19 jan, 2021 - 06:35 • Shannon Alazia*
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O ano de 2020 é um que não deixa muitas saudades à maioria das pessoas, mas foi também o ano em que eu aprendi a considerar-me excecionalmente grata pelo isolamento das Ilhas Falklands. Tinha marcado o meu voo de regresso às Falklands desde 2019, para 19 de março de 2020. Já tinha completado o meu curso universitário e estava agora a trabalhar para uma empresa em Bristol.
À medida que os medos da pandemia começaram a aumentar, no final de fevereiro, comecei a ficar nervosa sobre as minhas possibilidades de conseguir regressar a casa e havia especulação sobre um possível confinamento total nacional. O voo foi sendo adiado cada vez mais e no dia 23 de março o primeiro-ministro do Reino Unido anunciou o confinamento e uma proibição da maioria dos voos… A minha sorte estava a escassear.
Desde o dia 16 de março que estava a trabalhar de casa, usando um portátil e auricular. Estava irrequieta e movia-me entre quatro espaços diferentes da casa durante o dia: a minha secretária, a minha cama, o sofá da sala e a mesa da cozinha. Felizmente a minha irmã mais nova mudou-se lá para casa na semana seguinte e foi ótimo poder ter finalmente alguma companhia física. É verdade que só se tinha passado uma semana, mas sabia que havia muita gente a sofrer com a solidão.
Passados uns dias as nossas orações foram atendidas. A minha irmã e eu conseguimos lugares no último voo do Reino Unido para as Falklands, no dia 26 de março. Íamos para casa.
Nesta altura as Falklands tinham tido o primeiro caso suspeito e o resultado é que a maioria das pessoas estavam a isolar-se em casa e os negócios estavam encerrados, exceto os serviços essenciais.
Eu e a minha irmã optámos por fazer a quarentena na casa da família e passámos duas semanas a pôr a conversa em dia, a passear pelo jardim e, claro, a ver muito Netflix. Até fomos buscar os nossos materiais de artes, de quando eramos crianças, e tentámos fazer uns autorretratos, que embora algo abstratos nem estavam assim tão maus. Passados os 14 dias pudemos regressar à comunidade, mas tínhamos de manter distância social de qualquer pessoa que não fosse das nossas “bolhas sociais”.
Depois desta resposta inicial o Governo desenvolveu um regime abrangente de quarentena e testagem, apoiado em nova legislação. Assim, pudemos voltar a operar novamente como uma comunidade e em julho a vida na ilha tinha regressado praticamente ao normal, embora nos mantivéssemos vigilantes e conscientes de como a pandemia estava a afetar o Reino Unido e os nossos vizinhos na América Latina.
Desde então passámos a poder voltar aos pubs e bares e jantar fora. Uma das coisas de que sentimos muita falta, porém, são as ligações aéreas que costumamos ter com a América do Sul através do Chile e de São Paulo, uma vez que os voos foram suspensos. Todavia, graças aos esforços do Governo e do hospital local, o sistema e as estratégias de gestão da pandemia têm funcionado muito bem e temos permanecido são e seguros em todas as ilhas que compõem o arquipélago.
Poder passar o natal a fazer coisas tradicionais das Falklands, como churrascos, conhecer novos pontos das ilhas e ir às famosas corridas de Boxing Day [26 de dezembro], foi um sonho. Esperamos agora que possamos continuar a manter-nos em segurança por enquanto e estamos ansiosos pela reabertura do resto do mundo. Estamos, contudo, muito conscientes de tudo o que se está a passar no resto do planeta e estamos solidários com todos os que estão a atravessar tempos desafiantes e difíceis.
*Shannon Alazia nasceu em Port Stanley em 1998 e viveu lá a vida toda até se mudar para o Reino Unido, para estudar. Depois de seis anos em Bristol, a pandemia levou-a a regressar às Falklands, onde está agora a trabalhar com o governo local.