24 jun, 2016 - 19:32
"Têm sido umas conversas muito interessantes nos últimos meses. O meu sogro, que é um homem de negócios, acha que é uma loucura sair. A minha sogra queria sair. Dentro da família têm existido opiniões diferentes e pontos de vista muitos diferentes.
Em geral, o que têm dito aqui é que a maior parte da geração mais velha queria sair. Têm memórias talvez um pouco 'cor-de-rosa', de um tempo antes da União Europeia, em que as coisas eram melhores e que tem vindo a piorar. Já a geração mais nova queria ficar.
Há uma mistura de preocupação e expectativa. Há bastante preocupação porque não há ninguém que saiba e nos possa dizer o que é que isto vai implicar. Se vai ser apenas uma renegociação com a União Europeia, em que o Reino Unido possa escolher ficar com as partes que gosta da União Europeia e rejeitar as partes que não gosta, ou se vai ser mesmo uma ruptura, sair da União e ser mesmo outra vez uma ilha perto da Europa, mas sem ser perto da Europa. Ninguém sabe.
Eu trabalho numa empresa de corretores de navios. Trabalhamos com mercado de navegação de todo o mundo, com clientes em toda a parte. Como é que isto nos vai afectar? Não sei, ninguém sabe.
Acho que vai afectar muito pouco a curto prazo, mas a médio e longo prazo ninguém sabe. A maior parte dos meus colegas - somos muitos aqui no escritório que não somos ingleses, e entre essa parte estrangeira do escritório a maior parte somos europeus, mas também temos vários colegas chineses, pessoas que vêm de outras partes do mundo - acho que a maior parte dos não-ingleses aqui no escritório acham que isto é tudo um bocado um exagero.
Acho que a maior parte das pessoas que votaram para sair, votaram por desilusão. Quando eu falo com a minha sogra, nunca fico a perceber o que é que ela quer com a saída da UE. Muitas das pessoas que votaram para sair votaram em reacção ao que eles vêem: uma União que não está a funcionar muito bem e que talvez não lhes esteja a servir os seus interesses. Não é tanto por terem um plano e que acham que vão conseguir fazer isto ou aquilo, é mais para dizer: 'Não gostamos disto, não queremos isto, agora vamos ver o que conseguimos arranjar para substituir'.
Os meus clientes são quase totalmente estrangeiros. Os que são europeus, muitos são alemães. A sensação com que eu fiquei é que eles acham que o Reino Unido já tem com a União Europeia um acordo muito favorável, com várias excepções, com regras que não se aplicam aqui e que se aplicam no resto da Europa e o medo deles é que o Reino Unido vá conseguir negociar um acordo com a União Europeia em que ficam com as partes boas e não têm que seguir as partes que não gostam. O medo deles é que vão ter que pagar para isso.
Dentro do meu escritório há muita gente que pensa que isso se calhar não é assim tão mau, se calhar a União Europeia precisa de um choque para alterar e mudar o rumo. E se o resultado disto for que outras nações vão querer renegociar, se calhar isto não é assim tão mau. Se calhar, acabamos por ficar com uma organização que funciona melhor do que a União Europeia funciona agora, menos ambiciosa e mais efectiva.
Isto foi um choque, não estava nada à espera deste resultado. Achei que o voto para ficar ia ganhar e com uma margem relativamente boa. Achei que muita gente chegava à hora do voto e ali, sozinhos, quando chegasse a altura de pôr a cruz no papel, diriam: 'Se calhar, é melhor ficar com o que eu conheço em vez de dar um salto para o desconhecido'. Não foi o caso. As pessoas realmente votaram para dar um salto para o abismo. Não se vê o fundo, não sabemos onde vamos aterrar nem quando.
Não acho que seja necessário estar com exageros porque isto não é uma coisa que vá acontecer de um dia para o outro, nem de um mês para o outro. Vai ser um ano e meio, dois anos de negociações, até sabermos exactamente o que vai ser o resultado.
Nunca senti nenhum movimento para querer pôr fora os estrangeiros que já cá estão, é mais uma sensação de querer limitar ou ter algum controlo sobre quem é que vai entrar no futuro. Os números que estão a entrar são grandes e há muita gente que tem medo disso, mas acho que não há necessidade nenhuma em fazer malas.
Estou a olhar para isto com uma atitude "vamos ter que estar prontos para reagir às coisas" e no meio destas situações há sempre oportunidades também, temos que estar de olhos abertos e ver o que acontece. A minha mulher está mais preocupada, está um bocado aflita. Nós voltámos para Inglaterra há três anos, estivemos durante muito tempo em Hong Kong e agora a nossa vida é cá. Temos casa cá, as casas não são nada baratas e a maior parte do que temos na casa pertence realmente ao banco. O custo de vida cá é caro e o medo é que as coisas, em vez de melhorarem, piorem.
A partir de uma conversa com a jornalista Cristina Nascimento