03 fev, 2020 - 22:32 • Tiago Palma
Democratas ou republicanos, os candidatos ou putativos candidatos (como é o caso de Michael Bloomberg) posicionaram-se durante os últimos meses, nalguns casos são mesmo anos, tentaram recolher apoios – mais financeiros do que propriamente ideológicos –, esgrimiram argumentos, atacaram, viram-se atacados, contra-atacaram em debates ou comícios.
Não, não é de hoje que tentam chegar ao número 1600 da Pennsylvania Avenue (leia-se: Casa Branca). Mas é hoje, segunda-feira, que é “a doer”: os partidos começam o demorado processo de escolha dos respetivos candidatos às presidenciais de novembro com a realização das eleições primárias no estado do Iowa.
Do lado republicano, o atual Presidente norte-americano Donald Trump não parece ter adversários que o amedrontem – o empresário californiano Rocky de la Fuente, o ex-congressista do Illinois Joe Walsh e o ex-governador de Massachusetts Bill Weld são mais número que sombra. Portanto, este caucus (onde não se deposita o voto na urna; criam-se grupos de apoio e somam-se os apoios dos candidatos, uma percentagem depois transformada em número de delegados) no Iowa vai sobretudo decidir alguma coisa, embora pouca, do lado democrata. Pouca? Sim, pouca. Lá chegaremos.
Primeiro, os candidatos. Distribuídos por cerca de duas mil mesas, de braço no ar, os eleitores vão escolher os delegados dos 99 concelhos do estado do Iowa, depois de debaterem as qualidades (e deméritos) de cada um. E são cada vez menos. Começaram por ser 20, vão resistindo 14, mas destes apenas três parecem conseguir aspirar à nomeação na convenção nacional de julho, em Milwaukee: Joe Biden, antigo vice-presidente de Barack Obama; Bernie Sanders, que em 2016 foi preterido a favor de Hillary Clinton; e Elizabeth Warren, a primeira mulher eleita senadora no estado no Massachusetts. O antigo mayor Pete Buttigieg e a senadora Amy Klobuchar são “underdogs” e não há muito o que esperar deles.
Mas voltemos ao Iowa e ao pouco que se decide neste estado rural do centro-oeste, predominantemente branco. Elege-se no Iowa um pequeno, quase irrelevante, número de delegados. Logo, pode até dizer-se que nada decidirá nas primárias. Mas lá que tem “hype”, tem. É que há 24 anos, desde os idos de 1996, e nomeadamente no Partido Democrata, sempre que um candidato aqui venceu, garantiu mais adiante a nomeação na convenção nacional.
Olhando às sondagens mais recentes, Biden parte na dianteira (27%), Sanders é segundo (23.7%) e Warren segue mais atrasada na tendência de voto (15%). Mas estas são as sondagens nacionais. Olhando só ao Iowa, Sanders (23%), Biden (19,3%), Buttigieg (16.8%) e Warren (15,5%) descolaram de Klobuchar (9%).
Sondagem à parte, olhemos, caso a caso, candidato a candidato, o que é que o Iowa pode significar no futuro imediato.
Começando por Joe Biden, o antigo "vice" de Obama desvaloriza um hipotético resultado negativo. Aliás, a sua equipa diz mesmo que não precisa de vencer lá para demonstrar que é o mais bem posicionado entre democratas para enfrentar (e derrotar) Trump nas urnas. E garantem: é a seguir, nas votações em estados com grandes populações afro-americanas ou latinas (como Nevada ou Carolina do Sul) que Biden vai dizer ao que vem. É verdade? É. Mas se Biden quer dar força a uma certa aura de "invencível", começar derrotado não é bom augúrio e levantará dúvidas no eleitorado.
A questão é perceber se, a perder, por quando perderá. Na certa, por pouco. É que num campo ideológico tão amplo, de progressistas e de conservadores, como o Iowa o é, e valendo tão poucos delegados, nunca vai haver um vencedor inquestionável – e os três/quatro primeiros não se afastarão tanto assim uns dos outros.
O busílis da questão é outro: é saber quem são os dois mais fortes – e quem vai começar a ficar pelo caminho. Imaginemos um cenário: Sanders vence. Se vence no Iowa, também em New Hampshire (11 de fevereiro) vencerá. Talvez vença no Nevada (22 de fevereiro), talvez não. Biden vai certamente ganhar na Carolina do Sul (29 de fevereiro). Depois vem a “Super Terça-feira”, a 3 de março, o dia em que mais estados votarão e onde há mais delegados em jogo, e dificilmente a nomeação democrata não se vai decidir entre Biden e Sanders, a dois.
Dois, que até podem ser três. Se o antigo mayor de Nova Iorque Michael Bloomberg vir Biden escorregar estado após estado, pode chegar-se à frente. E se se chegar, Sanders voltará a morrer a praia? É verdade que o senador do Vermont, desde o outono passado, vem subindo nas sondagens – e “roubando” eleitoriado progressista a Elizabeth Warren –, mas é também verdade que em 2016 venceu mais de 20 estados, mas perderia (por quase mil delegados) a nomeação para Hillary.