Siga-nos no Whatsapp
A+ / A-

Mundial da Rússia. A política vai jogar. A tática será o boicote?

26 mar, 2018 - 19:26 • João Carlos Malta

O Mundial de Futebol está à porta e não deverá ser jogado apenas dentro de campo. A tensão política cresce e já há notícias de que, em surdina, a FIFA teme boicote de alguns países. Uma especialista em relações entre a Rússia e a União Europeia, um ex-embaixador e um homem que conhece bem os meandros da FIFA ajudam a perceber se o temor é real.

A+ / A-

A expulsão de diplomatas russos de 14 países da União Europeia (UE) e dos Estados Unidos fez, de novo, subir a temperatura nas relações entre os dois blocos e o temor de que o Campeonato do Mundo de Futebol da Rússia, de junho, venha a ser perturbado pelo conflito diplomático. Um caso como o dos Jogos Olímpicos de 1980, em Moscovo, é reeditável?

Sandra Dias Fernandes, professora assistente no departamento de Relações Internacionais e Administração Pública da Universidade do Minho e especialista nas relações entre a Rússia e a União Europeia, deixa fora de jogo a possibilidade de suspensão do Mundial, mas avalia a decisão de boicote de um conjunto de países como uma possibilidade bem real.

“O impacto ainda é uma questão em aberto. Não estamos a falar de uma relação direta entre a expulsão de diplomatas e a suspensão do mundial: não é um cenário realista. O mais provável é o boicote: ou seja, países cujas seleções iam participar na fase final na Rússia não participarem”, identifica a especialista.

A mesma professora enquadra este fenómeno num cenário em que um conjunto alargado de estados europeus consideram que a Rússia é responsável pela utilização do agente químico que matou o ex-espião russo Sergei Skripal, no sul de Inglaterra. Isso é muito significativo do ponto de vista diplomático pelo que transferir a tensão para o Mundial “é uma questão pertinente e que tem algum realismo”.

O poder do dinheiro

O ex-embaixador Francisco Seixas da Costa concorda que se está a formar um movimento internacional muito forte contra a Rússia, e que isso tem um peso grande. Mas na hora da verdade crê que o futebol e toda a dimensão financeira que o envolve se vai sobrepor.

“Penso que a força e o peso do futebol num quadro global até de natureza economicamente e financeira, além do desagravo não me parece que vá haver um boicote efetivo relativamente ao futebol”, concretiza.

Seixas da Costa dá o exemplo da intervenção do ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, Boris Johnson, que ao reagir ao boicote dos políticos e família real britânica ao evento na Rússia rejeitou que este seja alargado ao futebol e que a equipa de Inglaterra cancele a participação.

“Acho que seria errado castigar os adeptos ou a equipa, seria uma pena”, sublinhou o ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido. A polémica está, no entanto, instalada.

Isto já depois ter comparado este campeonato aos Jogos Olímpicos de 1936.

“Putin vai usar o Mundial do mesmo modo que Hitler usou os Jogos Olímpicos de 1936. Sinceramente penso que a Inglaterra não devia participar. Não devíamos apoiar o facto de Putin fazer do Mundial um exercício de relações públicas para esconder os atentados aos direitos humanos pelos quais é responsável", referiu Ian Austin, para o ministro concordar depois com a comparação. "A caraterização que fez do que sucederá em Moscovo no Mundial... Sim, penso que a comparação com 1936 é acertada", disse.

O que acontece a quem boicota?

Nos últimos dias houve notícias de que a FIFA temia o boicote de países à competição, à medida que aumentou a tensão diplomática contra a Rússia. Gilberto Madaíl, ex-presidente da Federação Portuguesa de Futebol e profundo conhecedor dos meandros da FIFA, esclarece como é que aquele organismo reage perante uma situação deste género.

“A FIFA é, em principio, apolítica, e se for uma ou duas [seleções] podem-se substituir. Se forem mais é que é mais grave e mais difícil de resolver. Aí já não dependerá da FIFA, mas de cada seleção e que está ligada à evolução política. O desporto não deve ser algo em que a posição política do país se deva refletir. Espero que não venha a acontecer”, concretiza o ex-homem forte do futebol português.

Segundo as regras da FIFA, no artigo 6, um país que boicote uma competição como o Mundial pode vir a ser penalizado com a proibição de presença em 2022 na competição que se joga no Quatar, acrescido ainda de uma multa pecuniária.

A especialista Sandra Dias Fernandes diz que um boicote deste tipo encontra paralelo nos Jogos Olímpicos de Verão, em Moscovo. Nessa altura, 60 estados não se deslocaram à Rússia como manifestação de discordância da invasão do Afeganistão pela URSS. O boicote foi liderado pelos Estados Unidos.

Ainda assim houve quem, apesar do boicote, permitisse que as suas delegações disputassem os Jogos, mas sem usar a bandeira nacional. O Afeganistão acabou por participar no certame.

Não será só futebol

A professora da Universidade do Minho crê que “o desporto é um símbolo muito forte na relação entre as nações, uma equipa não se deslocar para o Mundial tinha um impacto muito forte”.

Apesar de toda a incerteza, há algo que parece certo: o Mundial não se jogará apenas dentro das quatro linhas. Sandra Dias Fernandes, especialista da Universidade do Minho, antevê que a política estará sempre em jogo.

“Foi pedido a Rússia que apresentasse explicações, senão o fizer há claramente um ambiente de tensão muito forte à volta do Mundial. A possibilidade de viver como um evento desportivo de relaxamento poderá ser parasitado por este ambiente entre os estados”, conclui.

Adesão em massa ao Reino Unido faz mais de 100 diplomatas russos expulsos
Adesão em massa ao Reino Unido faz mais de 100 diplomatas russos expulsos
Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

  • Conhecê-los,amá-los
    27 mar, 2018 Lisboa 07:37
    Pelos vistos os Ingleses querem sair da Europa mas antes ainda dar mais cabo dela.

Destaques V+