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Malária? Ébola? Médicos buscam cura para coronavírus em medicamentos existentes

20 mar, 2020 - 09:55 • Marta Grosso

A cloroquina é utilizada no tratamento da malária há 70 anos. Será que pode curar a Covid-19? Há resultados positivos, mas não existem ainda conclusões científicas. E há outros medicamentos a ser testados.

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A busca da cura para novas doenças começa muitas vezes pelo reaproveitamento de medicamentos existentes. Já ouviu falar em cloroquina? Até há uns dias, poderia ser só um nome esquisito para a maioria das pessoas, mas hoje significa, para muitos, uma esperança.

A cloroquina é de um medicamento utilizado no tratamento da malária que alguns médicos estão a testar em doentes infetados com o novo coronavírus.

Foram os médicos franceses que começaram a experimentar este fármaco. Em Marselha, no sul do país, num estudo com 36 pacientes, 70% dos tratados com cloroquina foram considerados curados seis dias depois.

Os resultados impressionam, mas um especialista em patogénese microbiana da Universidade de Bath, Andrew Preston, chama a atenção para o facto de o estudo ter sido realizado num número muito pequeno de pacientes, pelo que será necessário ser replicado a uma escala muito maior para ser cientificamente convincente.

E poderemos lá chegar, uma vez que também na Austrália e na China também se fizeram testes com resultados promissores. O objetivo é agora alargar e aprofundar a experiência com este medicamento, que tem 70 anos de existência.

Se há bons resultados, por que esperamos?

É preciso haver um ensaio clínico em larga escala. Só depois disso, a cloroquina poderá ser utilizada como tratamento de rotina.

O medicamento (este e outros) está ainda a ser testado. Não existem conclusões científicas e inequívocas sobre os resultados na cura da Covid-19, nem uma amostra abrangente que permita chegar a essas conclusões.

A boa notícia é que, sendo um medicamento já existente, o processo para ser reconhecido no tratamento seguro da Covid-19 pode ser bem mais rápido.

Como é que a cloroquina combate o novo coronavírus?

O processo está ainda a ser investigado. Na opinião de Robin May, professor de doenças infecciosas da Universidade de Birmingham, a ação pode estar relacionada com um processo chamado "endocitose", em que o vírus entra no hospedeiro.

"Isso significa que o vírus é inicialmente absorvido num 'compartimento' intracelular que normalmente é bastante ácido. A cloroquina alterará a acidez desse compartimento, o que pode interferir na capacidade dos vírus de escapar para a célula hospedeira e começar a replicar-se”, explica ao jornal britânico “The Telegraph”.

"Outra possibilidade é que a cloroquina consiga alterar a capacidade do vírus de se ligar à parte externa de uma célula hospedeira – o que seria um primeiro passo essencial para a entrada", acrescenta.

De acordo com alguns especialistas citados pela BBC, num outro artigo, uma vez dentro do corpo humano, o vírus começa a sequestrar células, de modo a poder multiplicar-sae. E consegue criar entre 10 mil e 100 mil cópias de si.

Cloroquina não é o único medicamento em teste

Sim. Também um fármaco desenvolvido para o tratamento do Ébola começou a ser testado para o novo coronavírus. Trata-se do remdesivir, um tratamento antiviral de amplo espectro.

Os EUA têm apostado bastante neste medicamento, tendo já conduzido alguns ensaios clínicos em adultos hospitalizados com Covid-19. São testes controlados com vista a avaliar a segurança e a eficácia do remdesivir antiviral nesta doença.

Os testes começaram no Centro Médico da Universidade de Nebraska (UNMC) em Omaha, com o patrocínio do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID).

No estado de Washington, uma equipa de médicos tratou com sucesso um paciente com este antiviral – que é usado para o Ébola como último recurso. E obtiveram autorização para utilizar remdesivir em caso de emergência.

Segundo o professor assistente da Universidade da Carolina do Norte Timothy Sheahan, o paciente respondeu ao tratamento e 24 horas. Mas sublinha: é necessário um estudo controlado para se poder tirar conclusões mais concretas.

“Não sabemos se este paciente teria recuperado da mesma maneira sem o medicamento”, destaca. “Para já, sabemos que este medicamento é um potente antiviral”, acrescenta.

Além disso, tem havido testes com antivirais utilizados no HIV e vários estudos em andamento na China que analisam a combinação de lopinavir e ritonavir (que trabalham para diminuir os níveis de HIV na corrente sanguínea).

Uma busca incessante

Sendo uma estirpe desconhecida, o novo coronavírus não tem ainda cura nem uma vacina que o previna. Mas em todo o mundo médicos, cientistas e especialistas trabalham para descobrir a melhor resposta a este vírus.

Experiências com medicamentos já existentes são o primeiro passo. Os estudos são feitos em doentes hospitalizados, em ambiente controlado e sob vigilância médica.

Os resultados vão sendo partilhados, mas, enquanto não existirem conclusões científicas sobre estes testes, nada pode ser dado como verdade absoluta.

Na corrida para descobrir um tratamento eficaz para a Covid-19 a IBM contribuiu com um supercomputador: o “Summit” já conseguiu identificar 77 compostos químicos que poderão ajudar a conter a propagação da Covid-19.

De acordo com a CNN, este poderá ser um passo promissor no caminho para a descoberta de uma vacina. Os resultados da pesquisa foram publicados no jornal científico “ChemRxiv”, por investigadores da Oak Ridge National Laboratory.

Apesar das descobertas, cabe agora à comunidade científica testar empiricamente quais dos compostos químicos identificados pelo “Summit” que resultam melhor.

Alerta: não tome medicamentos que desconhece

Devido à divulgação de notícias sobre a utilização do medicamento contra a malária, algumas pessoas começaram a querer adquiri-lo para uso pessoal e automedicação. Este comportamento é totalmente desaconselhado.

Todos estes medicamentos têm fortes efeitos secundários e não são ainda conhecidas as consequências para a saúde da sua utilização no tratamento da Covid-19.

Além disso, a compra destes medicamentos pode comprometer a sua disponibilidade aos doentes hospitalizados.



Ouvido pela Renascença, o pneumologista Filipe Froes explica que o medicamento da malária que está a ser utilizado em testes “tem sido utilizado em modo experimental, sempre em associação com outros fármacos, e exclusivamente em doentes internados com Covid-19”.

“Não tem qualquer indicação para uso em ambulatório – fora do hospital” – o utilizador incorre em riscos que podem ser graves para a sua saúde.

O novo coronavírus já infetou mais de 274.500 pessoas em todo o mundo. Começou na China, mas o principal foco da doença está agora na Europa.

Itália é o país europeu mais afetado pela Covid-19, seguido de Espanha. Em Portugal, o balanço mais recente aponta para 786 infetados, dos quais três já recuperaram e quatro não resistiram à doença.

A maioria dos doentes em Portugal está em casa, a vigiar os sintomas.

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