26 set, 2019 - 09:50
O Governo chinês é acusado de estar a matar membros de minorias religiosas para lhes retirar os órgãos para alimentar o negócio dos transplantes.
Há anos que existiam rumores sobre a prática, mas esta semana o Conselho dos Direitos Humanos da ONU recebeu um relatório que contém provas de que membros de grupos religiosos como a seita Falun Gong, ou os muçulmanos de etnia uighur, estão a ser mortos para que os seus órgãos sejam recolhidos e usados para transplante.
A investigação foi levada a cabo por uma comissão chefiada por Geoffrey Nice, o procurador do Tribunal Penal Internacional para os crimes cometidos na antiga Jugoslávia. Nice encabeçou a acusação contra Slobodan Milosevic, o antigo ditador daquele país, que morreu antes do final do seu julgamento.
Durante a apresentação ao Conselho dos Direitos Humanos, o advogado Hamid Sabi disse que a investigação tinha descoberto provas de que foram cometidos “crimes contra a humanidade” que tinham como alvos membros da Falun Gong, ao longo de pelo menos 20 anos.
Segundo Sabi os reclusos eram “mortos por encomenda… abertos ainda vivos para colher rins, fígados, corações, pulmões, córneas e pele que eram transformados em bens para venda”. Segundo a investigação também existem provas de que os mesmos crimes foram cometidos, mas em menor escala, contra outras minorias, incluindo uighures, tibetanos e também membros de algumas comunidades cristãs.
O advogado diz que estas provas criam uma obrigação legal para que a comunidade internacional tome medidas para acabar com a prática, que equipara a genocídio.
“Vítima a vítima, morte por morte, o gaseamento de judeus pelos nazis, o massacre dos Khmer Rouge ou a chacina de tutsis ruandeses pode não ser mais grave do que cortar os corações e outros órgãos de pessoas pacíficas, inofensivas, inocentes e vivas. Os Estados membros das Nações Unidas têm uma obrigação legal para fazer algo em relação a esta conduta criminal”, disse Sabi, em declarações reproduzidas pelo jornal britânico The Independent.
Perseguição religiosa
A China tem um longo historial quer de perseguição religiosa quer de práticas pouco éticas no campo do transplante. Durante anos era de conhecimento público que o Governo usava órgãos de condenados à morte, com suspeitas de que as execuções eram adiadas até haver necessidade de órgãos e depois levadas a cabo de forma a preservar as partes do corpo que eram necessárias. O Governo anunciou, contudo, que esta prática cessou em 2015.
Em relação a estas novas acusações, elas são negadas pelas autoridades em Pequim, que agora acusaram o Conselho dos Direitos Humanos da ONU de “perpetuar boatos”.
A prática religiosa é altamente desencorajada na China, ou mesmo proscrita. Os chineses só podem fazer parte de comunidades religiosas aprovadas pelo Estado e sujeitas ao controlo de “associações patrióticas” que recentemente receberam ordens para adaptar os seus ensinamentos e práticas à cultura chinesa, incluindo o socialismo.
No Tibete o Governo começou recentemente a elaborar nomes de todos os membros do partido ou funcionários públicos que tinham sido vistos a praticar o budismo tradicional da região e nos últimos anos várias igrejas e edifícios cristãos têm sido destruídos, havendo ainda muitos fiéis e clérigos detidos.
Mas a pior perseguição nos últimos tempos tem sido reservada para a comunidade muçulmana uighur. Há indícios de que mais de um milhão de uighures estão detidos, tendo sido enviados para “campos de reeducação”, algo que tem merecido muitas críticas da comunidade internacional.