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Itália já tem primeiro-ministro. Um devoto do padre Pio com um currículo "insuflado"

23 mai, 2018 - 18:25 • Ricardo Vieira

Quem é Giuseppe Conte? A partir desta quarta-feira é o chefe do 63.º Governo que Itália teve em 67 anos.

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Desconhecido da maioria dos italianos, com zero experiência política, homem do Direito com o coração ideológico a bater à esquerda, Giuseppe Conte é o novo primeiro-ministro de Itália.

A sua nomeação foi confirmada esta quarta-feira pelo Presidente do país, Sergio Matarella, depois de quase três meses de consultas para pôr fim ao impasse político instalado no rescaldo das eleições de 4 de março - nenhum partido conquistou um número mínimo de votos para governar sozinho.

Conte ficará ao leme de um governo de coligação formado pelos populistas anti-sistema do MoVimento 5 Estrelas (M5S) e pela Liga Norte, de extrema-direita. É uma espécie de geringonça populista e anti-austeridade, num país que, em 67 anos, teve 63 governos a contar com este que agora se prepara para tomar posse.

“Estudioso, reservado e muito devoto do padre Pio”

O novo chefe do Executivo nasceu a 8 de agosto de 1964, na pequena aldeia de Volturara Appula, a região da Apúlia, no sul de Itália. O pai era um funcionário autárquico e a mãe professora primária. É divorciado e tem um filho de dez anos.

É “estudioso, reservado e muito religioso, devoto do padre Pio”, garante à Rai 1 Antonio Palcentino, seu amigo dos tempos da escola. Em menino gostava de jogar futebol; era o médio criativo, o maestro da equipa ou "regista", como dizem os italianos.

Depois de se licenciar, em 1988, continuou os seus estudos em universidades de todo o mundo. Pelo menos é o que diz no seu currículo oficial. Essa foi a primeira polémica em que se viu envolvido, ainda antes de Matarella o 'entronizar' - mas já lá vamos.

Até agora, era professor de Direito Civil na Universidade de Florença e na Universidade Luiss, em Roma, cidade onde vive. Também exerceu advocacia. Foi o representante legal do atual líder do M5S, Luigi di Maio, aquele que o queria à força no governo, embora inicialmente não no cargo de primeiro-ministro.

Sem experiência política

Apontado durante a campanha pelo M5S como potencial ministro da Administração Pública, Guiseppe Conte acabou por ser o nome de consenso para chefiar o Governo de uma das maiores economias da União Europeia.

O catedrático não tem qualquer experiência política. Apesar disso, é encaixado no perfil de “tecnocrata” que tanto o MoVimento como a Liga criticam muitas vezes. Não é militante de nenhum partido, mas diz-se próximo do partido de Di Maio, que nasceu em 2009 pela mão do cáustico comediante Beppe Grillo.

A inexperiência de Conte terá levantado algumas reservas ao Presidente italiano, que, ainda assim, acabou por dar luz verde à nomeação e viabilizar o Governo de coligação.

“O meu coração sempre bateu à esquerda”

Do pouco que se conhece sobre o seu pensamento político, o novo primeiro-ministro italiano é um duro crítico da burocracia e do peso legislativo, tendo já chegado a defender publicamente que Itália está cheia de leis "inúteis". É por isso que, enquanto chefe do Governo, promete ser o motor de uma "simplificação rigorosa e implacável" das leis italianas.

Não sendo militante de nenhum partido, diz-se próximo do MoVimento 5 Estrelas. “O meu coração sempre bateu à esquerda”, disse num debate televisivo antes das eleições.

Numa outra altura já tinha afirmado: “No passado votei na esquerda. Hoje, acho que os parâmetros ideológicos do século XX deixaram de ser adequados”. A improvável coligação entre dois movimentos populistas, um deles no extremo da direita, é espelho disso mesmo.

No perfil da rede de mensagens WhatsApp tem uma citação do antigo Presidente norte-americano J.F. Kennedy: "Todo o sucesso começa com força de vontade."

Currículo "insuflado"?

Além de dar aulas, Giuseppe Conte foi membro do conselho de diretores da Agência Espacial Italiana, consultor da Câmara do Comércio de Roma e, em 2013, nomeado pelo Parlamento para integrar o Conselho de Administração da Justiça Administrativa. Também se declara autor de dezenas de publicações na área do Direito.

Contudo, o currículo do novo primeiro-ministro já está sob suspeita por causa de alegadas passagens por prestigiadas universidades estrangeiras.

Num documento enviado ao parlamento de Roma, garante ter “aperfeiçoado os seus estudos judiciários” nas universidades de Cambridge, de Nova Iorque (NYU) e na Sorbonne, em Paris, entre outras.

Ao “The New York Times”, um responsável da NYU garantiu esta semana que não há qualquer registo de algum dia alguém de nome Guiseppe Conte ter passado pela escola, nem como estudante nem como professor. A mesma fonte ressalva, contudo, que ele pode ter frequentado programas curtos de um ou dois dias, dos quais não existem registos.

O currículo oficial refere que Conte estudou na NYU entre 2008 e 2012 “durante períodos nunca inferiores a um mês”.

O novo primeiro-ministro não comenta, mas o M5S emitiu um comunicado a explicar que Conte nunca disse que tinha tirado uma licenciatura ou mestrado em universidades estrangeiras.

“Conte, como muitos investigadores, foi estudar para o estrangeiro para aprofundar o seu conhecimento, para aperfeiçoar o seu inglês. A imprensa italiana e internacional está em polvorosa com alegadas qualificações que Conte nunca disse ter”, referiu o partido em comunicado.

A Universidade de Cambridge, em Inglaterra, não comenta o caso. Conte alega ter estudado lá em setembro de 2001, um mês em que a escola costuma estar encerrada para as férias de verão.

Uma fonte da universidade disse à agência Reuters que não foi encontrado qualquer vestígio da passagem de Conte por Cambridge, mas admite que este poderá ter frequentado um curso organizado por uma entidade externa.

A Universidade da Sorbonne já está a verificar os seus registos para confirmar se o novo chefe do Governo italiano estudou ou não na prestigiada instituição parisiense.

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