08 jan, 2019 - 17:23
O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem aceitou ouvir o caso de Tom Mortier, um cidadão belga que alega que os seus direitos humanos foram violados pelo Estado belga quando a sua mãe foi eutanasiada sem que ele tivesse sequer sido informado ou contactado.
O caso de Mortier revela uma das facetas mais preocupantes da lei na Bélgica, onde já é legal a eutanásia de crianças e perturbações psiquiátricas, como a depressão de que sofria a mãe de Mortier, são aceites como suficientes para se administrar injeções letais.
No caso em questão, o médico que matou a mãe de Tom Mortier é um dos mais conhecidos defensores da prática na Bélgica, mas o psiquiatra que acompanhou a doente durante mais de 20 anos garante que ela não preenchia os requisitos legais para ser eutanasiada.
“A minha mãe tinha um problema mental grave. Teve de lidar com depressões durante toda a sua vida. Foi tratada durante anos por psiquiatras e acabámos por perder contacto. Um ano mais tarde recebeu uma injeção letal. Nem o médico que administrou a injeção, nem o hospital me informou a mim ou aos meus irmãos de que a minha mãe estava sequer a considerar a eutanásia”, diz Mortier, que recebeu um telefonema no dia seguinte, a informá-lo do sucedido.
“O grande problema da nossa sociedade é que parecemos ter perdido o sentido de cuidar uns dos outros”, diz.
Com a ajuda de uma organização jurídica especializada em questões de liberdade religiosa, a Alliance Defending Freedom International, Tom Mortier tentou processar o Estado belga, alegando que tinha sido violado o seu direito humano à vida familiar. Mas os tribunais nacionais nunca aceitaram o processo.
Agora, contudo, o caso será ouvido pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, o que obriga o Estado belga a responder.
Decisão vai permitir analisar os desvios éticos e morais
Para Paul Coleman, da ADF, este caso revela o perigo das leis da eutanásia, que muitas vezes começam por se restringir apenas a casos dramáticos, mas rapidamente se expandem. “A rampa deslizante está à vista na Bélgica e neste caso podemos ver as consequências trágicas disso”, afirma.
“De acordo com os dados mais recentes lançados pelo Governo, mais de seis pessoas são mortas desta forma por dia, e isso pode apenas ser a ponta do icebergue. Os números mostram a verdade, que quando estas leis são aprovadas o impacto da eutanásia torna-se incontrolável.”
“A Bélgica colocou-se numa trajetória que, na melhor das hipóteses, diz aos seus cidadãos mais vulneráveis que as suas vidas não valem a pena”, conclui Coleman.
Em declarações à Renascença, Ana Sofia Carvalho, do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV), afirma que esta é uma decisão que vai permitir analisar os desvios éticos e morais à lei da eutanásia que estão a ocorrer em diversos países.
A professora de Bioética da Universidade Católica aplaude a decisão dos juízes do tribunal europeu.
“Como é que uma pessoa com depressão, que é incapaz de consentir, pode reiterar e ter consciência de um pedido desta natureza. Só aí já é algo absolutamente absurdo. É um caso estranho e inédito que põe mais uma vez em relevo a questão de que se começa de uma força progressiva com o discurso da dignidade e, depois, começa-se a escalar para situações inaceitáveis”, sublinha Ana Sofia Carvalho.
A catedrática diz que na Bélgica são cada vez as pessoas que não se reveem na lei atual e considera que esta é uma oportunidade para avaliar os desvios éticos e legais que estão a acontecer em vários países.
[notícia atualizada às 00h47]