11 nov, 2019 - 17:06 • Pedro Mesquita
Apesar de tudo ter ficado praticamente igual em Espanha com as eleições legislativas deste domingo, houve um partido que pode cantar vitória. O Vox, extrema-direita, é agora a terceira força política no país.
À Renascença, um especialista em populismos de direita diz que a melhor forma de travar esta subida meteórica do Vox é criar uma espécie de "cordão sanitário", mesmo à escala regional.
Para João Carvalho, professor do ISCTE, em Lisboa, será essa a estratégia dos partidos ditos "mainstream" de centro-direita a partir de agora.
Como analisa o fenómeno Vox?
A ascensão do Vox deve-se, em grande medida, ao independentismo catalão que tem vindo a fomentar o nacionalismo espanhol. Os defensores de que há um golpe de Estado em curso na Catalunha defendem que deve ser instalado o estado de emergência naquela região para restaurar a lei e a ordem...
Mas é também o resultado da desilusão crescente perante a incapacidade dos partidos tradicionais?
À incapacidade dos partidos tradicionais em lidarem com o independentismo catalão, sim. Não diria todos os partidos tradicionais mas sim do centro-direita espanhol, que está em crise desde que Mariano Rajoy abandonou a liderança do Partido Popular (PP), que tem estado a ser assolado por escândalos de corrupção ligados ao seu financiamento. Desde então, tem-se assistido à ascensão, primeiro, do "Ciudadanos", de centro-direita, que veio competir diretamente com o PP e que chegou a ser a terceira maior força política em Espanha. Só que, neste momento, passou para sexta força política mais votada no espaço de seis meses.
Espanha
Eleições em Espanha resultaram numa vitória do PSO(...)
Como é que se processa, neste momento, a transferência de votos de um partido para o outro? Há alguma lógica, alguma coerência?
As transferências de voto ocorrem, normalmente, dentro do mesmo bloco ideológico. Ou seja, dentro do centro-direita e da direita os eleitores tendem a deslocar cada vez mais os seus votos. Cada vez há mais volatilidade eleitoral, em todos os sistemas eleitorais. As preferências de curto prazo sofrem cada vez mais oscilações. Se no passado as pessoas votavam quase sempre no mesmo partido, porque havia uma forte ligação a esse partido, hoje em dia essa ligação é fraca e encoraja a volatilidade eleitoral.
E essa volatilidade pode levar um eleitor a deslocar o seu voto na esquerda de umas eleições para as outras?
O que eu digo é que é mais lógico que um eleitor de centro-direita descontente procure o extremo mais do que a transferência entre blocos. Os eleitores que se desiludiram primeiro com o PP e depois com o Ciudadanos acabaram por migrar o seu voto para o Vox, mais do que passar de um extremo para o outro.
Imagina o Vox a subir muito mais?
Já é a terceira força política em Espanha, mas creio que será muito difícil ultrapassar o PP no curto ou médio prazo, porque poderá haver aquilo que não houve até agora, que é um "cordão sanitário" imposto pelo sistema político espanhol ao Vox.
Como é que pode ser criado esse cordão sanitário?
Os partidos de centro-direita não colaborarem com o Vox, não lhe providenciarem a oportunidade de entrar em coligações, nomeadamente nos governos regionais. Recorde-se o que aconteceu na Andaluzia, onde para poder ser eleito o PP fez uma coligação com o Ciudadanos e com o Vox. Estas coligações apenas reforçam a legitimidade politica do Vox e o seu apoio eleitoral. O "cordão sanitário" é precisamente o oposto. Acontecerá se os partidos "mainstream" moderados isolarem o Vox, bloquearem qualquer hipótese de entrar em coligações com os partidos tradicionais e de ascenderem a cargos institucionais.