07 nov, 2019 - 17:17 • João Pedro Barros
O Governo chinês “construiu um estado autoritário avançado”, que “põe a censura à frente da liberdade de expressão” e que, se não for travado, pode pôr em causa o “sistema de mercado livre”. Por isso, o mundo ocidental deve unir-se nesta luta, impossibilitando a tecnologia e as empresas chinesas, como a Huawei, de ter uma posição global dominante.
Foi esta a mensagem principal deixada esta quinta-feira, na Web Summit, em Lisboa, por Michael Kratsios, conselheiro tecnológico da Casa Branca, num discurso sem direito a perguntas nem interação com o público.
Tratou-se de mais um parágrafo na guerra comercial entre os dois países. Se, na segunda-feira, o líder da Huawei, Guo Ping, evitou a política no seu discurso, o representante do Governo dos EUA não poupou nas palavras: em causa estão quase todos as dimensões da geopolítica atual, desde “sistemas de comunicação” até às forças militares.
Após boa parte da intervenção ter servido para elogiar o avanço tecnológico, nomeadamente a inteligência artiifical, e a própria Web Summit, Kratsios lançou um ataque demolidor em poucos minutos, que lhe mereceu uma saída de palco debaixo de alguns assobios.
“Vários países continuam a pôr a hipótese de abrir os braços a empresas chinesas para construir infraestruturas cruciais como 5G e desenvolver tecnologias-chave, como a inteligência artificial”, sublinhou Kratsios, no que tem de ser lido também como uma crítica ao Governo português – a Altice e a Huawei têm colaborado para a implementação do 5G.
“A influência e controlo tecnológico por parte da China vai não só comprometer as liberdades dos próprias cidadãos, mas também dos cidadãos de todo o mundo”, concluiu, lembrando que “o presidente dos Estados Unidos” – o discurso nunca citou o nome de Trump – aprovou legislação para “restringir o investimento estrangeiro em áreas estratégicas e entidades chinesas que cometeram abusos de direitos humanos”
De acordo com Kratsios, o ecossistema de inovação norte-americano é “a inveja de todo o mundo”. “O Governo está a tomar uma posição e não o podemos fazer sem a Europa e os nosso aliados em todo o mundo. Podemos não estar de acordo em todos os aspetos da legislação tecnológica, mas todos concordamos nos princípios mais importantes”, ressalvou.
Entrada da China na OMT foi um erro
O caso mais claro do perigo chinês é o da Huawei, notou, salientando que “a lei chinesa obriga todas as empresas do país a colaborar com os serviços de segurança e informações”
“Depois da Huawei ter instalado equipamento tecnológico na sede da União Africana, o sistema informático foi ‘hackeado’ e a informação transmitida para servidores em Pequim, todas as noites, durante cinco anos”, exemplificou.
Kratsios lembrou ainda que se pode estar a repetir o erro cometido em 2001, “quando foi permitido à China integrar” a Organização Mundial do Comércio (OMT): “Esperava-se que o país se liberalizasse política e economicamente . Em vez disso, a China roubou a nossa propriedade intelectual. Obrigaram empresas a entregar tecnologia valiosa, ou a aceder aos seus mercados”
Para este conselheiro, o “perigo” é agora “muito maior” do que em 2001, porque o avanço da tecnologia é “muito mais rápido”.