16 jan, 2019 - 16:26 • Joana Azevedo Viana com Reuters
Com apenas 10 semanas pela frente até à data legal para o Reino Unido abandonar a União Europeia, às 23h de 29 de março, o Brexit está envolto em cada vez mais incerteza.
Na terça-feira, o acordo de saída que Theresa May alcançou com Bruxelas foi, como era expectável, chumbado por uma maioria dos deputados britânicos, relançando o país e toda a Europa no caos, não se sabendo agora quando, como ou sequer se o divórcio vai mesmo avançar.
A derrota histórica da primeira-ministra na Câmara dos Comuns, a maior de qualquer Governo britânico desde 1925, veio forçar May a trabalhar com todos os partidos com assento parlamentar para que alcancem um "plano B", uma alternativa ao acordo chumbado que a chefe do executivo tem de levar a votos na próxima semana.
Com o relógio a avançar e face ao chumbo de ontem, May tem agora três opções em cima da mesa.
Renegociar e ceder
Depois da sua derrota ontem, aponta a Reuters, May comprometeu-se a negociar com os diferentes representantes parlamentares para chegarem a um compromisso, alimentando a esperança dos mercados financeiros de que um acordo de última hora será alcançado em breve.
O Partido Trabalhista, o principal da oposição, já fez saber, pela voz do seu porta-voz de políticas financeiras, John McDonnell, que apoiará a primeira-ministra caso esta aceite manter o Reino Unido na união aduaneira e no mercado único e oferecer mais garantias de proteção a trabalhadores e consumidores.
Dentro do Partido Conservador de May, as cisões são gritantes, o que vem baralhar ainda mais as contas. Neste momento, é praticamente impossível fazer aprovar um acordo na Câmara dos Comuns sem o apoio de uma parte dos 256 deputados da oposição trabalhista; contudo, se May se aproximar das exigências daquele partido, arrisca-se a perder o apoio de dezenas de legisladores conservadores que são pró-Brexit e também dos unionistas da Irlanda do Norte (DUP), o partido que tem segurado o Governo minoritário de May.
Sem um compromisso entre todos, a primeira-ministra terá de escolher um de três caminhos: convocar eleições antecipadas, atrasar o Brexit, alargando o prazo previsto no artigo 50.º do Tratado de Lisboa, ou avançar com uma saída sem acordo.
A possibilidade de haver eleições gerais sob a sua alçada afastou-a esta quarta-feira, quando declarou no Parlamento que uma ida às urnas "é a pior coisa que podemos fazer".
Antes disso, o responsável pelas negociações do Brexit do lado da UE, Michel Barnier, indicou que uma forma de se avançar com um Brexit ordenado passaria por Londres aceitar aproximar-se mais das regulações da UE.
Citadas pela Reuters, fontes oficiais das instituições europeias dizem que o Reino Unido poderia, por exemplo, seguir as exigências trabalhistas, leia-se, sair da UE mas ficar na união aduaneira e no mercado único - uma possibilidade remota dado que muito poucos conservadores concordariam.
Brexit sem acordo
Esta é a solução que menos apoio angaria entre legisladores, empresários e eleitores britânicos, mas continua a ser uma alternativa real caso o Parlamento não consiga aprovar o tal Plano B na próxima semana.
Sair sem um acordo significa que não haveria qualquer período de transição e adaptação à nova realidade de uma UE sem o Reino Unido - é o maior dos pesadelos para empresários internacionais mas o sonho dos defensores acérrimos do Brexit que querem um corte total com Bruxelas.
Neste contexto, e enquanto membro da Organização Mundial do Comércio, o Reino Unido passaria a reger-se pelas regras dessa instituição nas relações económicas com o resto da UE e do mundo.
Face a esta possibilidade, várias empresas e países estão a alinhavar e a ativar os seus planos de contingência para um Brexit sem acordo, com receio de que isto vá criar enorme tráfego nas passagens fronteiriças do Reino Unido, cortar a circulação livre em artérias de comércio e forçar a deslocalização de cadeias de fornecimento no continente europeu e fora dele.
Os que apoiam o Brexit defendem que este caos seria temporário e que, no longo prazo, o Reino Unido iria colher mais frutos bons que maus desta saída abrupta e sem consensos ou estratégias comuns.
Referendar permanência na UE
Desde o referendo de 2016, em que quase 52% dos britânicos que foram às urnas votaram pela saída, o movimento de eleitores pró-UE que defende um segundo referendo à permanência tem aumentado a cada mês. Mas essa opção tem sido repetidamente afastada pela primeira-ministra, sob o argumento de que tal iria minar a confiança na democracia dos mais de 17 milhões de cidadãos que votaram Brexit há quase três anos.
Um novo referendo só pode ser convocado se o Parlamento assim o aprovar, e neste momento não há maioria parlamentar favorável a essa opção.
O Partido Trabalhista, em teoria mais próximo dos que defendem uma nova consulta, continua a tentar forçar eleições antecipadas - a começar já esta quarta-feira, com a moção de censura apresentada por Jeremy Corbyn no rescaldo da votação de ontem. Só se essa ida às urnas for rejeitada, defende o líder trabalhista, é que irá considerar um eventual apoio a outro referendo.
Corbyn nunca escondeu o seu euroceticismo e por diversas vezes ao longo deste caminho até ao Brexit manifestou-se contra uma segunda consulta. Pelo contrário, esta quarta-feira um proeminente deputado conservador pró-UE, Dominic Grieve, submeteu legislação no Parlamento para abrir caminho a esse referendo, um que passaria sempre por voltar a perguntar aos britânicos se querem ficar ou sair.
Se a Câmara dos Comuns aprovar a opção, o Reino Unido terá de pedir formalmente à UE para alargar o prazo de saída definido pelo artigo 50.º do Tratado de Lisboa, o único mecanismo legal para a saída de um Estado-membro, que May ativou a 29 de março de 2017. A forma mais provável de permitir que os dois lados façam campanha antes da consulta será desativar esse artigo.
No seguimento disso, a Comissão Eleitoral teria de definir que questão ou questões vão constar do boletim de voto no referendo. Contudo, continua a não ser garantido que, havendo referendo, uma maioria votasse a favor da permanência.