22 set, 2016 - 13:01 • Pedro Mesquita
O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros Rui Machete diz que é "absurda" a proposta que o primeiro-ministro da Hungria de deportar todos os imigrantes em situação ilegal, concentrando-os a uma área de refugiados supervisionada.
Em declarações à Renascença, Machete lembra que a ideia de Viktor Orban não é original, já que remete para a Alemanha nazi.
Como avalia a possibilidade de deportação de imigrantes, ideia avançada pelo primeiro-ministro da Hungria?
Em primeiro lugar, parece-me uma visão completamente utópica, porque isso não teria as condições mínimas para que as pessoas pudessem viver com dignidade.
A preocupação de Orban será dignidade das pessoas?
Pois não. Por isso, é que a proposta é inaceitável, absurda e irrealizável. Desde logo, os meios financeiros para uma proposta desse tipo seriam volumosos, mas, para além desse aspecto técnico, há um problema de dignidade humana. Não é aceitável. Sabe que houve um tempo, na Alemanha nazi, em que se pensava na hipótese de meter todos os judeus em Moçambique ou numa ilha. Portanto, isso nem sequer é uma ideia original. E é terrível.
Perante ideias que lhe fazem lembrar a Alemanha nazi, como é que a União Europeia deverá agir? Como é possível que a Europa aplique sanções a Estados-membros que não cumprem as metas do défice e, confrontada com este tipo de declarações, nada faça?
Em primeiro lugar, porque os mecanismos que foram pensados, ou que existem, para isso são mecanismos ligados ao funcionamento da própria democracia nos países membros. Parte-se do princípio de que eles cumprem as obrigações que assumiram de respeitar os Direitos do Homem, as liberdades e os princípios democráticos e que a própria opinião pública - e o voto dos cidadãos - exclui a possibilidade de ser governo esse tipo de posições completamente inaceitáveis. Quando isso não funciona, algo está mal, não é?
Quando não funciona e algo está mal, o que pode fazer a União Europeia? Aplicar sanções?
O problema das sanções é complicado, em vários aspectos. Por um lado, as sanções também têm efeitos perversos. Ajudam, por exemplo, a revigorar os nacionalismos cegos. Muitos húngaros, se houver sanções, em vez de questionarem as propostas inadmissíveis do seu primeiro-ministro, vão achar que a Hungria está a ser atacada.
Não seria possível, por exemplo, suspender a Hungria como, de resto, já defendeu o governo do Luxemburgo, recentemente?
Há alguns exemplos de suspensão em matéria de direitos de voto ou nos mecanismos de auxílio dos programas de desenvolvimento. Isso é possível aplicar, mas, para o fazer e para haver garantias, é preciso que essas fórmulas sejam aperfeiçoadas. Isso implica uma cooperação entre os Estados e não é coisa que se consiga fazer "do pé para a mão". Tudo isso também tem efeitos perversos. Bom, mas mesmo assim é possível usar mecanismos económicos e políticos de pressão.