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O que são as “midterms”? As eleições intercalares explicadas em quatro pontos

06 nov, 2018 - 06:40

Os norte-americanos vão às urnas esta terça-feira para elegerem milhares de representantes locais e estatais. As corridas mais importantes são para as duas câmaras do Congresso. De uma forma ou de outra, é também a presidência de Donald Trump que está em jogo.

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Houve uma coisa que os eleitores e legisladores dos Estados Unidos não perderam de vista nas últimas semanas por entre ataques de ódio, polémicas e debates políticos: as eleições intercalares.

Esta terça-feira os norte-americanos são chamados às urnas para elegerem uma série de representantes locais e estatais e, acima de tudo, para definirem a composição do Congresso para os próximos dois anos, até às presidenciais de 2020.

Numa altura de intensos debates sobre imigração e sobre o futuro de Donald Trump, a Renascença explica-lhe em que consistem estas eleições e o que está em causa este ano.

Eleições quê?

As intercalares são conhecidas do outro lado do Atlântico como “midterms”, tradução livre para “eleições do meio”. Têm lugar precisamente a meio do mandato de quatro anos do Presidente – neste caso, do primeiro mandato de Donald Trump, que foi eleito em novembro de 2016.

Podemos considerá-las como uma espécie de fusão entre as nossas eleições autárquicas e legislativas, nas quais os americanos elegem uma multidão de representantes políticos. Entre senadores, congressistas, governadores, juízes, procuradores, presidentes de câmara e até mesmo xerifes, vai (quase) tudo a votos.

Os dois órgãos mais importantes em disputa nas urnas são o Senado e a Câmara dos Representantes, as duas câmaras do Congresso, que é o principal órgão legislativo do país.

Mais do que noutros anos de intercalares, estas eleições são tidas como um importante termómetro da presidência Trump, com os resultados a refletirem o agrado ou, por outro, a insatisfação do eleitorado face aos dois primeiros anos do seu mandato presidencial.

Da mesma forma, o plebiscito desta terça-feira ganha importância redobrada pelo potencial de definir os próximos dois anos da presidência Trump e, no limite, decidir a sua continuidade (ou não) na Casa Branca a partir de 2020. Isto porque há assentos a votos no Congresso em número suficiente para alterar o equilíbrio de poderes no país; neste momento o Partido Republicano pelo qual Trump foi eleito controla as duas câmaras legislativas mas muitas sondagens prevêem uma vitória dos democratas na Câmara dos Representantes - uma que, a confirmar-se, roubará alguma margem de manobra à presidência.

A campanha nos EUA tem sido extremamente renhida: se do lado dos democratas os candidatos têm tentado capitalizar o descontentamento contra Donald Trump para atrair votos, o Presidente e o seu partido têm puxado pelos medos e receios dos eleitores mais conservadores, nomeadamente no que toca a questões de imigração.


Quem vai a votos?

Câmara dos Representantes

Do inglês “House of Representatives”, a Câmara dos Representantes é a câmara baixa do Congresso e é nela que mais atenções estão focadas nestas eleições. Há 435 assentos na Câmara, ou seja, um congressista por cada distrito eleitoral (sendo que cada Estado tem um determinado número de distritos eleitorais, que varia distrito a distrito) e, esta terça-feira, todos esses assentos vão a votos.

No jogo das probabilidades, os analistas antevêem uma reviravolta nesta Câmara, atualmente sob controlo dos republicanos com 235 congressistas. Para reverter isto, o Partido Democrata precisa de conquistar um mínimo de 218 assentos, ou seja, manter os 200 que controla atualmente e roubar pelo menos mais 18 aos conservadores.

Segundo o FiveThirtyEight, um dos mais populares sites de análise estatística dos EUA, há cerca de 88% de probabilidades de os democratas passarem a controlar a Câmara esta semana.


Senado

O Senado é a câmara alta do Congresso, que é composta por 100 elementos, ou seja, dois senadores por cada um dos 50 estados do país. Este ano, 35 desses 100 assentos estão em disputa nas urnas.

Sendo o Senado a câmara alta, as propostas que passam pela Câmara dos Representantes são aprovadas ou vetadas aqui. É também aos senadores que competem decisões de extrema importância para o país, como a aprovação de juízes nomeados para o Supremo Tribunal e de elementos do Governo federal que o Presidente escolhe para a sua equipa.

Neste momento, os republicanos têm uma vantagem de dois assentos face aos democratas (51-49), com o FiveThirtyEight a antever uma vantagem ainda maior para o partido a partir desta terça-feira (52-48). Do outro lado, os democratas terão de defender 26 lugares dos 35 que vão a votos, pelo que estas “midterms” são uma boa oportunidade para os conservadores cimentarem o seu poder na câmara alta.

Neste cenário, há corridas muito renhidas a decorrer em estados tradicionalmente republicanos que têm merecido alguma atenção. Destaque-se o caso do Texas, tido como um porto seguro dos conservadores, onde Ted Cruz terá de se bater pelo seu lugar no Senado contra Beto O'Rourke.

Apesar da onda "azul" que conseguiu alimentar no estado, inédita em décadas, e apesar das doações e incentivos que angariou em níveis históricos, tudo indica que, mesmo assim, o democrata O'Rourke vai ter dificuldades em roubar a cadeira a Cruz. Uma potencial vitória suada e por unha negra de O'Rourke poderá ajudar a galvanizar os democratas para as próximas presidenciais.

Os estados do Nevada, Dakota do Norte e Indiana são outras batalhas críticas para os dois partidos.


O que está em jogo?

De entre as milhares de corridas para os mais variados cargos em disputa nestas intercalares, as que mais interesse atraem são as que vão definir a composição do Congresso até às próximas presidenciais.

E se as “midterms” são sempre essenciais para determinar o rumo de qualquer Presidente, estas em particular podem, hipoteticamente, marcar o início do fim da presidência Trump. Marcada por inúmeros escândalos e suspeitas de que a Rússia terá ajudado Trump a vencer em 2016, os democratas têm ansiado por uma janela de oportunidade para abrirem processos contra o Presidente que, em última instância, podem levar à sua destituição.

Essa janela vai abrir-se se os democratas passarem a controlar a Câmara dos Representantes como se antevê. É ali, na câmara baixa do Congresso, que qualquer processo de 'impeachment' tem início e basta uma maioria simples para que este avance. No entanto, dali o processo segue para o Senado, onde são precisos dois terços de votos contra Trump para que a destituição avance.

O afastamento precoce de Donald Trump é, assim, improvável - tal como o de Brett Kavanaugh, o polémico juiz que passou a integrar o Supremo Tribunal apesar das acusações de abuso sexual que enfrentou.

Mesmo sem controlar o Senado, reconquistar a Câmara dos Representantes será a maior vitória para os democratas esta terça-feira, uma que, a confirmar-se, dar-lhes-á mais margem para travar legislação conservadora proposta pelos republicanos e avançar com mais investigações à ingerência russa nas presidenciais de 2016.


De olhos postos em 2020

As eleições intercalares servem sempre de prenúncio às próximas presidenciais dos EUA, em parte por causa dos calendários eleitorais no país: ao contrário do que acontece em Portugal, onde oficialmente as campanhas eleitorais duram cerca de duas semanas, do outro lado do Atlântico as campanhas presidenciais duram cerca de um ano e meio, o que significa que os futuros rivais de Trump têm de começar a preparar terreno para 2020 assim que as urnas fecharem esta terça-feira.

O outro fator de importância das intercalares tem a ver com a forma como o Presidente do país é eleito, de forma indireta e através do Colégio Eleitoral, onde cada estado tem X representantes que são alocados na totalidade ao candidato que vence as presidenciais nesse estado.

Foi graças a este sistema que Trump se tornou Presidente em 2016, isto apesar de ter conquistado menos três milhões de votos populares que a rival democrata. No fundo, bastou-lhe vencer em estados rurais do interior com maior peso no Colégio para derrotar Hillary Clinton mesmo com um número inferior de votos nas urnas.

E porque é que isso é importante agora, a dois anos da próxima eleição presidencial? Porque algumas das corridas desta terça-feira, para cargos de governação de estados, podem influenciar essa eleição. É aqui que o sistema eleitoral americano fica ainda mais confuso. Em muitos estados, é o governador que, através de legislação, "desenha" os distritos eleitorais – os tais de onde vêm os congressistas.

De dez em dez anos, com os processos de recenseamento populacional, os governadores podem “redesenhar” estes distritos de acordo com a população em cada distrito e como mais lhes convier.

Por exemplo, num estado onde há um claro e forte apoio a um só partido, o governador pode dividir uma grande área metropolitana que vale apenas um assento no Colégio Eleitoral em duas áreas, ganhando dois assentos, e reduzir outras áreas a menos lugares, para que o partido oposto conquiste menos lugares aí.

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