17 out, 2020 - 00:02 • Filipe d'Avillez
Muitos só terão ouvido falar da dexametasona pela primeira vez quando Donald Trump foi hospitalizado com Covid-19 e anunciou ter recebido um tratamento “milagroso”.
Na verdade, o Presidente dos EUA recebeu um “cocktail” de vários medicamentos já existentes no mercado e com resultados preliminares promissores em casos graves de Covid-19, incluindo o remdesivir, interferon e dexametasona. Contudo, um estudo divulgado esta sexta-feira pela OMS conclui que, desses, apenas a dexametasona demonstra eficácia comprovada até agora.
Trata-se de um corticosteroide, uma classe de medicamentos que reduz a inflamação no corpo humano. O medicamento já existe há vários anos e é muito usado em tratamentos oncológicos.
Neste momento, é o único medicamento recomendado pela OMS para o combate à Covid-19. A Agência Europeia do Medicamento já tinha recomendado o seu uso em setembro de 2020.
Segundo o estudo promovido pela OMS, o uso de dexametasona em doentes com Covid-19 reduziu a mortalidade entre doentes ventilados em um terço e em doentes que apenas recebiam oxigénio em um quinto.
Até agora, contudo, o medicamento só era recomendado para infetados em estado muito grave, uma vez que é um medicamento imunodepressor e por isso temia-se que pudesse ter efeitos negativos, deixando os doentes expostos a outras doenças.
O Solidarity Trial é o maior estudo do género alguma vez feito com doentes Covid-19. Envolveu 13 mil pessoas de 500 hospitais em 30 países.
Segundo o diretor-geral da OMS,Tedros Adhanom Ghebreyesus, o estudo continua a recrutar 2 mil pessoas por mês e será usado para testar outros medicamentos para além dos que já foram analisados.
OMS
Organização Mundial da Saúde diz que os medicament(...)
Os resultados hoje apresentados já foram contestados pela Gilead, a empresa norte-americana que fabrica o remdesivir, que fala em "inconsistências" semelhantes às de estudos anteriores.
No final de julho, Bruxelas anunciou um contrato de 63 milhões de euros com a Gilead para assegurar o tratamento com remdesivir de doentes Covid na UE. O bloco está entretanto sob pressão para renegociar um contrato de mil milhões de euros que selou com a farmacêutica.
Em junho, depois de testes em vários hospitais, a Agência Europeia do Medicamento anunciou "luz verde" para o uso de remdesivir em casos mais graves de infeção pelo coronavírus no espaço europeu, uma medida que o Infarmed também recomendou em Portugal.
Mas afinal, e de acordo com o estudo patrocinado pela OMS, o medicamento antirivral originalmente criado para combater o ébola e de uso exclusivo hospitalar “tem pouco ou nenhum efeito na prevenção da morte por Covid-19 ou na redução do tempo no hospital” em pessoas com manifestação grave da doença.
O mesmo estudo indica que outras terapêuticas, como a administração da proteína interferon, também demonstram "pouco ou nenhum efeito" nos casos mais graves de Covid-19.
O interferon (IFN) pertence a uma família de substâncias produzidas pelo sistema imunológico, nomeadamente pelos leucócitos e fibroblastos, para interferir na replicação de fungos, vírus, bactérias e células cancerígenas.
Para além do remdesivir e interferon, em junho já tinha sido retirado deste estudo a hidroxicloroquina, um medicamento usado no combate à malária.
Um mês depois, em julho, os pacientes sob investigação também deixaram de tomar a combinação de medicamentos lopinavir + ritonavir, um medicamento combinado usado para tratar portadores do Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH).