22 nov, 2016 - 19:23 • José Pedro Frazão
Pedro Santana Lopes acredita que os destinos de Donald Trump e
dos partidos populistas na Europa podem estar ligados de forma diametralmente
oposta. "Acho que se Trump for por uma linha muito populista pode ser
causador de derrota dos populistas na Europa. Se Trump for mais
moderado, os populistas na Europa podem ter mais campo", afirma
o antigo primeiro-ministro no
programa Fora da Caixa da Renascença.
“Quero crer que os povos da Europa vão reagir eleitoralmente a estes ventos [populistas]", insiste o comentador social-democrata.
Santana mantém o espírito optimista – "gosto de pensar positivo" – e diz que a eleição de Trump pode ter pelo menos uma vantagem: "Fazer com que a Europa acorde para o que tem de fazer. Olhar para as suas necessidades, para as suas prioridades de uma forma mais efectiva, unir-se, mobilizar-se e tornar-se mais assertiva e eficaz".
O antigo chefe de Governo fala mesmo num "momento único" para a resposta da Europa "com os seus valores e princípios", incluindo nos domínios da NATO e da política de segurança e defesa.
"Europa tem que aumentar despesas com Defesa"
António Vitorino está convencido de que os "interesses de segurança fundamentais da Europa" vão ser sacrificados no relacionamento bilateral entre os Estados Unidos e a Rússia.
"Isso é um factor de enorme de preocupação, não apenas em relação à estabilidade da Aliança Atlântica em geral, mas em relação ao papel fundamental que a NATO tem que desempenhar na nossa segurança colectiva", alerta o antigo ministro da Defesa.
Para Vitorino, os europeus devem estar cientes da perda de importância que o novo Presidente dos EUA atribui à segurança europeia e ao papel da NATO. "Os europeus têm que estar conscientes de que esse vazio tem que ser preenchido por um maior empenhamento da União Europeia e dos Estados europeus em matéria de segurança e defesa. O futuro da NATO não depende apenas de Washington, depende também da vontade e do empenhamento dos países europeus", avisa o antigo comissário europeu na Renascença.
O aumento das despesas com o sector da Defesa é incontornável aos olhos do antigo titular dessa mesma pasta nos governos de António Guterres. Vitorino considera que os líderes europeus têm que assumir "com clareza e transparência" que o desinvestimento em despesas militares não vai continuar a acontecer.
"O grau de investimento, participação e empenhamento dos europeus em questões de segurança e defesa, seja no quadro da NATO ou no específico quadro da União Europeia, vai ter que aumentar significativamente. Não basta aos europeus dizerem que querem continuar fiéis à NATO e que a NATO é muito importante para a sua segurança. É preciso demonstrarem que estão preparados para assumir uma quota-parte de responsabilidade acrescida na sustentabilidade da NATO e no desenvolvimento da estratégia de segurança e Defesa da União Europeia. Isso custa dinheiro", afirma António Vitorino.
As grandes batalhas contra o populismo
Descrito como um populista por uma comunidade alargada de analistas e comentadores, Donald Trump pode não ser bem o que aparenta. É a tese de Pedro Santana Lopes que, embora admitindo filiações do Presidente eleito no campo populista, tem reservas sobre o que pode ser a Administração Trump.
"Ele ainda não sabe bem onde vai aterrar. Posso estar enganado, mas estou convencido que ele ainda não tem o seu retrato político-ideológico completamente definido. Por isso, talvez seja conveniente não o entrincheirarmos, não o remetermos para aliado desses sectores mais extremistas da Europa. Mas tenho que admitir que isso possa vir a acontecer", afirma Santana Lopes.
O périplo de Obama pela Europa em fim de mandato teve também um propósito ligado à eleição de Donald Trump.
António Vitorino considera que o Presidente dos Estados Unidos tenta limitar vários estragos. "Não só os estragos que antevê que possam ser provocados pela eleição de Trump, mas também os estragos que a eleição de Trump significa para o seu próprio legado como Presidente dos Estados Unidos, ao ser sucedido por uma personalidade com as características, o perfil e o programa de Donald Trump", argumenta Vitorino.
O antigo comissário europeu considera que os partidos centrais das democracias europeias devem ajustar o discurso. "O que se exige é o combate às ideias, não às pessoas. Para isso é preciso que os partidos do ‘mainstream’, que entendem que a sociedade deve continuar a ser aberta, tolerante, culturalmente diversa, também falem para as pessoas que estão mais vulneráveis ao discurso dos populistas", remata António Vitorino.