03 nov, 2020 - 07:10 • Redação com Reuters
Depois de meses de notícias sobre alegadas pressões sobre a Ucrânia para investigar o adversário democrata Joe Biden, em troca de milhões de dólares em ajuda militar, o Presidente norte-americano foi absolvido no processo de destituição. A votação decisiva aconteceu a 5 de fevereiro, no Senado. Donald Trump foi “salvo” pelos seus parceiros do Partido Republicano e tinha caminho aberto para a reeleição nas presidenciais de novembro.
A absolvição aconteceu um dia depois do Estado da União, o discurso anual mais importante do líder da Casa Branca. Trump aproveitou para fazer o autoelogio da sua administração, reclamando os louros pelo desemprego historicamente baixo naquela altura (3,5%), uma economia a crescer e o mercado bolsista em alta. Mas, em poucos meses, um vírus mudou tudo.
As primárias do Partido Democrata na Carolina do Sul marcaram uma mudança na sorte do candidato a candidato à Casa Branca. Joe Biden, nascido há 77 anos, em Scranton, na Pensilvânia, tinha somado duas derrotas preocupantes no Iowa e New Hampshire e as coisas pareciam tremidas para o vice-presidente de Barack Obama.
Os assessores de campanha acreditavam que o vento ia mudar nos estados com mais eleitores afroamericanos. E tinham razão. Biden vence na Carolina do Sul e ganha balanço para o resto da corrida. Dois dias depois, o político veterano sai como o grande vencedor da importante Super Terça-Feira. Conquista nove dos 14 estados e um território norte-americanos em disputa, enquanto o principal adversário na corrida democrata, o senador Bernie Sanders, que seguia na frente das sondagens até aí, vence apenas três. Biden mostra que pode ser o melhor democrata a tirar votos a Trump entre os eleitores moderados no Midwest e noutras zonas dos Estados Unidos.
Depois de semanas a desvalorizar os efeitos da pandemia de Covid-19, o Presidente norte-americano declara emergência nacional, a 13 de março, perante o aumento explosivo do número de mortes e casos. Trump coloca 50 mil milhões de dólares à disposição dos estados para fazerem face ao problema de saúde pública e fica com mais poder para tomar medidas. O vírus mudou a vida dos americanos e, das escolas aos negócios, paralisou boa parte do país. A gestão da pandemia tornou-se num dos principais temas da campanha e arma de arremesso entre Trump e Biden.
No dia anterior, tinha feito uma declaração ao país, a partir da Sala Oval, a culpar a Europa pela propagação do novo coronavírus e a anunciar a suspensão dos voos para o "Velho Continente", exceto Reino Unido. Antes já tinha tomada medida idêntica em relação à China.
Ao contrário do que tinha feito quatro anos antes com Hillary Clinton, desta vez Bernie Sanders não levou a candidatura à nomeação democrata até convenção democrata. O senador, de 79 anos, desistiu a meio – a 8 de abril - e anunciou o apoio a Joe Biden. A decisão de Sanders permitiu, a sete meses das eleições, que Biden concentrasse todos os meios e esforços na campanha para tirar Donald Trump da Casa Branca.
Os Estados Unidos aproximavam-se das 50 mil mortes por Covid-19 e Donald Trump, num dos seus briefings diários, sai fora do guião e sugere que os americanos injetem lixívia para eliminar o coronavírus.
Perante a surpreendente recomendação do Presidente, os especialistas em saúde pública foram obrigados a vir a público recordar o básico: "é perigoso ingerir desinfetantes e produtos tóxicos. Pode levar à morte, não faça isso em casa". Foi só sarcasmo, tentou justificar mais tarde o homem mais poderoso dos EUA, que até abril tinha a aprovação do público na gestão da crise.
O incidente acabou com Trump a criticar os jornalistas e a suspender as conferências de imprensa diárias, marcadas por vários episódios e comentários insólitos e que demonstraram a impreparação do líder norte-americano para sobre a pandemia. Por várias vezes desafiou os cientistas e em diversas ocasiões acabou corrigido por Anthony Fauci, o principal especialista da equipa da Casa Branca na luta contra a Covid-19.
Os Estados Unidos choravam a morte do afroamericano George Floyid, às mãos da polícia, e milhares protestavam em defesa das vidas negras dos Estados Unidos. Perante o clamor das ruas, Donald Trump recuperou a máxima “lei e ordem”, do antigo Presidente Ronald Reagan, e comparou os protestos a “terror interno”.
A 1 de junho, mandou polícia de intervenção dispersar – com gás lacrimogéneo - uma manifestação pacífica na avenida em frente à Casa Branca, para atravessar a rua até à Igreja de S. João, também conhecida como Igreja dos Presidentes. Só parou em frente ao templo religioso, para se deixar fotografar com uma Bíblia na mão direita. A manobra do Presidente foi bastante criticada, nomeadamente por líderes religiosos, e incompreendida pela maioria de norte-americanos que apoiava os protestos por mais justiça racial. A taxa de aprovação caiu para os níveis mais baixos em sete meses.
Com a nomeação democrata garantida, estava na hora de Joe Biden eleger o seu colega de equipa e candidato vice-presidente. O anúncio aconteceu a 11 de agosto e a escolha recaiu sobre a Kamala Harris.
Ex-adversária nas primárias, a senadora da Califórnia – de ascendência indiana e jamaicana – chegou a criticar Biden de colaborar com políticos racistas na década de 70, mas as diferenças foram ultrapassadas e os rivais passaram a aliados para tentar derrubar Trump.
Kamala, que exerceu advocacia durante três décadas, demonstrou ser um trunfo importante na corrida à Casa Branca, injetando energia na campanha e muitos donativos provenientes de apoiantes.
A juíza Ruth Bader Ginsburg morreu aos 87 anos e abriu-se uma vaga no Supremo Tribunal dos Estados Unidos. A respeitada defensora de causas liberais e heroína da esquerda progressista não resistiu a um cancro e faleceu a 18 de setembro, a menos de dois meses das presidenciais.
Donald Trump não desperdiçou a oportunidade para indicar um juiz conservador e apressou-se a revelar o nome da sucessora. A escolhida foi Amy Coney Barret, católica praticante e defensora dos valores tradicionais em matérias como aborto e direitos dos homossexuais.
Ao contrário do que tinham defendido nos tempos do Presidente Barack Obama, os republicanos não tiveram qualquer problema em dar luz verde à nova juíza do Supremo na contagem decrescente para as eleições.
Vinte e de setembro fica marcado como o dia de um dos debates presidenciais mais caótico e agressivo na história da ciência política norte-americana. O frente-a-frente entre os candidatos não foi bonito de se ver. Trump já tinha passado a “linha vermelha” nos embates televisivos com Hillary Clinton, na campanha de 2016. Mas desta vez aumentou a intensidade e o nível desceu.
À procura de ganhar balanço e garantir a reeleição, Trump atacou a família de Joe Biden e foi incapaz de criticar as milícias de extrema-direita e os grupos supremacistas brancos. O Presidente dirigiu-se a um desses movimentos, os Proud Boys, pedindo que recuassem e “ficassem a postos”. Biden confrontou Trump com o facto de não pagar impostos, com a forma como não liderou o combate à Covid-19 e respondeu aos insultos e constantes interrupções do adversário com um “cala-te, homem”.
Trump desistiu do segundo debate, que seria em formato virtual depois de ter ficado infetado com o novo coronavírus. O frente-a-frente acabaria por acontecer mais tarde, a 22 de outubro, num tom mais calmo e com o moderador a ter um botão para cortar o som dos microfones dos candidatos, para evitar "atropelos" e interrupções.
Após semanas de comícios com casa cheia e poucas regras de segurança sanitária, como se não houvesse uma pandemia, Trump e vários assessores testam positivo à Covid-19. O Presidente, de 74 anos, chega a ser internado num hospital militar e é sujeito a um tratamento experimental, vedado ao americano comum.
Quando recebeu alta, as suas primeiras palavras foram um apelo à população: "não tenham medo da Covid-19" nem deixem "a doença dominar as vossas vidas". Os Estados Unidos são o país do mundo com mais mortes (231 mil) e casos do novo coronavírus (mais de 9,2 milhões), e a curva não está a diminuir.
O Presidente manteve a atitude desafiante. Quando regressou à Casa Branca, depois de vários dias de hospitalização, retirou a máscara e organizou uma festa com dezenas de pessoas. A doença de Trump manteve a pandemia como tema central da campanha presidencial e pode custar-lhe votos preciosos a 3 de novembro.