veio procurar emprego sem falar francês. Todos os dias, Joaquim Silva e Sousa é chamado a desbloquear situações, resolver problemas, ajudar quem precisa.
Diz que esta predisposição para ajudar os outros é de família. Já os pais, em Penafiel, de onde é natural, sempre ajudarem quem precisava. E faz o mesmo, agora em Paris para onde veio há quase trinta anos já com carreira iniciada na banca. Por cá ficou, casou com uma francesa e tem um filho que não fala português, mas gosta de ir de férias a Portugal.
Quanto às necessidades que chegam à Santa Casa, diz que “são muito diversas”. Os portugueses que recorrem à instituição “precisam muitas vezes de um apoio para procurar um emprego, um alojamento, escola para os miúdos …”. A Misericórdia nunca dá dinheiro directamente, arranja alojamento provisório, serve de garantia, ajuda nas burocracias.
As necessidades, diz, têm aumentado na mesma proporção em que também aumentou a emigração. O que Joaquim Silva e Sousa estranha é que, no tempo das viagens baratas e da informação disponível ao toque de um dedo continuem a chegar pessoas que não sabem o que as espera.
A França ainda tem emprego para quem procura, mas sobretudo na área da construção e da restauração, mas já não tem a necessidade de mão-de-obra que tinha há 40 ou 50 anos. “Não é de todo o mesmo cenário dos anos 60 ou 70 em que as pessoas deixavam um patrão num dia e começavam no dia a seguir a trabalhar para outro. Hoje não é assi, é difícil arranjar um emprego. É bastante difícil, em áreas em que as pessoas não têm experiencia é mesmo muito difícil. Há pessoas que vêm mal preparadas, com pouco formação e isso é lamentável”, diz o provedor da Misericórdia de Paris.
A instituição a que preside vive da boa vontade de empresários, que ajudam inclusive nas despesas com um local central para atendimento, e de iniciativas como uma gala anual e uma corrida – correr para a Misericórdia – que este ano será apadrinhada por Pedro Pauleta. Joaquim Silva e Sousa orgulha-se da Misericórdia, mas também da comunidade a que pertence e que, no fundo, considera que é também condecorada este sábado.
Depois de nas cerimónias oficiais de 10 de Junho, na Câmara de Paris, condecorar quatro portugueses que ajudaram no socorro a vítimas do atentado de Novembro, no sábado o Presidenta da República presta homenagem à própria comunidade e a quantos a ajudam.
Além de Joaquim Silva e Sousa, são condecorados mais dois portugueses: o empresário Valdemar Francisco, que promoveu a realização de um documentário sobre os pioneiros da emigração portuguesa; e Manuel Cândido Faria, outro empresário de sucesso com um percurso de empenho e trabalho na divulgação da língua e da cultura portuguesas.
Marcelo Rebelo de Sousa condecora também três franceses. A actual presidente da câmara de Champigny; um dos seus antecessores, Louis Talamoni (condecoração a título póstumo) que de 1956 até 1972 protegeu milhares de famílias portuguesas que se acolhiam nas barracas do bidonville que foi crescendo naquele município à medida que aumentava a emigração portuguesa; e Gérald Bloncourt, que, como o designa a nota da Presidência da República, é o “repórter por excelência da emigração portuguesa para França”.