24 nov, 2017 - 07:52 • Filipe d'Avillez
Já não ouvimos falar deles todos os dias, mas nem por isso o problema dos migrantes nos Balcãs desapareceu. Todas as semanas perto de 100 pessoas entram na Sérvia com o objectivo de alcançar a União Europeia (UE). As ameaças continuam a existir, incluindo traficantes, a perigosa travessia do Mar Negro ou simplesmente o castigador clima de Inverno naquela parte da Europa.
Uma das organizações que está no terreno a ajudar estes migrantes, oriundos sobretudo da Síria, do Afeganistão, Iraque e Paquistão, entre outros países, é os Médicos Sem Fronteiras (MSF). Natural das Filipinas, Jan Krisna Rodriguez é coordenadora médica dos MSF na Sérvia e fala da gravidade da situação.
“O problema não passou, de todo, simplesmente as pessoas já não estão a prestar tanta atenção. Acontece que agora que as fronteiras estão fechadas as pessoas são empurradas para alternativas mais perigosas. Da Sérvia continuamos a ver passagens para a Croácia e para a Hungria, através de florestas, por exemplo, e há uns meses vimos a abertura de uma nova rota através da Roménia e também do Mar Negro, que é mais perigoso que o Mediterrâneo”, explica Rodriguez.
A somar a estes perigos, existe também o factor do Inverno, apesar de a Sérvia se ter esforçado para acautelar o pior cenário. “A Sérvia tem abrigos invernais para seis mil refugiados, mas sabemos com base no ano passado que o número pode ser superior a isso. A comida nos campos é suficiente, mas há muitos problemas com outras necessidades básicas”, explica a coordenadora médica dos Médicos Sem Fronteiras.
Calcula-se que, apesar de haver 18 campos, muitas pessoas ficarão ao relento durante estes meses. “Actualmente há cerca de mil pessoas a viver nas zonas de fronteira e nos centros da cidade, que dependem sobretudo da ajuda da sociedade civil e de outras organizações não governamentais. Mas correm riscos de hipotermia, infecções cutâneas devido à falta de higiene e infecções respiratórias.”
“Normalmente estas pessoas tentam ocupar pequenos espaços, sobrelotados. Fazem fogueiras para se aquecerem, o que piora as condições respiratórias. Estes problemas devem voltar a aparecer este Inverno”, explica.
Fechar fronteiras só cria mais perigos
Jan Krisna Rodriguez considera que a Sérvia, que não pertence à União Europeia, tem feito o melhor que pode para lidar com os refugiados que passam pelo país. A esmagadora maioria não quer ficar, mas sim chegar a países da UE, sobretudo à Alemanha.
A Hungria, que é dos países que mais tem resistido à entrada de refugiados e migrantes, defende-se dizendo que como ponto de chegada à UE, seria obrigada a receber de volta os refugiados que mais tarde sejam deportados dos países a que queriam chegar. Budapeste diz ainda que as normas internacionais ditam que os refugiados devem ser acolhidos no primeiro país seguro por onde passam. Mas, para Rodriguez, não obstante a boa-vontade demonstrada, a Sérvia não reúne condições para acolher todos os migrantes e por isso não encaixa nesta definição.
Para a médica, políticas à parte, uma coisa é clara. “Enquanto os governos continuarem a bloquear as entradas, as pessoas continuarão a procurar alternativas, mais perigosas, para tentar entrar”. O resultado é um aumento de traficantes, novas rotas com maiores riscos e “muita violência junto das fronteiras”, diz.
“Globalmente, a União Europeia poderia fazer mais. A narrativa neste momento é dos refugiados como pessoas que vêm roubar recursos e empregos. Mas a verdade é que em números brutos não são assim tantos. A maioria dos refugiados estão nos países mais pobres do mundo, no Paquistão, no Sudão… E eles conseguem tratar deles.”
“Estas pessoas estão a fugir à guerra, à perseguição, crises, e recusar a entrada, fechar as fronteiras apenas as coloca em situações mais perigosas e em condições de maior desespero”, conclui a médica.